Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos jogos oficiais de loteria e as atividades das agências lotéricas?

Oscar Ivan Prux

Muito se questionou sobre qual seria exatamente a lei aplicável, quando sob a forma de um “bolão” organizado pela agência lotérica, aconteceu da aposta premiada não ter sido registrada. Formou-se uma típica polêmica envolvendo a discussão se jogos de loterias oficiais (exemplo: uma megasena) caracterizar-se-iam ou não como relação de consumo.

Houve até, vários Procons que através de seus representantes, se manifestaram no sentido de que, como esse tipo de situação não envolveria relação de consumo, nenhuma providência tomariam contra essa práica dos “bolões” que as agências lotéricas costumam organizar, desrespeitando o regulamento da Caixa Econômica Federal que proibe essa forma de atividade. Para esses órgãos de proteção aos interesses dos consumidores, o jogo de loteria envolve risco e por conta disso, não se trata de uma relação de consumo. Essa concepção apanhada no dicionário de que é um jogo de azar e que isso eliminaria a possibilidade de aplicação da Lei n.º 8.078/90, parte do princípio de que o produto ou serviço do negócio jurídico se resumiria ao prêmio que não pode ser garantido e nem será alcançado pela quase totalidade dos apostadores (apenas um ou poucos felizardos sorteados é que ganham). Ou seja, estes não seriam destinatários finais de um produto ou serviço pelo fato de que, como meros apostadores, assumem o risco do prêmio não ser garantido para eles, dependendo exclusivamente da sorte. Na verdade, entretanto, o jogo é operado no país através de serviços bancários (agente: Caixa Econômica Federal) e estes (serviços) são caracterizadamente relação de consumo, conforme previsão expressa no CDC (parágrafo 2.º, do artigo 2.º).

Outro detalhe importante: quem joga, também o faz por lazer, tal qual quem vai a um cassino divertir-se, sem ter a certeza de que ganhará em suas apostas, mas lá tem direito a um ambiente saudável, lisura nos jogos e demais condições para desfrutar seu entretenimento. Note-se ser impositivo considerar que, a par da aposta com resultado aleatório quanto ao prêmio, existe um serviço público operado por lotéricas privadas (mediante concessão da Caixa Econômica Federal) e que precisa ser regido pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Muitos são os problemas havidos nos locais de apostas, incluindo dentre outros, a questão das filas, do desrespeito aos direitos dos idosos, da falta de banheiros, da falta de entrega de prêmios, de “bolões” não-autorizados e até da não-efetivação da aposta mesmo tendo havido pagamento pelo apostador (independente do fato de que seria premiada ou não).

Portanto, supere-se essa polêmica injustificada!

Excetue-se a aleatoriedade do direito ao prêmio para o apostador não-sorteado e consoante os fundamentos aqui apresentados, conclua-se que quanto ao mais, deve haver a aplicação da Lei 8.078/90 (CDC), pois as agências lotéricas praticam serviços públicos mediante concessão, os quais se caracterizam como fornecimento em relação de consumo, tal como o previsto no artigo 22, da mencionada norma.

Essa a melhor forma de propiciar a proteção adequada para os direitos legítimos dos consumidores, quer eles sejam apostadores, quer sejam aqueles que procuram esses estabelecimentos em busca de serviços (exemplo: pagamento de contas) atualmente terceirizados pelas instituições bancárias.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em teoria econômica, mestre e doutor em direito. Coordenador do curso de direito da Unopar. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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