Por terem se tornado bastante populares entre os jovens (principalmente crianças e adolescentes, mas não esquecendo que existem adultos que também são adeptos), diversos tipos de jogos eletrônicos ingressaram e se difundiram no universo que vai do computador, passa pelo vídeo game instalado no aparelho televisor e chega até aos telefones celulares.
Em escala mundial, essa venda enorme incentivou o interesse empresarial daqueles que criam e comercializam estes jogos como uma atividade muito lucrativa. Paralelamente, surgiram versões deste tipo de produto como instrumento didático útil para contribuir com o aprendizado nas escolas. E isto desde as salas de primeiro grau até os centros de treinamentos para cirurgiões ganharem habilidade manual destinado ao seu exercício profissional.
O que parecia normal, entretanto, logo começou a se desvirtuar e perdeu seu lado inocente de algo útil para o lazer sadio e para formação pessoal e profissional. Em primeiro momento, a indústria fabricante de computadores passou a investir nestes jogos como forma de condicionar a troca de computadores antigos (mas ainda em bom estado e úteis) por novos com capacidade de ?rodar? cada novo jogo lançado no mercado. Vale lembrar que foi só nos últimos anos que a indústria de computadores passou a utilizar-se da publicidade para vender seus produtos. Antes disso, numa espécie de obsolescência planejada, a fórmula de estímulo e condicionamento para a troca de uma máquina (computador) por outra nova, era o fato da primeira não rodar algum novo programa, aplicativo ou jogo lançado no mercado. Por conta disso, sempre foi comum as revistas vendidas em bancas de jornais trazerem como brindes, ou a custo muito baixo, tantos CDs com jogos para computador. Fosse comprado ou recebido de brinde, cada um dos novos jogos normalmente requeria uma máquina (computador) mais nova e de maior capacidade, fórmula de fazer as crianças e adolescentes pressionarem seus pais a comprarem equipamentos mais atualizados, mesmo que desnecessários nas suas atividades profissionais ou utilização doméstica. Nesta fase, a preocupação maior dos pais resumia-se em tentar evitar que seus filhos passassem horas envolvidos com estes jogos, pois eles cansam os olhos, roubam tempo de estudo em prejuízo da realização das tarefas escolares e provocam perda da capacidade de concentração para o processo de aprendizagem. A questão é que os problemas não se estabilizaram neste nível. Sabedores que jogar compõe-se de atos repetitivos, ou seja, que os jogadores passam por cada quadro ou cena centenas de vezes acompanhando com atenção aos seus personagens fictícios, os fornecedores começaram a inserir publicidade explícita e subliminar neste tipo de jogos. Assim, nesta prática desleal e ilícita, quanto mais alguém joga, mais se inculcam no consciente e, em especial, no seu subconsciente, mensagens publicitárias dos mais diversos tipos de fornecimentos, o que é mais grave ainda quando se trata de produtos ou serviços prejudiciais à saúde ou segurança do consumidor.
Atraídos pelo sucesso deste mercado, pessoas desprovidas de ética e de senso profissional, fizeram surgir jogos com imagens rápidas e muito intensas, como, por exemplo, as que levaram mais de 800 crianças japonesas a serem hospitalizadas para receber atendimento devido às convulsões que sofreram enquanto jogavam em computadores. E, de forma nefasta, criaram jogos com incentivo à violência ou com conteúdo pornográfico. Foi assim que, com base na flagrante impropriedade destes produtos para consumo (nocividade segundo a concepção ampla de saúde) que vários Procons (exemplo: o de Goiás) recolheram/retiraram do mercado, os jogos populares Counter Strike e Everquest, que vinham sendo comercializados desde 1999. Evidentemente, essa medida foi das mais acertadas, mas ela somente não basta. Necessário se faz que as entidades e, principalmente, os órgãos governamentais estabelecidos para a proteção e defesa dos interesses dos consumidores façam pesquisas e examinem cada um dos tipos de jogos que estejam sendo vendidos ou distribuídos gratuitamente no país. E, em se tratando de importação, que ela seja vedada para todos os produtos defeituosos ou impróprios ao consumo, considerando-se a proteção devida aos potenciais e efetivos adquirentes. O Código de Proteção e Defesa do Consumidor, em seu artigo 8.º, prescreve expressamente que os fornecedores não podem colocar no mercado, produtos ou serviços que acarretem riscos à saúde ou segurança dos consumidores, de modo que a responsabilização para estas práticas deve ser rigorosa, incluindo as medidas pertinentes de ordem administrativa e de ordem penal, previstas nos artigos 55 a 80 do CDC (multas, proibição de produzir e comercializar, retirada e destruição do produto, aplicação de interdição do estabelecimento que não respeitar a proibição, etc.). Em complemento, convém assinalar que em nível individual é questão de consciência de cada um, adotar a precaução de não adquirir ou utilizar produtos prejudiciais a sua saúde, mas também deve haver um sentido coletivo de proteção. Conforme prescreve o art. 227, da Constituição Federal cabe igualmente às famílias, com absoluta prioridade, assegurar às crianças e aos adolescentes, a saúde, a dignidade, a educação e o lazer sadio, direitos que os jogos perniciosos contribuem para destruir. Infere-se, portanto, que os pais, em especial, têm o dever legal (obrigação) de controlar aquilo que seus filhos adquirem ou utilizam, inclusive quando se trata de produto ou serviço destinado ao lazer (como são qualificados estes jogos).
Onde não existe mercado consumidor, o produto defeituoso (nocivo) não se mantém.
Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.