A proibição da publicidade destinada para crianças e adolescentes

Oscar Ivan Prux

A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente a identifique como tal, sendo abusiva aquela que se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (artigos 36 e 37, da Lei nº 8.078/90).

Com base nas concepções, vários países (exemplo: a Suécia) decidiram proibir a publicidade para crianças de até 12 anos. A idéia é que a realidade existente no meio social mostra que as crianças podem não ter renda, mas já possuem poder de compra (adquirem elas mesmas ou chegam a influenciar aproximadamente 30% das compras da família), tudo mesmo sem ter a experiência suficiente e o discernimento necessário para lidar bem com as sutilezas e espertezas das publicidades. É importante atentar ainda, que existem compras e participação em promoções que acontecem por telefone e por internet, meios normalmente disponíveis para acesso por menores. Por isso, na União Européia, especialistas e estudiosos como Dra. Angela Maria M. S. P. Frota, diretora do Centro de Formação para o Consumo (com sede em Coimbra, Portugal), defendem a proibição da publicidade quando dirigida para o público infantil, pois ela deve comunicar-se diretamente com os pais, como responsáveis pela decisão de compras da família. No Brasil, um país notoriamente caracterizado pela falta de consciência sobre esse tipo de problema e onde o consumo está sendo bastante incentivado, sendo que muitos publicitários pensam que podem tudo em nome de uma pretensa liberdade de criação e expressão, nem as leis, nem as normas da regulação têm sido efecientes para disciplinar corretamente essa área. E mais, existem iniciativas que apenas contribuem para piorar esse cenário, gerando confusão e beneficiando, direta ou indiretamente, unicamente interesses empresarias de agentes do mercado e deixando de priorizar as preocupações com a própria condição e formação das crianças. Um exemplo disso foi a matéria assinada por Bruno Meier para a Revista Veja, de 18 de agosto de 2010, intitulada “Educação para o consumo”. Pois bem, com esse título sugestivo e base numa pesquisa de metodologia muito discutível e restrita somente a 600 crianças e adolescentes, o autor defende comprovar-se que “a garotada vê comerciais com um inteligente ceticismo” e que a publicidade teria função pedagógica. Ou seja, supostamente, a publicidade não serviria apenas para estimular vendas, mas ensinaria a reflexão, ordenação, sistematização e crítica. Portanto, servindo para educar e contribuir na formação dos jovens expostos a ela. E mais, a matéria diz que, com a referida pesquisa, teria caído por terra “a ficção conspiratória” da criança manipulável, que se deixa conduzir pela propaganda enganosa. Observação: a matéria não explica a origem dessa “ficção conspiratória” e a quem ela tentaria prejudicar ou beneficiar. E, em meio a afirmações com certo conteúdo adequado, o autor da matéria inseriu algumas afirmações que em nada contribuem para a proteção dos menores, mas sim unicamente para interesses daqueles que atuam na chamada “selva” do mercado. Uma delas, é que a publicidade brasileira é regida pelo Conselho Nacional de Autoregulamentação Publicitária (Conar) e de que as determinações do órgão são sempre adotadas pelos agentes econômicos que atuam como fornecedores. Na defesa do referido órgão (Conar), o autor esqueceu a experiência prática de que em nosso país, a autoregulamentação nunca funcionou adequadamente ou foi realmente eficaz para os propósitos maiores da sociedade, razão pela qual não substitui a lei. Nesse contexto, propositadamente ou talvez por desconhecimento, o autor da matéria ignorou que a publicidade é regrada em específico pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor (e não pelo Conar), bem como, que nem sempre as empresas seguem as normas, pois se assim fosse, não haveriam tantos processos e procedimentos nessa área. Aliás, quem entende um pouco de ciência, sabe que em se tratando de assuntos sérios, uma palavra como “sempre” (que foi postada na matéria), só pode ser usada em situações especialíssimas, onde se tenha certeza de não haver exceções e neste caso há muitas infrações constatadas e que viraram processos e procedimentos. Conclusão: a matéria serve mais para desinformação e à determinados interesses do mercado, do que para preservar a proteção dos consumidores (em especial os menores) e suas famílias.

Em meio a essa polêmica, a conclusão é que as atividades econômicas são importantes, mas a manipulação e o consumismo são danosos às pessoas individualmente e a sociedade como um todo. Na legislação já existem algumas normas como a que veda personagens infantis em publicidades e as de restrições de horário para certos tipos de comerciais, mas ainda não se consolidou a melhor legislação para o setor. Independente disso, com o apoio expresso de mais de 70 entidades da sociedade civil, faz quase uma década que na Câmara dos Deputados, tramita ainda sem aprovação, o Projeto de Lei nº 5921/2001, que prevê a proibição desse tipo de publicidade. Assim, é de se esperar que em nosso país se realizem pesquisas e estudos sérios (profundos e confiáveis) e que enquanto eles não estiverem disponíveis, se aproveite a experiência européia para inspirar nossa legislação. Não é preciso ser marxista e supor uma necessidade de proteção contra a existência maligna de um terrível “deus mercado” que busca inexcrupulosamente de seus interesses econômicos, para entender que as crianças e adolescentes (e suas famílias) não podem ficar expostos a publicidades que os induzam a se comportar de maneira prejudicial à sua segurança e saúde (em sentido amplo, incluindo o viver melhor), tal como inscrito no Código de Defesa do Consumidor. E isso, em nada arranha o direito a liberdade de expressão, valor que em nenhuma sociedade civilizada, é irrestrito.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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