Oscar Ivan Prux

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Consumo e crédito, principalmente para aquisição de imóveis e veículos, a par de significarem solução para necessidades e sonhos de consumidores, também têm representado fonte de problemas para muitos deles. Faltam financiamentos de baixo custo para casas próprias, enquanto a indústria despeja em nosso trânsito sem adequada infraestrutura (provocandoengarrafamentos, poluição, desperdícios, etc.), uma produção na ordem de mais de 300 mil veículos por mês. E nestas mazelas de subconsumo para a aquisição de imóveis e consumismo de veículos, se insere a questão do crédito. No setor imobiliário, os conflitos havidos no passado quando as prestações subiam mais do que os salários (gerando a inadimplência e até a insolvência do consumidor), combinados com a redução de oferta de novas moradias, naturalmente dificultou a evolução satisfativa do crédito nesse mercado. De outro lado, no setor de veículos, o crédito se expandiu de tal forma que atualmente 56% da frota nacional é financiada. Cerca de 14 milhões de consumidores possuem algum contrato de crédito nessa área, ou seja, 34,2% do crédito concedido à pessoas físicas no país foi para aquisição de veículos. Sem contar os contratos de arrendameto mercantil (leasing), reserva de domínio, penhor mercantil ou até sem garantia alguma, só nos financiamentos com alienação fiduciária, no caso, os Consórcios e o Crédito Direto ao Consumidor, tem-se uma carteira de 148,5 bilhões (em junho/2009).

Até por um certo vício de gastar sem ter e não privilegiar a poupança, comumente, a maior parte dos consumidores se utiliza de crédito para adquirir seu imóveis e veículos. Nessa conjuntura, some-se a ganância daquele fornecedor que insere cláusulas abusivas em seus contratos, combinada com a sedução do consumidor pelo apelo do crédito fácil, agravada pela falta de hábito de pesquisar e analisar o contrato (que, absurdamente, alguns assinam até sem ler), e tem-se a razão de tantos litígios que desembocam nos Procons ou na Justiça.

Pois bem, e quais são os maiores problemas a serem atacados? Vamos explicitar alguns:

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1) No aspecto macro, importante referir-se o problema da responsabilidade na dação do crédito. Os fornecedores têm o dever de analisar bem a situação do pretendente e não conceder crédito para maus pagadores, subindo os juros daqueles que são corretos no adimplemento de suas prestações. Os bons não devem ser condicionados a pagar pelos maus;

2) Já no âmbito mais individual, são comuns problemas tais como: a) a cobrança ilegal de taxa(s) quando o consumidor quer efetivar o pagamento antecipado de seu financiamento, prática abusiva que não possui qualquer amparo (legal ou moral). Afora o direito que o consumidor possui de adimplir antecipadamente suas parcelas e quitar o financiamento com redução dos juros futuros, não há dúvida que existe um natural benefício para o credor que ao receber o total da dívida, deixa de correr o risco de não-pagamento. E mais, há uma vantagem social, pois o capital pode ser re-emprestado para beneficiar outro consumidor contratante e prosseguirem os ganhos do emprestador;

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b) a questão da venda do imóvel (com hipoteca) ou do veículo (com alienação fiduciária), quando ele foi retomado pelo fornecedor devido a falta de pagamento das prestações. Se de um lado, o consumidor não tem o direito de usar (e até deteriorar) o bem sem pagar o financiamento, de outro lado, não é moral que o fornecedor possa vendê-lo pelo valor que desejar (depois abatendo na dívida e cobrando o remanescente). Na forma como é feito atualmente, o credor vende por quanto quer e apenas encena de que consultou outros interessados. Certo é que, não só sob o ponto de vista econômico, mas inclusive sob o ponto de vista moral, o devedor deve ter possibilidade de buscar quem pague mais pelo seu imóvel ou veículo apreendido, para que o produto da alienação venha reduzir sua dívida remanescente; c) por derradeiro, nesse resumido rol, a questão da data de devolução do valor pago nos consórcios quando o consumidor desiste dele ou simplesmente deixa de pagar as parcelas. Por evidente, a administradora do consórcio pode cobrar do consumidor desistente ou inadimplente, uma multa contratual (normalmente 10%) que deve estar pré-fixada no contrato, mas deve ser obrigada a devolver os valores pagos, tão logo se configure a desistência. É um absurdo o consumidor ter de esperar até o final do consórcio para receber aquilo que pagou, ficando a administradora usando o dinheiro dele praticamente sem custo. As empresas que se dedicam a comercialização de consórcios são agressivas na captação e consumidores e devem suportar os ônus da atividade empresarial. Só quem nunca conheceu como funciona um consórcio pode acreditar que se trata de uma reunião de pessoas que contrata uma administradora para gerir a aquisição de bens e que só ao final do grupo é que tem condições de devolver o que recebeu. Aceitar-se essa circunstância, equivaleria a tentar instituir capitalismo sem risco para a administradora, o que é inconcebível. Absolutamente corretas estão as novas decisões judiciais, a exemplo das do TJDFT que determinaram a devolução imediata do capital do consorciado quando ele se retira ou é retirado do grupo de consórcio (seja ele de imóveis ou de veículos).

Para a proteção dos consumidores, há que haver rigor e seriedade nessa área, inclusive de forma preventiva, com atuação severa contra as cláusulas abusivas insertas nos contratos. É fundamental que, dentro de suas atribuições, participem as associações civis de proteção aos consumidores, o Banco Central (encarregado da regulação no setor de consórcios), o Ministério Público, os Procons, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor e o Judiciário, afinal se está falando de contratos que totalizam 5,1% do Produto Interno Bruto brasileiro, o que não é pouca coisa, seja em valores, seja em número de consumidores envolvidos.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.