O Banco Central do Brasil que tem uma enorme tradição de tolerância com as atitudes dos bancos, começou a emitir sinais de que pode vir a regular as tarifas cobradas dos clientes. A reação contrária da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) foi imediata, argumentando que as tarifas não devem ser reguladas por dois motivos: – a) caracterizar-se-ia em uma indevida e perniciosa intervenção do Estado na economia; – b) viria a prejudicar a livre concorrência entre os agentes econômicos (bancos) com prejuízos para os consumidores. Em complemento, tentando conter esta iniciativa, a Febraban lançou o que chama de STAR Sistema de Divulgação de Tarifas de Serviços Financeiros (site: http://200.213.193.136/star), com a promessa de, ao divulgar as tarifas dos onze maiores bancos, dar transparência ao que acontece neste mercado.

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Pura falácia! Quando é aberto, o próprio site já informa que nem todas as tarifas estão listadas nele e que não garante que os valores apresentados sejam verdadeiros e correspondam exatamente aos cobrados dos clientes. Ou seja, são apenas onze bancos e fica claro que eles (bancos) fazem o que querem, a ponto de nem mesmo a Febraban assegurar ter informações confiáveis. Não existe uma uniformidade de nomenclatura para denominar as tarifas que são cobradas e há notória falta de clareza nas informações que são prestadas, isto é, quando são prestadas. É um sistema com muitos detalhes para confundir e complicar o controle por parte do cliente, como por exemplo: há bancos que cobram em valores diferentes os saques de dinheiro, conforme a localização do caixa eletrônico que seja utilizado pelo cliente. E mais, há tarifas que se justificam, seja por conta de que representam efetivamente um serviço, seja pelo perfil do cliente que acaba utilizando um número mais elevado de serviços bancários (por exemplo: pede muitos extratos no mesmo mês). Mas também existem absurdos como cobrar para o cliente depositar (parece que depositar/entregar o dinheiro que o banco tem liberdade para utilizar na concessão de empréstimos a outros consumidores, lucrando com isto, é um fardo que precisa ser remunerado) ou tarifa para manter a conta ativa, o que no comércio, por exemplo, seria como alguém que fosse comprar produtos numa loja tivesse que pagar para permanecer nela enquanto compra, algo irracional. E o que é pior: estas tarifas muitas vezes são lançadas a débito nas contas correntes dos consumidores sem qualquer justificativa ou aviso, como se eles fossem pertencentes a uma classe inferior (submissa e sem direitos), sendo natural sua subserviência as imposições dos detentores do capital. Não se trata de retórica marxista (até porque não comungamos deste credo), mas autêntica constatação. Observe-se que no cotidiano, a pessoa que se apoderar de patrimônio pessoal de outra deve ser criminalmente processada e mesmo que devolva o bem assim que a outra reclamar, poderá ser condenada, no mínimo, por furto ou tentativa de furto, enquanto estas pessoas jurídicas (saliente-se dirigidas por pessoas físicas, pois máquinas não agem sozinhas, sem ao menos existir uma programação) quando através de débitos (sejam tarifas ou não) injustificados e sem autorização prévia, debitam e se apoderam de valores existentes nas contas correntes dos clientes, embora a conduta penal seja idêntica, não se tem notícia de punição desta ordem.

Não se pode ignorar que, como informou a revista Veja de 3/10/2007, entre 2000 e 2006, a receita que os bancos auferiram com prestação de serviços cresceu de 13,5 bilhões de reais para 52,6 bilhões de reais, ou seja, quadruplicou. De olho neste filão de lucro astronômico, por evidente, os bancos não desejam que exista qualquer espécie de controle sobre sua liberdade de cobrar o que querem, nos valores que querem e quando querem.

É fundamental refletir que, mundialmente, existe notório processo de ?bancalização?. Seja pobre ou seja rico, a quase totalidade das pessoas tem de ter contrato (no mínimo de conta) com algum banco, nem que seja apenas para poder receber seu salário. Desta forma, devido ao sistema em que vivemos, ter contato com banco não é algo que o consumidor possa evitar e, por isto, a importância de protegê-lo contra as arbitrariedades destes fornecedores de serviços. Este embate contra os abusos dos bancos já é antigo. As entidades bancárias sabem de seu poder e têm absoluta consciência de que o Banco Central do Brasil, sempre foi tolerante com as práticas abusivas utilizadas por elas (tivemos anos em que apesar de haver mais de 14.000 reclamações de clientes, não foi aplicada nenhuma punição).

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Assim, por se tratar de um setor cada vez mais oligopolizado, no qual existem poucos – mas imensamente poderosos – fornecedores, para mais de 100 milhões de vulneráveis consumidores, a regulação na área das tarifas bancárias é mais do que imprescindível. A plena livre concorrência não funciona bem em setores com estas características. Veja-se que não existe sequer uma uniformização de nomenclatura, algo que precisa ser feito com urgência. E não se pode acreditar na autoregulamentação voluntária deste setor como forma de resolver estes problemas, pois os bancos não são afeitos a limites de total respeito aos consumidores, tanto é que nem a Febraban sabe com segurança o que os bancos cobram e quando cobram, como demonstra o site por ela criado. A intervenção do Estado na economia através da regulação deve ser criteriosa, mas neste caso é fundamental como única forma de fazer os detentores de tanto poder de mercado (market power) restringirem seus abusos e obrigarem-se em todos os casos, a respeitar efetivamente os direitos de seus clientes/consumidores.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.