Ao elencar os direitos básicos do consumidor, a Lei n.º 8.078/90 englobou no inc. I, do art. 6.º, tanto a informação e a educação para o consumo, quanto o asseguramento da liberdade de escolha e igualdade nas contratações. Nesta circunstância, estamparam-se vários direitos contemplados simultaneamente em num mesmo dispositivo, de modo a envolver todo um complexo de relações. Não que estes direitos deixem de se relacionar nas situações do cotidiano, mas cada um deles possui um universo próprio e igualmente importante para a proteção dos interesses dos consumidores. Na efetivação de cada um deles, é comum haver interação de um com outro, mas isto não os iguala, confunde ou mesmo faz por diminuir a qualquer que seja. A igualdade nas contratações se integra com a liberdade de escolha, numa espécie de complementação recíproca. No mesmo sentido, a informação e educação para o consumo contribuem em todo o contexto das relações de consumo, todavia, nem por isso obscurecem a importância da aplicação do direito à liberdade de escolha.
Pois bem, em que consiste para o consumidor, a liberdade de escolha? A resposta principia pela constatação de que ela deve ser tomada em sentido amplo, ou seja, envolvendo desde a fase de busca no mercado pelo produto ou serviço, até os demais momentos da contratação. Trata-se de direito básico que só aflora com a possibilidade de acesso aos produtos ou serviços, pois sem este pressuposto não há o que escolher. Acesso sob o ponto de vista geográfico e sob o ponto de vista econômico, bem como, dentro dos limites do possível, a existir variedade de opções disponíveis no mercado (de produtos e serviços e de processos de fornecimento).
A partir destes pressupostos mínimos, vem o conhecimento (inclui informação e educação para o consumo) e a conscientização que permitem o exercício da verdadeira liberdade de escolha. Uma vez instruída, a pessoa pode buscar boas opções, se protegendo diante das práticas que atentam contra o livre mercado e contra seus interesses enquanto consumidor. A liberdade que é estipulada no plano geral dentro da Constituição Federal, respeitadas as especificidades, é nesse caso, estendida ao plano individual do consumidor nas relações de consumo. Independente do consumidor ainda estar sujeito a muitos fornecimentos sob o regime de monopólio (ou até certos oligopólios mais agressivos comercialmente), seu direito de escolha deve ser imunizado contra a ação de cartéis e outras práticas abusivas, mesmo individualizadas, que existam no mercado de consumo. Observe-se que algumas dessas fórmulas empresarias de fornecimento são escancaradamente desvirtuadas, como nos casos de fornecedores que impõem vendas casadas. Em nível geral de mercado, podemos observar a freqüente imposição de várias destas práticas, a exemplo do banco que só aceita contratar determinado financiamento para o qual estão previstos juros mais baixos, se o consumidor se submeter a adquirir também o seguro (diga-se, com preço de tabela ?cheia?) através da seguradora de seu grupo econômico. Outras, porém, são mais sutis e vêm implementadas em técnicas de marketing empresarial, em parcerias empresariais, ou até em escolhas e conselhos profissionais cuja malícia, muitas vezes, o consumidor nem chega a perceber. Exemplos podem ser encontrados aos milhares, de situações em que o fornecedor escolhe determinados produtos que vão compor um serviço e não o faz por critérios técnicos, mas no interesse em vantagem direta ou indireta, tal como comissão ou repasse por valor maior a ser pago pelo consumidor. Incluem-se neste elenco, desde os produtos que para funcionar precisam de outros e, maliciosamente, são idealizados para serem compatíveis apenas com aqueles fabricados pelo mesmo fornecedor, até as situações em que determinados fornecedores, principalmente profissionais liberais, com base na ascendência de suas opiniões sobre o consumidor, utilizam a técnica de ?indicar? determinados produtos ou determinado fornecedor para o consumidor adquirir o que ele receitou, apregoando que desta forma haverá maior segurança de qualidade.
Acrescente-se também, a consideração quanto a outros elementos conjunturais que tornam mais delicada esta problemática, como a brevidade em que o consumidor precisa do produto ou serviço ou o local em que ele necessita do fornecimento, fatores que, muitas vezes, condicionam a que a oferta fique restrita a um ou poucos fornecedores que assim adquirem um maior poder na contratação. Porém, essas eventuais distorções não devem significar situação gravosa para o consumidor, cabendo ao fornecedor atuar de forma ética e não se aproveitar destas condicionantes da escolha. Nesta área, portanto, as interferências por parte do fornecedor só se justificam quando a escolha por parte do consumidor seja tecnicamente equivocada, a ponto de poder comprometer a qualidade do fornecimento, caso em que, é oportuno o aconselhamento para conscientizar a respeito da possibilidade de uma melhor alternativa.
Os princípios da ordem econômica, previstos no art. 170 da Constituição Federal, só serão implementados convenientemente, estando o ambiente negocial pautado integralmente na ética empresarial, incluindo a proteção desse direito básico dos consumidores. Assinale-se, que esta forma de conduta, umbilicalmente ligada à boa-fé objetiva, protege interesse dos consumidores, mas igualmente labora em prol da concorrência leal entre os fornecedores. Ou seja, perfaz interesses comuns à coletividade por possibilitar a existência de um livre mercado que seja profícuo para boa convivência social.
Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.