A igualdade nas contratações

O direito básico dos consumidores à igualdade nas contratações (inc. II, art. 6.º, Lei n.º 8.078/90), apresenta importância não apenas para as partes envolvidas, mas também para o restante do contexto social. Ele é composto de duas faces relevantes: – o equilíbrio na contratação considerando seus partícipes diretos. Ou seja, o equilíbrio de forças entre o consumidor e o fornecedor; – e, o asseguramento de que nas relações de consumo, exista sempre a igualdade de possibilidades negociais, bem como a tratamento isento de qualquer discriminação injustificada para com consumidor que busque o fornecimento.

Por equilíbrio contratual entre o consumidor e o fornecedor na relação de consumo é comum entender-se apenas o equilíbrio da equação econômica do contrato. Entretanto, é importante visualizar todo conjunto de encargos e deveres que são atribuídos para as partes. Exemplo: é desequilibrada a relação em que, para o cumprimento de sua obrigação de pagar a mensalidade, o consumidor tem débito em conta corrente bancária, enquanto para obter a assistência à saúde que contratou, a operadora do plano exige o cumprimento de trâmites burocráticos despropositados, a impor idas e vindas, com sucessivas autorizações e confirmações, para quem necessita agilidade na liberação da cobertura de seu atendimento médico ou hospitalar. O fornecedor é senhor do mercado, mas precisa ser muito bem equacionada esta natural desigualdade de forças que tende a prejudicar o consumidor. Sinaliza essa perspectiva, o próprio fato da Lei nº 8.078/90, ter sido instituída como Código de Proteção e Defesa do Consumidor (e não como Código das Relações de Consumo), a indicar sua função de re-equilibrar relações intrinsecamente desiguais entre o fornecedor (mais forte) e consumidor (mais fraco). A mencionada lei, ao tratar de forma diferente aos desiguais (na medida adequada à sua desigualdade), trouxe a fórmula estabelecida para implementar a igualdade isonômica objetivada pela Constituição Federal.

Já quanto à igualdade de possibilidades e de tratamento negocial, têm-se aspectos que podem se relacionar, tanto com as práticas de mercado, quanto com o que acontece dentro da contratação. Observe-se que pode parecer despropositado falar-se de práticas envolvidas na fase pré-contratual, porém é conveniente observar que o CDC prescreve que toda informação ou publicidade suficientemente precisa, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado (art. 30), bem como, que as declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor (art. 48). Deste modo, percebe-se que a igualdade nas contratações começa nas práticas de mercado que, posteriormente, acabam fazendo parte do conteúdo do contrato. A igualdade nas contratações principia com o direito ao acesso ao consumo sem discriminação, seja econômica, seja por outros fatores pessoais que possam distinguir as pessoas. Aliás, em seu rol de práticas abusivas de mercado, o inc. II, art. 39, do CDC, inclui a ação de recusar atendimento as demandas dos consumidores, respeitada a exata medida das disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes. Assim, é ilícito o fornecedor deixar de atender a determinado(s) consumidor (es) quando tal é feito com o propósito de, injustificadamente, não lhe(s) dar acesso ao consumo ou desigualar a contratação que venha a ser firmada.. De forma igualitariamente isonômica, os consumidores devem ter direito de participar do mercado. É injusto, por exemplo, ver consumidores ricos quando vão a agência bancária pagar suas contas de água e luz serem atendidos em salas vips, enquanto consumidores pobres que vão pagar o mesmo tipo de conta tem de enfrentar filas em local desconfortável e inadequado. Por evidente, não é uma questão de dar à todos um completo acesso a qualquer serviço ou produto, posto que é impossível baratear todos os tipos de fornecimentos, assim como, nunca conseguiremos toda uma população com bom poder aquisitivo. Também a igualdade de possibilidades contratuais, não exige que todos os negócios versando sobre um mesmo tipo de fornecimento, tenham sempre o mesmo preço e as mesmas condições. O que se assegura, em condições de igualdade, é a possibilidade de acesso ao mercado de consumo e a possibilidade de negociação sem discriminações preliminares que sejam injustificadas, bem como, que o cumprimento do contrato não desiguale aos consumidores contratantes. Podem militar em favor dos fornecedores, algumas justificativas amparadas em circunstâncias de mercado, mas elas não são isoladamente suficientes para justificar diferenças no tratamento dedicado a cada um dos consumidores. Há sempre que haver amparo legal para tratamentos diferenciados. É importante notar, que o fornecedor quer vender o máximo possível e quando injustas discriminações acontecem, elas não surgem ao acaso, mas são intentadas com objetivo claro de obter alguma vantagem indevida ou, ainda, como represália destinada a prejudicar o consumidor. Portanto, se o consumidor busca um consumo lícito e é adimplente, deve, no mínimo, ter a possibilidade de negociar com o fornecedor e obter acesso concreto aos contratos de consumo, tal como os demais consumidores. Simpatias, antipatias, interesses econômicos díspares, convicções, culturas e credos diferentes, a menos que amparados em expresso permissivo legal, não podem servir para obstaculizar esse ou aquele consumidor em específico, de ter, igualitariamente (de forma isonômica), a possibilidade de acesso aos fornecimentos e cumprimento equilibrado dos contratos dispostos no mercado de consumo.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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