Existem muitas reclamações a respeito de práticas abusivas adotadas por algumas empresas empenhadas em ?faturar? de qualquer jeito, mesmo maculando direitos básicos dos consumidores. A questão relaciona-se a procedimentos ?criativos? inventados por profissionais de marketing inescrupulosos e lesivamente aplicados por aqueles que trabalham no setor de comercialização de produtos e serviços de certas empresas despreocupadas com sua imagem e credibilidade. Atualmente, o exemplo mais comum no mercado tem sido a prática mal-intencionada de tentar impor de forma unilateral e por simples omissão, contratos de adesão para comercialização de seus produtos e serviços à consumidor. Esta figura esdrúxula (?contrato de adesão por omissão?), juridicamente não existe, ou seja, qualquer tentativa da empresa de impor este tipo de contratação aos seus clientes, não gerará contrato válido, cabendo inclusive providências judiciais contra ela para que sejam indenizados os danos decorrentes. Explico: principalmente quando se trata de serviços adicionados a outro contrato que o fornecedor já mantém com seu cliente ou quando é o caso de renovação de contrato, algumas empresas caracterizadamente pouco honestas, sem qualquer manifestação positiva do consumidor no sentido de concordar com a nova contratação (ou renovação), fazem de conta que houve o consenso e passam a cobrar a contratação. Nestes casos, elas alegam cinicamente que isto é feito para ?comodidade? do consumidor, que desta forma não precisa se preocupar para contratar e que mandaram uma correspondência para o cliente dizendo que se ele não desejasse a contratação, tinha um determinado prazo para ligar para empresa avisando que não estava de acordo, mas que não houve este contato. Nem mesmo existe qualquer garantia de que o consumidor recebeu a referida correspondência ou que concordava com a contratação. Em síntese: ?metem a mão no bolso? do consumidor e depois dizem que ele tem um prazo para reclamar, sendo que se não o fizer, na versão estapafúrdia destas empresas declaradamente más fornecedoras, ?contratado estará!?. Assim fez a antiga Telepar S/A, quando remeteu correspondência dizendo que estava disponibilizando um seguro da rede interna para seus assinantes de telefones fixos, alertando-os que, se em 10 (dez) dias eles não entrassem em contato, a contratação deste serviço estaria concretizada, com o correspondente débito do valor na conta telefônica. Semelhante procedimento também tomou o antigo Banco Banestado S/A, primeiro debitando na conta de clientes o valor de um seguro pessoal, para depois informar que caso o consumidor não o desejasse, teria de entrar em contato para cancelá-lo, senão o referido serviço continuaria a ser debitado. E agora tem feito a Editora Abril para conseguir, sem qualquer autorização do cliente, fazer a renovação de assinaturas de suas revistas. Ou seja, antes mesmo da assinatura vigente se encerrar, o consumidor é surpreendido com uma cobrança de uma renovação que não fez. E o que é pior, se, infelizmente, a empresa possuir de alguma forma o número do cartão de crédito do consumidor, esta remete o débito (por cartão) segundo seu livre critério, na modalidade que ela arbitra e sem que o consumidor tenha fornecido qualquer autorização. Como sempre, apresentam a ridícula alegação de que: ?fizemos isto para facilitar sua vida e ainda mandamos uma carta informando que deveria manifestar-se caso não estivesse de acordo, sendo que como você não entrou em contato para dizer que não queria, a assinatura foi renovada?.

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Por evidente, esta prática subverte um princípio básico do direito contratual, no caso a imprescindibilidade da manifestação expressa do consentimento do consumidor para que a contratação nova ou renovada possa acontecer. É elementar que não existe contrato válido em que adesão seja obtida por simples omissão, sem manifestação positiva do consumidor. E mais, a empresa não pode impor ao consumidor um dever de ter de entrar em contato por atendimentos morosos (telefones 0800 ou 0300, que é pago), senão o contrato tornar-se-ia válido.

Contando com a possibilidade de que muitos consumidores nem percebam a cobrança ou mesmo não se interessem em reclamar, este tipo de conduta comercial pode até ser rentável para estas empresas gananciosas, mas isto não elimina a ilicitude da notória prática abusiva. Note-se que costumam ser as empresas de grande porte e que fornecem em grande escala, as que costumam adotar estas condutas. Dotadas de grande capacidade econômico-financeira, elas desconsideram o respeito aos concorrentes e aos consumidores. Deste modo, se para atuar escolhem fórmulas que se traduzem em práticas abusivas, merecem ter de indenizar os consumidores pelos danos materiais (prejuízos) e morais (decorrentes dos aborrecimentos), inclusive com a aplicação da teoria intitulada punitive damages (a reparação deve ser maior, quanto maior for o porte da empresa, como forma a desestimulá-la a continuar agindo desonestamente). Não se trata de favorecimento ao consumidor, pois as empresas são senhoras das escolhas de seus procedimentos, cabendo-lhes arcar com a integral responsabilidade por eles. Acrescente-se que, considerando tratar-se de fornecimento de massa envolvendo milhares de consumidores sendo lesados, tem-se que as ações coletivas para reparação dos danos (inclusive podendo ser de iniciativa do Ministério Público), evidentemente se revelam um excelente instrumento no sentido de, célere e simplificadamente, alcançar-se justiça para os casos concretos. Reprimir estas práticas abusivas, com a devida reparação aos consumidores lesados, é forma contributiva para a melhoria da própria convivência social.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito, coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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