A cobrança de estacionamento acima dos limites efetivamente utilizados

Embora se trate de matéria controvertida, é de se entender que os estacionamentos regulamentados (ditos rotativos) em vias públicas caracterizam relação de consumo, tal qual os estacionamentos privados.

Existe a diferença de que nos estacionamentos privados a segurança é garantida e tal não tem acontecido (como deveria ser) nos estacionamentos existentes nas ruas. Entretanto, trata-se de um serviço público que é prestado normalmente por empresa privada, a qual, valendo-se de uma das modalidades de exploração terceirizada pelo Poder Público, fornece serviço divisível (uti singuli) que é pago individualmente conforme a utilização feita pelo usuário. Independente de que a cobrança ocorra por ficha de controle ou créditos em um parquímetro que permite o auto-atendimento por parte de quem estaciona seu veículo, os elementos essenciais da relação de consumo estão presentes, seja nos estabelecimentos privados que se dedicam ao ramo de estacionamento, seja nos estacionamentos regulamentados existentes nas vias públicas. O simples fato do estacionamento do veículo acontecer em via que é pública e a regulamentação ter como objetivo a rotatividade na utilização dos poucos espaços disponíveis, não desnatura os elementos basilares para a existência de uma relação de consumo. Muitos fornecedores também utilizam espaços públicos para fornecer seus serviços privados e isso em nada interfere quanto a ser ou não uma relação de consumo, algo que deve ser constatado a partir dos elementos juridicamente relevantes que já foram mencionados. Portanto, sempre que alguém, mediante pagamento, estaciona seu veículo em estacionamento privado ou em via pública com estacionamento regulamentado, há um consumidor, há um fornecedor e há o fornecimento de um serviço remunerado especificamente, de modo que presentes estão os elementos essências para a existência de uma relação de consumo e deve se aplicar o Código de Defesa do Consumidor.

Dentro desse contexto, o problema maior que tem sido objeto de lesão aos interesses patrimoniais dos consumidores, diz respeito à forma de cobrança pelo serviço que é efetivamente utilizado. Tanto o estacionamento em espaço público, como o que acontece em estabelecimento privado apresentam problemas. Afora a questão das graves falhas ocasionais ou desonestamente programadas nos equipamentos (parquímetros que suprimem créditos ou máquinas que aumentam o número de minutos), o mais grave problema reside na cobrança com arredondamento para maior, considerando sucessivos períodos de 30 ou 60 minutos cada um. E como o valor cobrado é calculado por máquina, independente do motivo, não existe a menor flexibilidade para quem quer que seja. Nas vias públicas, normalmente é permitido um pequeno período de carência de 10 minutos (na maioria das vezes, insuficiente para sequer entregar uma encomenda) e, por evidente, nos estacionamentos privados nem isso é concedido. Ou seja, como o cômputo de valor sempre leva em consideração um tempo fixo (30 ou 60 minutos), na prática, basta que o consumidor ultrapasse um minuto do tempo programado para ter de pagar por meia ou uma hora a mais, evidente cobrança a maior que não corresponde ao serviço realmente utilizado.

Como é impertinente falar em cobrança por simples disponibilização e nem existe qualquer hipótese capaz de justificar esse tipo de procedimento, objetivamente então, tem-se que essa rotineira cobrança a maior por um serviço não efetivamente prestado é prática abusiva que desrespeita os direitos dos consumidores. Note-se que no tempo em que o controle era todo visual e manual praticado por um atendente, ficava muito trabalhoso e difícil fazer uma aferição exata dos minutos utilizados, mas em tempos de tecnologia avançada, as máquinas que agora são utilizadas podem calcular qualquer fração para a qual forem programadas, de modo que não se justifica qualquer cobrança desproporcional com a utilização. Por acomodação ou esperteza, o procedimento rendoso para o fornecedor foi sendo mantido apesar da evolução não mais justificá-lo, mas chegou o tempo de ser alterado em respeito aos direitos dos consumidores.

Desse contexto, então, se extrai que além da União, os Estados e Municípios possuem o poder de legislar em matéria de consumo, de modo que cabe ao Poder Público regulamentar este tipo de prestação de serviços, de forma a assegurar a devida proteção aos legítimos interesses econômicos dos consumidores. Faça-se menção quanto à busca de solução para este problema, a meritória atuação do Ministério Público que, sinalizando com a possibilidade de ingressar com uma Ação Civil Pública para suspender a cobrança caso as empresas insistam em manter esse procedimento abusivo, tem proposto Termos de Ajuste de Conduta pelo quais essas fornecedoras dos serviços assumem o compromisso de efetuar a cobrança do estacionamento correspondendo exatamente aos minutos utilizados pelo usuário. E vale acrescentar no mesmo sentido, o quanto é importante que se tenha às associações dedicadas à proteção dos interesses dos consumidores, trabalhando aliadas em iniciativas que possam ensejar convenções coletivas de consumo com o mesmo efeito ou, então, movendo as ações pertinentes objetivando suprimir do mercado esta prática abusiva.

Assim, a par da erradicação dessa sistemática de cobrar em valor superior ao efetivamente fornecido e da possibilidade de sanções para quem insistir em praticar cobrança com arredondamento para maior, fica evidente que o consumidor pode reclamar extrajudicial ou judicialmente para não pagar valor mais elevado que o correspondente ao número de minutos efetivamente utilizados, bem como, buscar receber em dobro o que indevidamente lhe tenha sido cobrado.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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