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RECURSO ESPECIAL N.º 595.600/SC

Rel.: Min. Cesar Asfor Rocha

EMENTA

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Não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade, estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torná-la imune de qualquer veiculação atinente a sua imagem.

Se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução pela imprensa, uma vez que a proteção à privacidade encontra limite na própria exposição realizada.

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Recurso especial não conhecido.

(STJ/DJU de 13/09/04, pág. 259)

 Numa praia pública lotada, em dia de feriado, M.A.A.P. foi fotografada quando praticava "topless". Divulgada a fotografia pelo Jornal Z.H., ingressou M.A. com ação de indenização por danos materiais e morais contra Z.H.J. S/A, em razão de não haver autorizado a publicação da fotografia obtida em momento de lazer.

Julgada improcedente a ação no Juízo de 1.º Grau, a autora recorreu ao Tribunal de Justiça, que lhe deu ganho de causa, por maioria de votos, estabelecendo a indenização em 100 (cem) salários mínimos.

Em embargos infringentes a decisão foi revista, considerando como indevida a indenização.

Irresignada, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, o qual, admitido o recurso na origem, dele não conheceu em acórdão da Quarta Turma, do qual foi relator o ministro César Asfor Rocha, com o seguinte voto:

 VOTO

Exmo. Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Relator): A recorrente, que "não é atriz, nem modelo amador ou profissional, nem é pessoa famosa ou que sobreviva da comercialização de sua imagem." (fl. 127), sustenta a ocorrência de danos morais em virtude da publicação em jornal de circulação estadual de sua imagem em topless, fotografada em local público.

Refutando a existência de ofensa moral, assentou o v. acórdão recorrido:

"Honra é o sentimento de dignidade própria que leva o indivíduo a procurar merecer a consideração geral. Se não há fato lesivo à honra, tampouco, não existe o dever de indenizar.

A imagem das pessoas constitui uma forma do direito à intimidade. Quem quer preservar sua honra e sua intimidade não expõe os seios para deleite da multidão. Se a embargada resolveu mostrar sua intimidade às pessoas deve ter maturidade suficiente para suportar as conseqüências de seus atos e não atribuir à imprensa a responsabilidade pelo ocorrido.

É importante salientar que a praia estava cheia e era feriado. A fotografia não foi obtida de recinto ou propriedade particular, ou de ambiente exclusivamente privado. Mas muito pelo contrário, o fotógrafo simplesmente registrou o que estava à mostra para todos os presentes na Praia Mole, naquele momento.

A embargada, mostrando-se da forma que estava, em pé, não estava em condições de ignorar que se tornaria objeto de atenções e aceitou implicitamente a curiosidade geral.

Da mesma forma que tinha direito, diante da liberdade que lhe é assegurada, de praticar topless, o fotógrafo usou da liberdade para fazer seu trabalho e registrou esta cena, e, no dia posterior, o jornal veiculou esta fotografia, exercendo seu direito de liberdade de imprensa. O jornal não fez uso irregular da fotografia, nem fez chamada sensacionalista. Como ficou registrado, não houve nenhum destaque e o nome da autora sequer foi referido na reportagem que a fotografia ilustra.

(…)

A honra da embargada, é importante salientar, não foi violada de maneira alguma. Poderia, em tese, admitir-se o pleito aqui deduzido em hipótese outra, por exemplo, na foto de uma moça, em uma praia, no momento em que acabava de recuperar-se de uma onda, totalmente desprevenida e que se encontrava com a peça superior de sua roupa de banho fora do lugar. Nesse caso, sim, absolutamente, inidônea e oportunista a atitude do jornal.

Mas a partir do momento em que a embargada não teve objeção alguma de que pessoas pudessem observar sua intimidade, não pode ela, vir à Justiça alegar que sua honra foi violada pelo fato de o Diário Catarinense ter publicado uma foto obtida naquele momento numa praia lotada e em pleno feriado." (fls.195-6).

Desse modo, o deslinde da controvérsia, como se desprende, reclama a conciliação de dois valores sagrados das sociedades culturalmente avançadas, quais sejam o da liberdade de informação (no seu sentido mais genérico, aí incluindo-se a divulgação da imagem) e o da proteção à intimidade, em que o resguardo da própria imagem está subsumido.

É certo que "em se tratando de direito à imagem, a obrigação da reparação decorre do próprio uso indevido do direito personalíssimo, não havendo de cogitar-se da prova da existência de prejuízo ou dano, nem a conseqüência do uso, se ofensivo ou não." (Segunda Seção, EREsp 230.268/SP, relatado pelo eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 04.08.2003).

Todavia, a proteção à intimidade não pode ser exaltada a ponto de conferir imunidade contra toda e qualquer veiculação de imagem de uma pessoa, constituindo uma redoma protetora só superada pelo expresso consentimento, mas encontra limites de acordo com as circunstâncias e peculiaridades em que ocorrida a captação.

Esta Turma, em situação que aproveita à espécie, decidiu:

"CIVIL. DIREITO DE IMAGEM. REPRODUÇÃO INDEVIDA. LEI N. 5.988/73 (ART. 49, I, "F"). DEVER DE INDENIZAR. CÓDIGO CIVIL (ART. 159).

A imagem é a projeção dos elementos visíveis que integram a personalidade humana, e a emanação da própria pessoa, é o eflúvio dos caracteres físicos que a individualizam.

A sua reprodução, consequentemente, somente pode ser autorizada pela pessoa a que pertence, por se tratar de direito personalíssimo, sob pena de acarretar o dever de indenizar que, no caso, surge com a sua própria utilização indevida.

É certo que não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade, estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torná-la imune de qualquer veiculação atinente a sua imagem; todavia, não se deve exaltar a liberdade de informação a ponto de se consentir que o direito a própria imagem seja postergado, pois a sua exposição deve condicionar-se a existência de evidente interesse jornalístico que, por sua vez, tem como referencial o interesse publico, a ser satisfeito, de receber informações, isso quando a imagem divulgada não tiver sido captada em cenário publico ou espontaneamente.

Recurso conhecido e provido." (REsp 58.101/SP, por mim relatado, DJ 09.03.1998).

Na espécie, a recorrida divulgou fotografia, sem chamada sensacionalista, de imagem da recorrente praticando topless "numa praia lotada em pleno feriado" (fl. 196).

Isto é, a própria recorrente optou por revelar sua intimidade, ao expor o peito desnudo em local público de grande movimento, inexistindo qualquer conteúdo pernicioso na veiculação, que se limitou a registrar sobriamente o evento sem sequer citar o nome da autora.

Assim, se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução sem conteúdo sensacionalista pela imprensa, uma vez que a proteção à privacidade encontra limite na própria exposição realizada.

Portanto, in casu, não há qualquer ofensa moral.

Ante o exposto, não conheço do recurso.

 Decisão unânime, votando com o relator os ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Júnior e Barros Monteiro.

Processual penal. Recurso do Ministério Público. Contagem do prazo e curso nas férias forenses.

RECURSO ESPECIAL N.º 504.294/SP

Rel.: Min. Hélio Quaglia Barbosa

EMENTA

1. O membro do Ministério Público possui prerrogativa de que o prazo para a interposição de recurso comece a fluir a partir de sua intimação pessoal (LC n.º 75/93, art. 18, II, "h", e Lei 8.625/93, art. 41, IV).

2. O entendimento de que só corre o prazo recursal quando o integrante do Ministério Público, de acordo com a conveniência própria, lance no processo a ciência, não se coaduna com a paridade de armas que deve ser observada no trato da acusação e da defesa (Precedentes do STF, HC n.º 83.255/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa).

3. Os prazos para a interposição dos recursos, em matéria criminal, são contínuos e peremptórios, conforme a regra fulcrada no artigo 798 do CPP, não se interrompendo ou suspendendo nas férias, domingos ou feriados.

4. Recurso não conhecido, pois intempestivo.

(STJ/DJU de 13/9/04, pág. 300)

 É da entrega dos autos com vista na repartição do Ministério Público que se conta o prazo para o recurso, o qual, por força do disposto no art. 798 do C.P.P. não é interrompido ou suspenso com o advento das férias forenses, conforme decidiu a Sexta Turma, em acórdão da relatoria do ministro Hélio Quaglia Barbosa, com o seguinte voto:

 O Exmo. Sr. Ministro Hélio Quaglia Barbosa (Relator):

1. Preliminarmente, é de se verificar se todos os requisitos de admissibilidade do presente recurso estão presentes. A dúvida surge com relação à tempestividade.

2. O membro do Ministério Público possui a prerrogativa de que o prazo para a interposição de recurso comece fluir a partir de sua intimação pessoal, de acordo com o disposto no artigo 18, inciso II, alínea "h" da Lei Complementar n.º 75, de 20 de maio de 1993 e artigo 41, inciso IV, da Lei n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993.

Inicialmente, a Terceira Seção dessa Colenda Corte Superior de Justiça inclinava-se no sentido de que o lapso temporal teria início quando, inequivocadamente, o representante do Parquet recebia os autos com vista, ou seja, no momento da aposição de seu "ciente".

Ocorre que o Pretório Excelso, no julgamento do habeas corpus n.º 83.255/SP, escorreitamente, entendeu que a contagem dos prazos para o Ministério Público inicia-se na data da entrega dos autos com vista na secretaria administrativa da instituição, e não da aposição do ciente. Transcreve-se excerto do voto condutor do referido acórdão de lavra do e. Ministro Marco Aurélio, verbis:

"[…] Descabe tratamento desigual, assentando-se que os processos, após a entrada no setor próprio do Ministério Público, podem permanecer na prateleira aguardando que o titular da ação penal delibere, quando melhor lhe aprouver, sobre a fixação do termo inicial do prazo para desincumbir-se de certo ônus processual. Significa afirmar que só corre o prazo recursal quando, de acordo com a conveniência própria, o integrante do Ministério Público lance no processo a ciência. Esse entendimento não se coaduna coma a ordem natural das coisas, com a natureza do prazo recursal, coma paridade de armas que deve ser observada no trato da acusação e da defesa. Assentado o direito de o próprio titular da ação penal dispor do prazo – e a isso equivale a definição do termo inicial, fator que retarda a marcha do processo -, ter-se-á de caminhar no mesmo sentido no tocante à Defensoria Pública, à pessoa ou ao órgão que atue no papel a si reservado, e, por que não dizer, relativamente à defesa de uma maneira geral. […]"

Esse entendimento passou a ser adotado pela eg. Sexta Turma dessa Corte Superior, conforme se verifica da transcrição das seguintes ementas:

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. INTIMAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. PRAZO RECURSAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO CONHECIDOS PELO TRIBUNAL ‘A QUO’ POR INTEMPESTIVIDADE.

O Ministério Público possui a prerrogativa legal de receber a intimação pessoal em qualquer processo e em qualquer grau de jurisdição. O prazo recursal do Ministério Público inicia-se com a intimação pessoal de seu representante, consubstanciada com a entrega dos autos com vista (Lei n.º 8625, art. 41, IV), e não com a aposição do seu ciente, o que lhe conferiria posição privilegiada de absoluto controle dos prazos processuais, afrontando os princípios do devido processo legal e da igualdade das partes. Recurso especial improvido."

(REsp 343747/DF. Sexta Turma. Rel. Min. Paulo Medina. DJ de 31/05/2004).

"RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. PRAZO. DIES A QUO. INTIMAÇÃO PESSOAL. CIÊNCIA. RECURSO PROVIDO.

1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme em que a intimação do Ministério Público é pessoal, o que exclui toda e qualquer forma de presunção da sua ocorrência, não havendo como afirmá-la, ad exemplum, pela simples presença física dos autos no gabinete do membro da Instituição ministerial, dever que é do poder Judiciário proceder-lhe à intimação na forma da lei processual vigente, sem o que, em espécie tal, há de se tê-la feita só e quando é lançado o ciente do órgão acusatório.

2. Tal hipótese em nada se identifica com aqueloutra em que a Instituição do Ministério Público, excluindo toda possibilidade de intimação pessoal do membro do Parquet e assumindo o ônus da remessa imediata, cria serviço administrativo com atribuição exclusiva de recebimento, cadastramento e remessa de feitos a seus membros, caso em que se tem como realizada a intimação no momento em que o serviço administrativo da Instituição faz a entrega dos autos ao seu integrante com atribuição, fixada pelo ato de documentação respectivo (carimbo de remessa), observado o prazo assinado pelo artigo 798 do Código de Processo Penal, tempo próprio do trâmite administrativo do feito.

3. Esta, a nossa compreensão, porque fundamentalmente não se pode deferir o controle do prazo a qualquer das partes, compreensão essa que, contudo, não foi sufragada pela Terceira Seção, que, assim, decidiu: "CRIMINAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL. PRAZO CONTADO A PARTIR DA APOSIÇÃO DO CIENTE PELO RE-PRESENTANTE DO PARQUET. EMBARGOS ACOLHIDOS. O prazo para a interposição de recurso ministerial tem início na data da aposição do ciente pelo representante do Parquet e, não, do ingresso dos autos na Procuradoria de Justiça. Embargos acolhidos." (EDclREsp 259.682/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Relator p/Acórdão Ministro Gilson Dipp, in DJ 13/10/2003).

4. Recurso especial provido."

(REsp 341379/DF. Sexta Turma. Rel. Min. Hamilton Carvalhido. DJ de 15/12/2003).

3. Por fim, destaque-se o recente julgamento proferido pela Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça, que nos autos do REsp 628.621, da relatoria do e. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Informativo n.º 216 do STJ), concluiu, de igual forma, que o prazo recursal do Ministério Público começa a fluir da data em que os autos deram entrada no protocolo administrativo daquele órgão.

4. Por outra volta, tem-se presente que o entendimento que predomina nessa e. Corte Superior é o de que o recesso forense, em matéria criminal, não suspende ou interrompe a contagem dos prazos processuais, conforme o disposto no artigo 798 do Código de Processo Penal. Nesse sentido são os seguintes precedentes:

"RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES INTEMPESTIVOS. PRAZO. FÉRIAS FORENSES. APLICAÇÃO DO ART. 798 DO CPP, SEM INTERFERÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 68 DA LOMAN.

1. A despeito de ter havido inicialmente alguma vacilação na jurisprudência, e bastante controvérsia, ainda hoje, na doutrina, o entendimento predominante nesta Corte aponta no sentido de que a regra insculpida no art. 798 do CPP subsiste, isto é, os prazos para a interposição de recursos criminais são fatais: contínuos e peremptórios, não sendo interrompidos ou suspensos por férias, domingos ou feriados, ressalvadas as excepcionalidades previstas no próprio dispositivo legal em comento, ou, ainda, obviamente, no caso de o respectivo Tribunal, no período de recesso, não ter disponível o serviço de protocolo geral.

2. Nesse contexto, mostra-se escorreita a decisão recorrida ao declarar a intempestividade dos embargos infringentes, opostos após o transcurso do decêndio legal, considerando o disposto no art. 798 do CPP.

3. Recurso especial não conhecido."

(REsp 511100/PR. Quinta Turma. Rel. Min. Laurita Vaz. DJ de 10/05/2004).

"CRIMINAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECONSIDERAÇÃO. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. FLUÊNCIA DO PRAZO DURANTE AS FÉRIAS FORENSES. AGRAVO DESPROVIDO.

Evidenciado que o mérito do recurso de agravo de instrumento versava sobre a tempestividade do recurso especial, ao qual foi negado seguimento, deve-se reconsiderar a decisão, para conhecer do agravo quanto a esse aspecto.

As férias forenses não suspendem a contagem do prazo recursal em matéria penal – que é contínuo e peremptório, não se interrompendo nas férias, domingos e feriados. Intempestivo o RESP, não há como prosperar o agravo de instrumento. Agravo regimental desprovido."

(AGA 421569/PR. Quinta Turma. Rel. Min. Gilson Dipp. DJ de 16/09/2002).

5. No caso vertente, o ingresso dos autos na secretaria administrativa da instituição deu-se em 11 de julho de 2002 (quinta-feira), conforme consta de fls. 148, iniciando-se o prazo a correr no dia 12 do mesmo mês e ano. O prazo para a interposição de recurso especial é de 15 (quinze) dias, a teor do disposto no artigo 26 da Lei n.º 8.038/1990. Dessarte, o último dia para a interposição do recurso seria o dia 26 de julho do mesmo ano. Considerando-se que o recurso foi interposto em data de 12 de agosto (fl. 150), tenho-no por intempestivo.

6. Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do recurso especial porque intempestivo.

É o meu voto.

 Decisão unânime, votando com o relator os ministros Hamilton Carvalhido e Paulo Gallotti.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.