Responsabilidade civil. Aviso de cobrança. Ausência de prejuízo, ante a falta de repercussão social. Dano moral. Descabimento.

RECURSO ESPECIAL N.º 521.740/PB

Rel: Min. Carlos Alberto Menezes Direito

EMENTA

1. O que está dito nestes autos é que houve cartas de cobrança, com pedido de escusas se já quitado o débito, que o nome do autor não foi incluído em qualquer cadastro negativo, que o recorrente não se deu ao trabalho de informar que já havia quitado o débito, que não houve qualquer repercussão social nem abalo de crédito. Esse cenário fático afasta o pedido de dano moral, estando o especial, ademais, sem qualquer base lógica.

2. O dissídio é imprestável quando apresentado de forma irregular e sem guardar similitude com a questão julgada.

3. Recurso especial não conhecido.

(STJ/DJU de 16/2/04, pág. 249)

Em hipótese de aviso de cobrança com pedido de escusa se já paga a dívida, decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Terceira Turma, relator o ministro Carlos Alberto Menezes Direito, pelo descabimento do dano moral ante a ausência de repercussão e de abalo de crédito.

Consta do voto do relator:

O Exmo. Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito:

O recorrente ajuizou ação de indenização por danos morais alegando que fez duas compras: uma no valor de R$ 157,70, para pagamento em dez parcelas de R$ 24,22, e outra de R$ 131,16, para pagamento em três parcelas de R$ 43,72; que quitou as dívidas antes mesmo das datas marcadas; que a ré, contudo, passou a remeter cobranças com ameaças de incluir seu nome em cadastro negativo.

A sentença julgou procedente o pedido e impôs indenização no valor de R$ 10.000,00 com apoio nos artigos 6.º , VI, e 14 do Código de Defesa do Consumidor.

O Tribunal de Justiça da Paraíba reformou a sentença. Para o acórdão recorrido como as correspondências “continham lembretes afirmando que desconsiderasse a correspondência caso o débito já estivesse devidamente quitado” (fl. 85) e estavam endereçadas ao autor, não constituem “constrangimento algum perante a população, a sociedade, ou a quem quer que seja, pois as correspondências são pessoais” (fl. 85). Destacou, ainda, que a ré não incluiu o nome do autor em qualquer cadastro negativo, sendo que ao final das cartas estava o pedido de escusas, “não lhe causando nenhum prejuízo ou restrição ao seu crédito ou conceito no seio social” (fl. 85). Por fim, asseverou que o “apelado nunca informou ao apelante que o seu débito já estava liquidado. Se o apelado tivesse atendido ou respondido as cartas-cobrança, nada teria acontecido” (fl. 86).

Os embargos de declaração foram rejeitados.

Não há violação alguma do art. 535 do Código de Processo Civil. O acórdão recorrido está muito claro, objetivo, analisando a matéria com a devida cautela e com apropriada fundamentação.

Quanto ao mais, o especial chega mesmo a ser temerário, sem qualquer base concreta para reformar o acórdão recorrido. O que está dito nestes autos é que houve cartas de cobrança, com pedido de escusas se já quitado o débito; que o nome do autor não foi incluído em qualquer cadastro negativo; que o recorrente não se deu ao trabalho de informar que já havia quitado o débito; que não houve qualquer repercussão social nem abalo de crédito. Ora, diante desta realidade de fato, como impor indenização?

A alegação de violação do art. 159 do Código Civil é absolutamente infundada diante da realidade concreta dos autos, sendo despropositada a menção à Súmula n.º 227 da Corte. E o dissídio não tem qualquer pertinência, como impertinente é a transcrição da Súmula n.º 37 da Corte.

Eu não conheço do especial.

Processual civil. Documentos médicos. Negativa de exibição ao paciente. Necessidade de propositura de ação. Ônus da sucumbência.

RECURSO ESPECIAL N.º 540.048 – RS

Rel.: Min. Nancy Andrighi

EMENTA – De acordo com o Código de Ética Médica, os médicos e hospitais estão obrigados a exibir documentos médicos relativos ao próprio paciente que requeira a exibição.

– A negativa injustificada à exibição de documentos médicos pela via administrativa, que obrigou o paciente à propositura de ação à sua exibição pela via judicial, tem o condão de responsabilizar o hospital pelo pagamento dos ônus de sucumbência, em atenção ao princípio da causalidade, nos termos dos precedentes firmados no STJ.

Recurso especial conhecido e provido.

(STJ/DJU, 12/4/2004)

Ainda que o hospital quando chamado em juízo proceda desde logo a exibição dos documentos médicos reclamados pelo paciente, deve responder pelo ônus da sucumbência, pois, negando injustificadamente o acesso às informações na via administrativa, ensejou a propositura da ação de exibição de documentos.

Assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Terceira Turma, relatora a ministra Nancy Andrighi como o seguinte voto condutor:

A questão posta a desate pela recorrente consiste em aferir a responsabilidade do recorrido pelo pagamento dos ônus de sucumbência na ação de exibição de documentos proposta por ela.

De fato, assim que citado, o recorrido apresentou os documentos solicitados pela recorrente em juízo. Houve então julgamento pela procedência do pedido formulado por ela tão-somente para se declarar satisfeita a pretensão. No entanto, o recorrido não foi condenado ao pagamento de verbas de sucumbência por não ter resistido à pretensão.

Todavia, apesar de apresentados os documentos em juízo sem resistência, há de se verificar se o recorrido efetivamente deu causa à propositura da ação, hipótese em que há de ser condenado a suportar os ônus sucumbenciais, conforme reiterada jurisprudência do STJ.

Notificado extrajudicialmente para que exibisse os documentos (fl. 11), o recorrido se negou a fazê-lo sob o amparo do arts. 102, 103 e 108 do Código de Ética Médica (fl. 14).

Assim dispõem esses dispositivos normativos:

“Capítulo IX – Segredo Médico

É vedado ao médico:

Art. 102 – Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por justa causa, dever legal ou autorização expressa do paciente.

Parágrafo único: Permanece essa proibição: a) Mesmo que o fato seja de conhecimento público ou que o paciente tenha falecido. b) Quando do depoimento como testemunha. Nesta hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento.

Art. 103 – Revelar segredo profissional referente a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou responsáveis legais, desde que o menor tenha capacidade de avaliar seu problema e de conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo, salvo quando a não revelação possa acarretar danos ao paciente.

(…)

Art. 108 – Facilitar manuseio e conhecimento dos prontuários, papeletas e demais folhas de observações médicas sujeitas ao segredo profissional, por pessoas não obrigadas ao mesmo compromisso.”

Por sua vez, a recorrente alega que o próprio Código de Ética Médica, nos arts. 70, 71 e 112, autoriza a exibição dos documentos requeridos por ela.

Esses dispositivos assim asseveram:

“Capítulo V – Relação com Pacientes e Familiares

É vedado ao médico:

Art. 70 – Negar ao paciente acesso a seu prontuário médico, ficha clínica ou similar, bem como deixar de dar explicações necessárias à sua compreensão, salvo quando ocasionar riscos para o paciente ou para terceiros.

Art. 71 – Deixar de fornecer laudo médico ao paciente, quando do encaminhamento ou transferência para fins de continuidade do tratamento, ou na alta, se solicitado.

(…)

Capítulo X – Atestado e Boletim Médico

É vedado ao médico:

(…)

Art. 112 – Deixar de atestar atos executados no exercício profissional, quando solicitado pelo paciente ou seu responsável legal.”

Pela análise dos dispositivos do Código de Ética Médica citados pelo recorrido na resposta à notificação extrajudicial exarada pela recorrente (fl. 14), verifica-se que eles não amparam a negativa ao acesso aos documentos requeridos. Tratam exclusivamente do sigilo médico perante terceiros.

Por outro lado, nos termos do arts. 70, 71 e 112 do aludido Código, não poderia o recorrido ter (i) negado à recorrente o acesso ao seu prontuário médico; (ii) se furtado de dar explicações necessárias à sua compreensão; (iii) deixado de fornecer laudo médico à recorrente para o fim de continuidade do tratamento; e (iv) deixado de atestar os atos executados pelos médicos quando do tratamento ao qual foi submetido a recorrente.

Conclui-se, pois, que o recorrido, de forma injustificada, negou à recorrente o acesso às informações por ela requeridas via administrativa e efetivamente ensejou a propositura da ação de exibição de documentos.

Dessa forma, em atendimento ao princípio da causalidade, há de suportar o pagamento dos ônus de sucumbência.

Forte em tais razões, CONHEÇO do presente recurso especial pelas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional e DOU-LHE PROVIMENTO, para condenar o recorrido ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, esses que fixo em R$ 3.000,00 (três mil reais).

Ronaldo Botelho

é advogado e professor da Escola da Magistratura.