Processual Penal. Revisão criminal. Cabimento para redução da pena.

RECURSO ESPECIAL N.º 418.399/RS

Rel.: Min. Hamilton Carvalhido

EMENTA

1. A lei, ela mesma, estabelece as hipóteses taxativas para o ajuizamento da revisão criminal, o que não afasta, segundo o melhor constructo doutrinário, a interpretação extensiva in bonam partem.

2. In casu, o acórdão impugnado conheceu da revisão criminal e, fundamentadamente, reduziu a reprimenda anteriormente fixada ao condenado, verificada a existência de circunstância judicial que autorizasse a diminuição.

3. A questão da possibilidade de revisão da dosimetria da pena, em sede de ação revisional, é matéria que já se pacificou no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça.

4. Recurso não conhecido.

(STJ/DJU DE 02/02/04, Pág. 373)

Não obstante a segura orientação da jurisprudência, vez por outra surgem julgados discrepantes quanto a possibilidade do aforamento de revisão criminal com finalidade de reduzir pena. Por essa razão, é sempre conveniente chamar a atenção para o cabimento da revisão criminal nessa hipótese, como se vê por este julgado da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Hamilton Carvalhido com o seguinte voto:

O Exmo. Sr. Ministro Hamilton Carvalhido (Relator): Senhores Ministros, recurso especial contra acórdão proferido pelo Terceiro Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, por maioria de votos, acolheu o pedido revisional de Luiz Antônio Moraes de Lima, condenado pela prática de crime de roubo qualificado, às penas reclusiva de 9 anos e 4 meses e multa, para diminuir-lhe a reprimenda, fixando-a definitivamente em 7 anos e 4 meses de reclusão.

O Ministério Público recorrente sustenta que o Tribunal não demonstrou o real enquadramento de cada hipótese permissiva do pedido revisional.

Esta, a letra do artigo 621 do Código de Processo Penal:

“Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I – quando a sentença condenarória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II – quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III – quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.”

Com efeito, a própria lei estabelece hipóteses taxativas para o ajuizamento da revisão criminal, o que não afasta, segundo a melhor doutrina, a interpretação extensiva in bonam partem.

Este, o acórdão recorrido, no que pertine à espécie:

“(…)

2. Conheço da revisão criminal, eis que fundamentada em todos os incisos do art. 621 do CPP.

Analisando o petitório, tenho que procede, em parte, a ação revisional.
Quanto ao mérito condenatório, inocorre julgamento contrário à evidência dos autos ou em desrespeito a texto expresso da lei penal.

(…)

Reviso, no entanto, a pena imposta, eis que notoriamente exacerbada, contrariando os parâmetros costumeiros. A pena resultou superior ao dobro do mínimo cominado, sem que tenha ocorrido aquela singularidade comportamental, na prática do crime, que justifique tamanha exacerbação.

Acrescente-se que nenhuma palavra foi dita no acórdão sobre o apenamento. A Câmara não abordou esse tema no julgamento da apelação.

O ilustre magistrado fixou a pena-base em 6 anos de reclusão, dizendo que ‘os antecedentes são desconsiderados na busca da base, eis que reincide o réu’. Considerou, para exacerbar a pena, que a ação foi violenta, com muita audácia e prepotência, sendo empregada grande ameaça psicológica às vítimas dentro do lar, havendo prejuízo de monta.

Com esses comemorativos, levando em conta que a violência e a grave ameaça fazem parte do próprio tipo penal, sopesando, no entanto, que houve grande prejuízo e que pesa contra o réu a circunstância de ter sido o assalto praticado no recinto familiar das vítimas, diminuo para 5 anos de reclusão a pena-base.

Por outro lado, considero que é excessivo o acréscimo de 1 ano pela reincidência, o qual diminuo para 6 meses, como se tem, de ordinário, aplicado nos crimes de roubo.

Fica a pena provisoriamente estabelecida em 5 anos e 6 meses (66 meses) de reclusão.

Finalmente, agregando o aumento de um terço em decorrência das qualificadoras do emprego de arma e do concurso de agentes (22 meses), torno-a definitiva em sete (7) anos e quatro (4) meses de reclusão (88 meses).

Nada há modificar no que pertine ao regime carcerário ou à pena imposta.

Em resumo, acolho o pedido revisional para diminuir a sanção carcerária do requerente para sete (7) anos e quatro (4) meses de reclusão, indeferindo-a pelos demais fundamentos invocados.” (fls. 21/24).

Ao que se tem, o acórdão impugnado conheceu da revisão criminal e, fundamentadamente, reduziu a reprimenda anteriormente fixada, verificada a existência de circunstância judicial que autorizasse a diminuição.

Observa-se que, não obstante o fato de não haver menção expressa acerca de qual dos incisos autorizadores da revisão criminal estaria se embasando o decisum, para a redução da pena fixada, a letra do acórdão só permite o enquadramento da questão nas hipóteses do inciso I e III do artigo em análise.

A questão da revisão da dosimetria da pena, em sede de ação revisional, é matéria já pacificada na jurisprudência desta Corte Superior de Justiça.

A propósito, confiram-se os seguintes precedentes jurisprudenciais:

“HABEAS CORPUS. REVISÃO CRIMINAL. ALTERAÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE. ART. 621, III, DO CPP.

A possibilidade de correção da quantidade de pena em sede revisional decorre do próprio texto legal (art. 621, III, do CPP). Portanto, não cabia ao Tribunal a quo deixar de conhecer do pedido revisional atinente à correção da pena imposta, à consideração de não ser viável tal pleito na sede da Revisão Criminal.

Ordem concedida para determinar que o Sexto Grupo de Câmaras do Eg. Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo aprecie a tese de diminuição de pena, ventilada nos autos da Revisão Criminal n.º 339.680/1.” (HC 12.316/SP, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, in DJ 2/10/2000).

“RECURSO ESPECIAL – RÉU CONDENADO POR ESTUPRO E ROUBO E JÁ PROCESSADO, POR DIVERSAS VEZES, PELOS MESMOS DELITOS – CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU – JUNTADA, COM AS RAZÕES DE APELAÇÃO, DE LAUDO PSIQUIÁTRICO, RETIRADO DE OUTRA AÇÃO PENAL, DANDO-O COMO RELATIVAMENTE INCAPAZ – RESP QUE PRETENDE SEJA OBRIGATÓRIA A REDUÇÃO DA PENA (ART. 26, P. ÚNICO DO CP) – QUESTÃO NÃO APRECIADA NO TRIBUNAL LOCAL, PARA NÃO SUPRIMIR-SE UMA INSTÂNCIA – DISSÍDIO PRETORIANO NÃO DEMONSTRADO – POSSIBILIDADE DE SER A MATÉRIA DEVIDAMENTE APRECIADA NUM PEDIDO REVISIONAL (ART. 621, III, CPP).

1. Sentenciada a causa, torna-se impertinente a juntada de laudo psiquiátrico, retirado de outra ação penal, dando como relativamente incapaz o condenado.

2. Matéria que não poderia ser apreciada em segundo grau, pena de suprimir-se uma instância.

3. A demonstração do dissídio, implica na similitude de situações, inocorrente na espécie.

4. A questão da obrigatoriedade, ou não, da redução da reprimenda, em tais hipóteses, pode ser versada em pedido revisional (art. 621, III, CPP).

5. Recurso não conhecido.” (REsp 75.113/RS, Relator Ministro Anselmo Santiago, in DJ 30/6/97 – nossos os grifos).

Pelo exposto, não conheço do recurso.

É o voto.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.