HABEAS CORPUS N.º 21.869/GO
Rel.: Ministro Hamilton Carvalhido
EMENTA
1. A constituição do termo inicial do prazo para ofertamento das razões do recurso em sentido estrito, em qualquer caso, se realiza com a intimação do defensor do réu, constituído ou dativo.
2. As razões do recurso em sentido estrito são essenciais à validade do processo, pena de violação manifesta do direito à ampla defesa assegurado na letra do artigo 5.º, inciso LV, da Constituição da República.
3. Habeas corpus concedido para declarar nulo o processo, a partir, exclusive, do recebimento do recurso em sentido estrito interposto, eis que se preservou, em grau de recurso, a pronúncia impugnada, sem as razões do réu recorrente, as quais, por constituírem termo essencial, devem ser oferecidas por defensor dativo, se em branco restar a prévia oportunização do réu de constituição de novo advogado.
(STF/DJU de 15/3/04, pág. 303)
Até porque sendo o recurso em sentido estrito um recurso de retratação, as razões são imprescindíveis. Assim proclama o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Sexta Turma, Relator o Ministro Hamilton Carvalhido, com o seguinte voto condutor:
Consta do voto do Relator:
Exmo. Sr. Ministro Hamilton Carvalhido (Relator):
Senhores Ministros, habeas corpus impetrado em favor de José Timóteo Neto, pronunciado por homicídio qualificado, contra a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que negou provimento ao seu recurso, em decisão assim ementada:
“Recurso em Sentido Estrito. Disparo acidental. Motivo torpe.
O caráter acidental do fato delitivo, se não comprovado veementemente na fase instrutória, não autoriza absolvição sumária.
A qualificadora só deve ser afastada, na pronúncia, quando manifesta a improcedência.
Recurso conhecido e improvido.” (fl. 84).
Pronunciado, interpôs o paciente, por seu patrono constituído, tempestivamente, recurso em sentido estrito, que foi arrazoado apenas pela Acusação Pública, culminando a Corte de Justiça Estadual, a requerimento da Promotoria de Justiça, por ordenar a restituição do feito ao Juízo de origem, para a intimação pessoal do advogado, por carta precatória, ao ofertamento das razões do recurso do réu.
Restituindo a carta, documentou o Juízo deprecado o seu cumprimento, com a seguinte certidão do Oficial de Justiça:
“Certifico e dou fé que em cumprimento ao presente mandado em anexo diligenciado nesta capital, dirigi-me ao endereço retro e aí sendo procedi a Intimação do Sr. Wanderley de Medeiros, o qual após estar bem ciente de todo teor do mandado, recebeu a contrafé que lhe ofereci, exarando sua nota de ciência. Sendo assim, para constar, lavrei a presente Certidão. GO/14.12.94.” (fl. 141).
Precisamente a falta da intimação, para as razões do recurso em sentido estrito, constitui o primeiro fundamento do writ, aduzindo o impetrante, que é o patrono do paciente na ação penal, em demonstração do que alega, a inexistência de qualquer nota de ciência no mandado.
A falta da nota de ciente do intimando relativiza, na espécie, a fé pública do Oficial de Justiça, determinando que se conclua, necessariamente, ao menos, a incerteza da essencial comunicação processual em causa, o que, a nosso ver, faz obrigatório o reconhecimento e conseqüente declaração do feito, a partir, exclusive, do recebimento do recurso em sentido estrito interposto.
É nesse sentido, o parecer do Ministério Público Federal, verbis:
“(…)
Embora o Oficial de Justiça goze de fé pública, devendo suas certidões ser recebidas como expressão da verdade, podem elas ser infirmadas mediante prova inequívoca de sua mendacidade, cabendo a quem o alega demonstrar a inverdade do quanto certificado.
No caso, a certidão de fls. 62 atesta que o Meirinho compareceu ao escritório do Dr. Wanderley de Medeiros e, em aí estado, o intimou do inteiro teor do Mandado, tendo ele recebido a contrafé e exarado sua nota de ciência.
No referido Mandado, todavia, ao menos na cópia não autenticada juntada aos autos, não consta a aludida nota de ciência firmada pelo advogado.
Desse modo, há dúvida quanto ao efetivo cumprimento da diligência, razão por que – e em atenção ao princípio do contraditório e da amplitude da defesa – deve ser anulado o julgamento do recurso em sentido estrito, para que outro seja proferido após a efetiva intimação do Defensor do acusado para oferecimento das razões de sua irresignação.” (fls. 134/135).
Averbe-se, em remate, o magistério de Julio Fabbrini Mirabete:
“(…)
É de dois dias o prazo para o oferecimento das razões do recorrente no recurso em sentido estrito. Segundo o dispositivo, é contado do dia da interposição, se subir nos próprios autos, ou da abertura de vista dos autos, no caso de instrumento. Entretanto, a jurisprudência tem se pronunciado, com fundamento no art. 798, § 5.º, no sentido de que o prazo para razões sempre deve ser contado a partir da intimação da parte. Já se tem decidido que, subindo nos próprios autos, despachada pelo juiz a petição do recurso e juntada ela ao processo, deve ser aberta vista ao recorrente, para, em dois dias, apresentar razões, sendo a intimação indispensável.” (in Código de Processo Penal Interpretado, 8.ª edição, Ed. Atlas, 2001, pág. 1.228/1229).
De qualquer modo, quando se visse recusar o vício processual da falta de intimação do patrono do réu, persistiria a nulidade, por violação do direito à ampla defesa, assegurado na letra do artigo 5.º, inciso LV, da Constituição da República, eis que se preservou, em grau de recurso, a pronúncia impugnada, sem as razões do réu recorrente, as quais, por constituírem termo essencial, devem ser oferecidas por defensor dativo, se em branco restar a prévia oportunização do réu de constituição de novo advogado.
Pelo exposto, concedo a ordem para declarar nulo o processo, a partir, exclusive, do recebimento do recurso em sentido estrito interposto.
É o voto.
Consumidor. Serviços de “900”. “Disque Prazer” – Cobrança. Necessidade de prévia solicitação. CDC, art. 39, III.
RECURSO ESPECIAL N.º 318.372/SP
Rel.: Min. Humberto Gomes de Barros
EMENTA –
A cobrança de serviço de “900” – “Disque prazer” sem a prévia solicitação do consumidor constitui prática abusiva (CDC, art. 39, III). Se prestado, sem o pedido anterior, tal serviço equipara-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento (CDC, art. 39, parágrafo único).
– Recurso provido.
(STJ/DJU de 17/5/04, pág. 213)
Seguindo precedente (RESP 258.156), decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Terceira Turma, relator o ministro Humberto Gomes de Barros, que o serviço de telefonia “900” “Disque prazer” é oneroso e somente pode ser fornecido mediante prévia solicitação do titular da linha telefônica.
Consta do voto do relator:
Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): O caso é similar àquele julgado no REsp 258.156/ROSADO. Trata-se, inclusive, da mesma recorrida. Vejam a ementa do precedente:
“TELEFONE. SERVIÇO “900”. “Disque prazer”. Código de Defesa do Consumidor.
O serviço “900” é oneroso e somente pode ser fornecido mediante prévia solicitação do titular da linha telefônica.
Recurso conhecido e provido.”
Noutro caso, a Quarta Turma novamente proclamou:
“(…)
I. O “produto” ou “serviço” não inerente ao contrato de prestação de telefonia ou que não seja de utilidade pública, quando posto à disposição do usuário pela concessionária – caso do “tele-sexo” – carece de prévia autorização, inscrição ou credenciamento do titular da linha, em respeito à restrição prevista no art. 31, III, do CDC.
II. Sustentado pela autora não ter dado a aludida anuência, cabe à companhia telefônica o ônus de provar o fato positivo em contrário, nos termos do art. 6.º, VIII, da mesma Lei n. 8.078/90, o que inocorreu.
III. Destarte, se afigura indevida a cobrança de ligações nacionais ou internacionais a tal título, e, de igual modo, ilícita a inscrição da titular da linha como devedora em cadastro negativo de crédito, gerando, em contrapartida, o dever de indenizá-la pelos danos morais causados, que hão de ser fixados com moderação, sob pena de causar enriquecimento sem causa.
IV. Recurso especial conhecido e provido em parte.” (REsp 265.121/PASSARINHO).
O fornecimento de serviço de “900 – disque prazer” sem a prévia solicitação do consumidor configura prática abusiva (CDC, art. 39, III). Se prestados, sem o pedido anterior, “equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento” (CDC, art. 39, parágrafo único).
Dou provimento ao recurso.
Decisão unânime, votando com o relator os ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho.
Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.