Processual Penal. Pronúncia. Nulidade por excesso de “eloqüência acusatória”.

“HABEAS CORPUS N.º 82.294-1 – MATO GROSSO

REL.: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE

EMENTA – 1. É nula, conforme a jurisprudência consolidada do STF, a pronúncia cuja fundamentação extrapola a demonstração da concorrência dos seus pressupostos legais (CPrPen, art. 408) e assume, com afirmações apodíticas e minedência no cotejo analítico da prova, a versão acusatória ou rejeita peremptoriamente a da defesa (v.g., HC 68.606, 18/6/91), Celso, RTJ 136/1.215; HC 69.133, 24/3/92, Celso, RTJ 140/917; HC 73.126, 27/2/96, Sanches, de 17/5/96; RHC 77.044, 26/5/98, Pertence, DJ 7/8/98).

2. O que reclama prova, no juízo da pronúncia, é a existência do crime; não, a autoria, para a qual basta a concorrência de indícios, que, portanto, o juiz deve cingir-se a indicar.

A contenção da pronúncia, no ponto, tanto mais é de exigir-se quando, como se dá na espécie, a defesa se haja entrincheirado na negativa da autoria do fato.”

(STJ/DJU de 8/11/02, pág. 41)

Com base em diversos precedentes, decidiu mais uma vez o Supremo Tribunal Federal, através de sua Primeira Turma, relator o ministro Sepúlveda Pertence, que os juízes e os tribunais devem ser comedidos e moderados na linguagem da pronúncia, a fim de não exercerem ilegítima influência sobre o ânimo e a vontade dos integrantes do Conselho de Sentença.

Consta do voto do relator:

O senhor ministro Sepúlveda Pertence (relator): Consolidou-se a jurisprudência do Tribunal que é nula a pronúncia, cuja fundamentação extrapola a demonstração da concorrência dos seus pressupostos legais (CPrPen, art. 408) e assume, com afirmações apodíticas e minudência no cotejo analístico da prova, a versão acusatória ou rejeita peremptoriamente a da defesa (v.g., HC 68.606, 18/6/91, Celso, RTJ 136/1.215; HC 69.133, 24/3/92, Celso, RTJ 140/917; HC 73.126, 27/2/96, Sanches, DJ 17/5/96, RHC 77.044, 26/5/98, Pertence, DJ 7/8/98).

O que reclama prova, no juízo da pronúncia, é a existência do crime; não, a autoria, para a qual basta a concorrência de indícios, que, portanto, o juiz deve cingir-se a indicar.

A contenção da pronúncia, no ponto, tanto mais é de exigir-se quando, como se dá na espécie, a defesa se haja entricheirado na negativa da autoria do fato.

Na espécie, ao cabo da transcrição e análise de testemunhas, com explícita qualificação positiva da credibilidade dos depoimentos acordes com a denúncia, o juiz sentencia que, além de comprovada a materialidade, “a sua autoria não é duvidosa”, até porque, assere, não haver “nenhuma prova dos autos que demonstrem a versão apresentada pelo réu”, tudo, após desqualificar as testemunhas de defesa (f. 348 ss).

Acolho o parecer da Procuradoria Geral e defiro a ordem, para declarar nula a pronúncia e determinar o seu desentranhamento, para que outra seja proferida conforme os parâmetros legais: é o voto.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Sydney Sanches, Ilmar Galvão e a ministra Ellen Gracie.

Ronaldo Botelho

é advogado e professor da Escola da Magistratura.