“HABEAS CORPUS N.º 19.015-RJ

REL.: MIN. PAULO GALLOTTI

EMENTA: 1. Esta corte tem entendido, na interpretação do artigo 484, inciso III, do Código de Processo Penal, ser admissível a quesitação dos jurados a respeito da excludente de culpabilidade de inexigibilidade de conduta diversa, se requerida pela defesa.

2. Habeas corpus concedido, parcialmente, para determinar que no novo julgamento do Júri Popular seja formulado, se assim requerido pela defesa, quesito relativo à tese de inexigibilidade de conduta diversa.”

(STJ/DJU de 7/10/02, pág. 302).

Na linha de precedentes, decidiu a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, relator o ministro Paulo Gallotti, que é possível a quesitação ao júri de tese da inexigibilidade de conduta diversa, como causa excludente da culpabilidade.

O senhor ministro Paulo Gallotti (relator): a meu ver, a ordem realmente deve ser deferida.

Na verdade, esta Corte tem entendido, na interpretação do artigo 484, inciso III, do Código de Processo Penal, ser necessária a quesitação dos jurados a respeito da tese da inexigibilidade de conduta diversa, suscitada pela defesa, por se caracterizar como excludente de culpabilidade, de obrigatória indagação.

Veja-se:

A – “Penal e processual penal. Habeas corpus. Homicídio. Júri. Tese principal da defesa não quesitada. Inexigibilidade de conduta diversa. Nulidade absoluta.

I – Se a tese principal da defesa não foi quesitada, a par do evidente prejuízo, a nulidade da daí decorrente é absoluta.

II – A recusa na quesitação de uma tese não dispensa fundamentação por parte do juiz presidente do Tribunal do Júri.

III – A exigibilidade de conduta diversa, apesar de apresentar muita polêmica, é, no entendimento predominante, elemento da culpabilidade. Por via de conseqüência, sem adentrar na questão dos seus limites, a tese da inexigibilidade de conduta diversa pode ser apresentada como causa de exclusão da culpabilidade. Especificada e admitida a forma de inexigibilidade, aos jurados devem ser indagados os fatos ou as circunstâncias fáticas pertinentes à tese (Precedentes).

Writ concedido, anulando-se o julgamento realizado perante o Tribunal do Júri.”

(HC n.º 16.865/PE, relator o ministro Felix Fischer, DJU de 4/2/2002).

B – “Processual penal. Recurso especial. Homicídio. Inexigibilidade de conduta diversa. Júri. Quesitos. Nulidade.

– No julgamento do Tribunal do Júri, onde sobreleva a rigorosa observância da garantia de plenitude de defesa (CF, art. 5.º, XXXVIII, a) impõe-se absoluta cautela na formulação dos quesitos, de modo a evitar dúvida, confusão ou perplexidade na formação do juízo de certeza pelos integrantes do Conselho de Jurados.

– Na hipótese, em que a defesa sustenta em plenário a tese de legítima defesa, é de rigor que o juiz presidente continue a votação dos quesitos referentes à figura da inexigibilidade de outra conduta, indagando aos jurados sobre as circunstâncias pertinentes à referida excludente. A não votação dos demais quesitos é causa de nulidade absoluta, porque afronta diretamente a garantia de defesa ampla e plena.

– Recurso especial não-conhecido.”

(Resp n.º 241.676/GO, relator o ministro Vicente Leal, DJU de 1/4/2002).

De rigor, o julgamento atacado deveria ter apenas proclamado a nulidade de quesitação, determinando sua renovação.

Não o fez, contudo, acabando por reconhecer ter sido a decisão absolutória contrária à prova dos autos.

Penso que mesmo assim não se causou qualquer prejuízo ao paciente, pois, na hipótese de ser apenas anulado o julgamento em razão da formulação de quesito indevido, esta Corte, como está a fazer, afastaria a pretendida nulidade, determinando o retorno dos autos para exame do recurso do Ministério Público quanto à letra “d”, do inciso II, do artigo 593, do Código de Processo Penal, oportunidade em que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro mandaria repetir o julgamento, não se mostrando razoável, destarte, a pretensão absolutória.

Assim, a ordem é concedida, parcialmente, para que, no novo julgamento, se o requerer a defesa, se admita a formulação de quesito relativo à inexigibilidade de conduta diversa.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Fontes de Alencar, Vicente Leal, Fernando Gonçalves e Hamilton Carvalhido.

Processo Civil. Prazo. Contagem. Termo a quo. Art. 184, CPC. Certidão do cartório judicial atestando início equivocado da contagem do prazo. Irrelevância. Justa causa não configurada.

“RECURSO ESPECIAL N.º 399.562-PR

REL.: MIN. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA

EMENTA ? I ? Em se tratando de prazo legal, não se configura justa causa, a impedir a prática do ato no momento oportuno, o fato de a serventia judicial ter certificado erroneamente o termo inicial do prazo.

II ? Na espécie, a informação equivocada da serventia judicial não poderia ter o condão de modificar texto de lei, que se deve presumir ser do conhecimento geral, notadamente dos operadores do direito.”

(STJ/DJU de 9/9/02).

Nesta decisão posta em destaque, o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quarta Turma, relator o ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, considerou que é dever do advogado fiscalizar e cumprir rigorosamente os prazos processuais, não podendo alegar justa causa para o descumprimento de determinado prazo a certidão errônea da serventia judicial.

O caso é o seguinte: o prazo da apelação iniciava no dia 16 de maio, uma segunda-feira, mas a serventia certificou, equivocadamente, que o início do prazo teria lugar no dia 17, uma terça-feira. Em razão disso o recurso foi protocolado no dia 31 de maio, quando o prazo venceu no dia 30.

Consta do voto do relator:

O senhor ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (relator):

Relativamente à intempestividade da apelação, assentou o acórdão impugnado:

“Tenho como não caracterizada a intempestividade do apelo, em razão do réu/apelante haver sido induzido em erro pelo escrivão, ao certificar que o prazo de recurso era a partir do dia 17, terça-feira, quando na verdade, o dies a quo era 16 de maio, segunda-feira, e o dies ad quem, 30 de maio, levando o equívoco o recorrente ao protocolar o recurso no dia 31 de maio”.

Argumenta o recorrente, de seu turno, ser dever do advogado o patrulhamento dos prazos processuais, aduzindo que “ninguém pode se escusar do cumprimento da norma processual, sob o pretexto de ter sido induzido em erro”.

O ponto central da controvérsia, portanto, cinge-se em decidir se a certidão emitida pelo cartório judicial, atestando data errônea como termo inicial da contagem do prazo recursal, configura motivo suficiente e justa causa à apresentação tardia do recurso.

2. Nos termos do artigo 183, § 1.º, CPC, reputa-se justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte e que a impede de praticar o ato por si ou por mandatário.

A propósito, leciona Moniz Aragão que, “para que se repute justa a causa do impedimento na prática do ato, há de ser ela alheia à vontade do agente e resultante de evento imprevisto. Na ausência de algum desses requisitos, a causa não será reputada justa e não autorizará a devolução do prazo” (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. II, n.º 117, p. 94, 8.ª edição).

No caso dos autos, contudo, não se vislumbra qualquer imprevisão a impedir a prática do ato no momento oportuno. O termo inicial da contagem dos prazos processuais decorre de disposição expressa de lei, verbis:

“Art. 184. Salvo disposição em contrário, computar-se-ão os prazos, excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento”.

E o prazo recursal trata-se de prazo legal, e não de prazo judicial. Irrelevante, assim, que tenha a secretaria do juízo certificado em desconformidade com a disposição legal, até porque não possui uma certidão força modificativa da lei, que, aliás, é de ser presumida ser de conhecimento de todos, principalmente dos operadores do direito. Ademais, é de registrar-se que sequer se impõe ao cartório judicial que certifique o termo inicial da contagem dos prazos, mas apenas a data da efetiva intimação das partes.

“II ? Não se configura justa causa, a impedir a prática do ato no momento oportuno, o fato da serventia judicial ter certificado que o início das férias de julho seria no dia primeiro.

III ? Informação equivocada de serventia judicial não tem o condão de modificar textos de lei, que é de ser presumida ser do conhecimento geral” (REsp n.º 151.601 ? DF, DJ 22/6/1998, de minha relatoria).

Em suma, a apelação do recorrido foi apresentada fora do prazo legal, sem motivo justo, restando prejudicada, assim, a análise das demais impugnações recursais deste recurso especial.

3. Aduza-se, por fim, que o recorrente demonstrou eficazmente a divergência jurisprudencial, fazendo o confronto analítico nos termos legais. Além disso, os casos trazidos a confronto efetivamente decidiram diversamente do acórdão impugnado, ao entenderem que “o equívoco do escrivão, ao certificar a data do início de prazo não aproveita a respectiva parte, porque o que importa, para a contagem do lapso recursal, é o dia em que se verificou a intimação do ato impugnado”.

4. À vista do exposto, conheço do recurso pela divergência jurisprudencial e dou-lhe provimento para, declarando a intempestividade da apelação do réu-recorrido, restabelecer a sentença.

Decisão por unanimidade, votando com o relator os ministros Barros Monteiro e Ruy Rosado de Aguiar.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.

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