Processual penal. Habeas corpus. Furto. 1. Interrogatório. Defensor dativo. Entrevista prévia. Inocorrência. Comprovação. Impossibilidade. Nulidade. Não reconhecimento. 2. Ordem denegada.

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HABEAS CORPUS N.º 82.350-MS
Rel.: Min.ª Maria Thereza de Assis Moura
EMENTA

1. Embora a falta de entrevista entre acusado e defensor antes do interrogatório caracterize nulidade absoluta, não é possível o seu reconhecimento sem que tenha sido demonstrada a ocorrência da alegada irregularidade. Auto de interrogatório assinado pelo defensor sem qualquer ressalva e nulidade alegada apenas em sede de apelação, a afastar o constrangimento ilegal.
2. Ordem denegada.
(STJ/DJe de 8/6/2009)

Por decisão unânime do Superior Tribunal de Justiça, Relator a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, ficou estabelecido que embora a falta de entrevista entre acusado e defensor antes do interrogatório caracterize nulidade absoluta, não é possível o seu reconhecimento sem que tenha sido demonstrada a ocorrência da alegada irregularidade. Auto de interrogatório assinado pelo defensor sem qualquer ressalva e nulidade alegada apenas em sede de apelação, a afastar o constrangimento ilegal.

Consta do voto da Relatora:

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Ministra Maria Thereza De Assis Moura (Relatora):

O interrogatório foi realizado no dia 23 de março de 2005, portanto, quando em vigência a disciplina do interrogatório trazida pela lei 10.792/2003, que passou a assegurar expressamente no diploma processual o direito de entrevista reservada do acusado com o seu defensor previamente ao interrogatório.

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Sem dúvida, trata-se a entrevista prévia e reservada entre acusado e defensor quando do interrogatório de medida voltada a garantir a ampla defesa. Sendo, assim, se esta não for assegurada, conduz à nulidade absoluta do feito. Neste sentido, veja-se o seguinte julgado deste Corte:
“Interrogatório. Lei n.º 10.792/03 (aplicação). Defensor (ausência).

Nulidade (caso).

1. Com a alteração do Cód. de Pr. Penal pela Lei n.º 10.792/03, assegurou-se, de um lado, a presença do defensor durante a qualificação e interrogatório do réu; de outro, o direito do acusado de entrevista reservada com seu defensor antes daquele ato processual.

2. Por consistirem tais direitos em direitos sensíveis direitos decorrentes de norma sensível, a inobservância pelo juiz dessas novas regras implica a nulidade do ato praticado.

3. Caso em que o réu foi interrogado sem a assistência de advogado, tendo dispensado a entrevista prévia com o defensor nomeado pelo juiz.
4. Recurso provido a fim de se anular o processo penal desde o interrogatório do acusado.” (STJ, Sexta Turma, RHC 17679/DF, Relator Ministro NILSON NAVES, j. 14/3/2006, DJ de 20/11/2006, p. 362)

Ocorre que, no caso ora sob análise, não há qualquer registro de que não tenha sido assegurada a entrevista prévia do paciente com o advogado dativo nomeado para o ato. Da leitura do termo de interrogatório, embora não venha registrada a realização da entrevista, não se pode, igualmente, extrair o contrário, já que o defensor nomeado para o ato assinou o termo de interrogatório, e não foi feita nenhuma ressalva (fl. 17). Nesse sentido, bem assinalou a autoridade apontada como coatora:

“”(…)

No que se refere à preliminar de nulidade do interrogatório por ausência de entrevista reservada entre o apelante e seu defensor, melhor sorte não lhe assiste.

Da análise do termo de interrogatório de fl. 51, verifica-se que o apelante afirmou não possuir condições de constituir advogado, tendo sido nomeado um advogado para lhe acompanhar no referido ato processual, o Dr. Luiz Egberg Penteado Anderson, o qual assina o referido termo.

Assim, não há falar em ausência em nulidade, tampouco prejuízo à defesa, devendo esta preliminar ser igualmente afastada.” (fl. 52)
Da leitura da sentença, igualmente, sobressai que não houve qualquer pronunciamento sobre referida nulidade pelo magistrado de primeiro grau, não constando que a defesa a tenha suscitado em sede de alegações finais.

Assim, inviável se mostra, a meu ver, o reconhecimento de alegada nulidade, diante da falta de elementos que demonstrem a ocorrência de qualquer irregularidade no procedimento. Sobre a conveniência da plena instrução da petição inicial, Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes prelecionam:

“Apesar do silêncio da lei, é também conveniente que a petição de habeas corpus seja instruída por documentos aptos a demonstrar a ilegalidade da situação de constrangimento ou ameaça trazidos a conhecimento do órgão judiciário: embora a omissão possa vir a ser suprida pelas informações do impetrado ou por outra diligência, determinada de ofício pelo juiz ou tribunal, é do interesse do impetrante e do paciente que desde logo fique positivada a ilegalidade.” (Recursos no Processo Penal, 4.ª ed rev. amp. E atual., Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 366)

Da mesma forma, não vejo como aquilatar qual teria sido o prejuízo advindo ao paciente, já que a confissão do paciente não foi o único elemento valorado em seu prejuízo na sentença, já que parte dos objetos furtados teriam sido encontrados em seu poder.

Ante o exposto, denego a ordem.

É como voto.

Votaram com a Ministra Relatora os Ministros Og Fernandes, Celso Limongi (Des. Conv. do TJ/SP), Nilson Naves e Paulo Gallotti.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.