Processual Penal. Habeas Corpus. Execução Penal. Progressão de Regime. Exigência de parecer da Comissão Técnica de Classificação. Constrangimento ilegal.

EMENTA

1. A progressão de regime de cumprimento de pena passou a ser direito do condenado, bastando que se satisfaçam dois requisitos: o primeiro, de caráter objetivo, que depende do cumprimento de pelo menos 1/6 (um sexto) da pena; o segundo, de caráter subjetivo, relativo ao bom comportamento carcerário, que deve ser atestado pelo diretor do estabelecimento prisional.

2. Embora temerário substituir a exigência de parecer da Comissão Técnica de Classificação e a submissão do presidiário a exame criminológico – como condição a eventual direito de progressão do regime – por um simples atestado de boa conduta firmado por diretor de estabelecimento prisional, deve ser observado pelo Juízo das Execuções Penais o disposto no art. 112 da LEP, em sua nova redação, promovida pela Lei 10.792/2003.

3. Ordem concedida, para assegurar ao paciente a apreciação pelo Juízo das Execuções do seu pedido de progressão de regime, nos termos do art. 112 da Lei de Execução Penal.

(STJ/DJU de 01/08/06, pág. 467)

Desde o advento da Lei n.º 10.792/2003, a exigência de parecer da Comissão Técnica de Classificação, para a concessão da progressão de regime, constitui constrangimento ilegal.

Decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, com o seguinte voto:

Ministro Arnaldo Esteves Lima (Relator):

O art. 112 da Lei de Execuções Penais, antes da alteração realizada pela Lei n.º 10.792/2003, dispunha, expressamente, que ?A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva, com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo Juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos 1/6 (um sexto) da pena no regime anterior e seu mérito indicar a progressão?, sendo que seu parágrafo único estabelecia que ?A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário? (Lei n.º 7.210/84, art. 112, parágrafo único).

Dessa forma, considerando que o direito à progressão de regime dependia do comportamento do condenado, do parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, o habeas corpus era considerado instrumento impróprio à obtenção da referida benesse legal, tendo em vista ser incabível a dilação probatória, que se fazia necessária ao exame dos requisitos exigidos para a concessão do mencionado benefício.

Por essa razão, este Tribunal vinha decidindo no sentido de que, ?Comportando exame criminológico e parecer de comissão técnica, além de outros dados de caráter subjetivo, torna-se impossível o uso do writ para decidir-se sobre progressão de regime prisional? (HC 1.908/SP, Rel. Min. JOSÉ CÂNDIDO DE CARVALHO FILHO, DJ 29/11/1993, p. 25.901).

Entretanto, a aludida Lei n.º 10.792/2003 deu ao art. 112 da LEP a seguinte redação, verbis:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.

§ 1.º A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor.

§ 2.º Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes (com a redação dada pela Lei n.º 10.792/2003).

Assim sendo, penso que a progressão de regime de cumprimento de pena passou a ser direito do condenado, bastando que se satisfaçam dois requisitos: o primeiro, de caráter objetivo, que depende do cumprimento de pelo menos 1/6 (um sexto) da pena; o segundo, de caráter subjetivo, relativo ao seu bom comportamento carcerário, que deve ser atestado pelo diretor do estabelecimento prisional.

Embora me pareça de todo inconveniente, além de temerário, substituir a exigência de parecer da Comissão Técnica de Classificação e a submissão do presidiário a exame criminológico – como condição a eventual direito de progressão do regime – por um simples atestado de boa conduta firmado por diretor de estabelecimento prisional, penso que essa foi a intenção do legislador ao promover a aludida alteração na norma de regência e deve ser observada pelo Juízo das Execuções Penais, sob pena de violação ao disposto no art. 112 da LEP, em sua nova redação.

O paciente foi condenado à pena de 8 anos, 4 meses e 24 dias de reclusão em regime inicial fechado, sendo que em 7/6/2000 foi dado início ao cumprimento da reprimenda (fl. 18).

O pedido de progressão de regime do semi-aberto para o aberto (fl. 15), datado de 19/1/2004, encontra-se pendente de apreciação em virtude da demora do exame criminológico e do parecer da Comissão Técnica de Classificação.

Em face do exposto, concedo a ordem impetrada, para assegurar ao paciente a apreciação pelo Juízo das Execuções do seu pedido de progressão de regime, nos termos do art. 112 da Lei de Execução Penal.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Felix Fischer, Gilson Dipp e Laurita Vaz.

Habeas Corpus (cabimento). Matéria de prova (distinção)

HABEAS CORPUS N.º 46.714-SP

Rel.: Min. Nilson Naves

EMENTA

Habeas corpus (cabimento). Matéria de prova (distinção).

1. O habeas corpus é concedido sempre que alguém esteja sofrendo ou se ache ameaçado de sofrer violência ou coação; trata-se de dar proteção à liberdade de ir, ficar e vir, liberdade induvidosamente possível em todo o seu alcance.

2. É possível fazer, no habeas corpus, exame de provas quando, por exemplo, tiver de ser apreciada falta de justa causa ou abuso de poder levando-se em consideração circunstâncias fáticas incontestáveis perante o direito e já reconhecidas.

3. O que se veda em habeas corpus, tal como ocorre no recurso especial, é a operação mental de conta, peso e medida dos elementos de convicção.

4. É admissível, pois, impetração que questione a prorrogação sucessiva de medida de segurança imposta.

5. Pedido originário do qual não se conheceu. Ordem expedida de ofício, a fim de que se julgue, na origem, o mérito do habeas corpus lá impetrado.

(STJ/DJU de 26/06/06, pág. 207)

Não é vedado o exame de provas em ?habeas corpus?, sobretudo quando a impetração pleitear a ausência de justa causa. O que não é possível nos estreitos limites do ?writ? é o amplo debate da prova, o revolvimento do acervo probatório.

Assim consta da presente decisão da Sexta Turma, Relator o Ministro Nilson Naves, com o seguinte voto:

O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): O que a impetrante pleiteia é o seguinte: ?… cassar a r. decisão que prorrogou a medida de segurança, determinando-se a desinternação condicional, contando-se o prazo de um ano previsto no art. 97 parágrafo 3º do Código Penal desde a data da concessão da liminar.?

Acontece, porém, que, não se conhecendo, na origem, do habeas corpus, tal questão não foi lá enfrentada, donde a dificuldade de o Superior Tribunal conhecer da questão aqui renovada. Acontece que o habeas corpus de origem era conhecível. Sobre o seu cabimento em situações tais, todas assemelhadas ao presente caso, consulte-se especialmente o HC-36.824, DJ 6.6.05, de minha relatoria, cuja ementa assim escrevi:

?Habeas corpus (cabimento). Matéria de prova (distinção).

1. Determina a norma (constitucional e infraconstitucional) que se conceda habeas corpus sempre que alguém esteja sofrendo ou se ache ameaçado de sofrer violência ou coação; trata-se de dar proteção à liberdade de ir, ficar e vir, liberdade induvidosamente possível em todo o seu alcance.

2. Assim, não procedem censuras a que nele se faça exame de provas. Quando fundado, por exemplo, na alegação de falta de justa causa, impõe-se sejam as provas verificadas. O que se veda em habeas corpus, semelhantemente ao que acontece no recurso especial, é a simples apreciação de provas, digamos, a operação mental de conta, peso e medida dos elementos de convicção.

3. Admite-se, sem dúvida, habeas corpus que questione defeitos da sentença relativos aos seus requisitos.

4. Pedido originário do qual não se conheceu. Ordem, porém, expedida de ofício, a fim de que se julgue, na origem, o mérito da impetração.?

Deste habeas corpus não estou conhecendo, mas estou expedindo de ofício a ordem com o propósito de determinar que, na origem, se conheça do habeas corpus lá impetrado a favor de Natanael Pires de Oliveira – e se julgue o seu mérito.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Hamilton Carvalhido, Paulo Gallotti, Paulo Medina e Hélio Quaglia Barbosa.

Ronaldo botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.