HABEAS CORPUS N.º 44.922-SP

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Rel.: Min. Felix Fischer

EMENTA

Na linha de precedentes do Pretório Excelso a mera referência ao clamor público, por si só, não constitui razão suficiente para justificar a medida segregatória.

(STJ/DJU de 12/12/05, pág. 405)

Cada vez é mais acentuada a invocação pelos juízes criminais do ?clamor público? e da ?credibilidade da justiça? para justificar a prisão cautelar.

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Contudo, essas referências não foram cogitadas pelo legislador entre os requisitos (art. 312 do C.P.P.) para a decretação da prisão preventiva.

Nesse sentido, a decisão posta em destaque, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Félix Fischer, com o seguinte voto condutor:

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O Exmo. Sr. Ministro: Felix Fischer: Busca-se, no presente writ, a revogação da custódia cautelar a que se submete o paciente, por falta de fundamentação e em razão do paciente ostentar condições pessoais favoráveis.

Com efeito, a prisão preventiva deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu ius libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só pode ser decretada se expressamente for justificada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal.

In casu, o decreto prisional encontra-se assim fundamentado:

?Sobre os representados recai acusação grave de homicídio qualificado (o marido de MAIA foi morto por tiros à queima-roupa, na porta de sua casa). O fato chocou esta pequena cidade de São Sebastião da Grama e foi notícia na imprensa, gerando clamor público considerável.

A materialidade do crime é evidente.

Por isso, a prisão já se justificaria, posto que pretende resguardar a ordem pública e imprimir celeridade ao processo, permitindo rápida formação da culpa, preservando a boa instrução criminal que apura crime onde a vítima e um dos co-réus (MARIA) eram muito próximas, o que revela a complexidade da causa e a facilidade de desvirtuamento da investigação.

Porém, também a autoria pode ser, ainda que de início, ser atribuída aos ora representados, tendo em vista o que foi colhido no inquérito policial.

De outro lado é de se reconhecer que JOVENIL, pessoa especificamente indicada como participante do crime, encontra-se foragido.

A fim de preservar a garantia da ordem pública, assegurar a instrução criminal e a aplicação da lei penal, torna-se imprescindível a sua custódia cautelar.

Posto isto, acolho o pedido para decretar a prisão preventiva de JOVENIL ALBINO TUPAN e RICARDO LOPES, com fundamento no artigo 312 do Código de Processo Penal? (fls. 59/61).

Posteriormente, quando da prolação da r. decisão de pronúncia, houve ainda menção à necessidade da constrição cautelar, exarada nos seguintes termos:

?Os acusados tiveram prisão decretada, sendo certo que tal fato foi relevante para sucesso do procedimento criminal. Ademais, nesta pequena e pacata comarca a repercussão de um crime de homicídio causa clamor a ensejar a prisão, para acautelamento social, que deve ser mantida ademais que pronunciado o acusado. Da decisão conclui-se pela autoria e materialidade de crime tido por hediondo. Por isso, nos termos do artigo 408, parágrafo 2.º do Código de Processo Penal, mantenho a prisão? (fl. 184).

Conforme orientação do colendo Supremo Tribunal Federal, a decisão que indefere a liberdade provisória deve obrigatoriamente demonstrar a ocorrência concreta dos requisitos da custódia cautelar, não sendo motivo idôneo a referência ao clamor público, o qual, por si só, não tem força de embasar a constrição cautelar.

Confira-se a propósito os seguintes precedentes:

?1. Prisão por pronúncia de réu já anteriormente preso: pressuposto de validade da prisão cautelar anterior.

É sedimentada a jurisprudência no sentido de que, se a pronúncia, para conservar preso o réu, cinge-se à remissão aos fundamentos do decreto de prisão preventiva anterior, a eventual inidoneidade destes contamina de nulidade a prisão processual; a fortiori, a orientação é de seguir-se quando a pronúncia silencia totalmente a respeito, como ocorreu no caso.

2. Prisão preventiva: motivação inidônea.

Ausente fundamento cautelar no decreto de prisão, devem ser desprezadas, porque a ele aditado pelas sucessivas instâncias, a alegada situação peculiar do paciente – descrita posteriormente na denúncia – e, especialmente, as invocações relativas à gravidade do delito, ao clamor público e à garantia da credibilidade da Justiça que, de resto, têm sido repudiadas pela jurisprudência do STF como motivos idôneos da prisão preventiva?.

(HC 83782/PI, 1.ª Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 25/02/2005).

Corroborando este entendimento colaciono o seguinte precedente desta Corte:

?PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ARTIGOS 121, § 2.º, I, III E IV E 155, § 4.º, IV, 211 C/C ARTIGO 29, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. ORDEM PÚBLICA.

I – A prisão preventiva deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só pode ser decretada se expressamente for justificada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal.

II – Em razão disso, deve o decreto prisional ser necessariamente fundamentado de forma efetiva, não bastando meras referências quanto à gravidade genérica do delito ou ao clamor público que o evento originou. É dever do Magistrado demonstrar, com dados concretos extraídos dos autos, a necessidade da custódia da recorrente, dada sua natureza cautelar nessa fase do processo (Precedentes).

Ordem.?

(HC 45079/RR, 5.ª Turma, de minha relatoria, DJ de 24/10/2005)

?PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 121, § 2.º, II E IV, DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. GRAVIDADE EM ABSTRATO DO DELITO. CLAMOR PÚBLICO.

I – A prisão preventiva deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só pode ser decretada se expressamente for justificada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal.

II – Em razão disso, deve o decreto prisional ser necessariamente fundamentado de forma efetiva, não bastando meras referências quanto à gravidade genérica do delito. É dever do magistrado demonstrar, com dados concretos extraídos dos autos, a necessidade da custódia do paciente, dada sua natureza cautelar nessa fase do processo (Precedentes).

III – Na linha de precedentes do Pretório Excelso a mera referência ao clamor público, por si só, não constitui razão suficiente para justificar a medida segregatória.

Writ concedido, para revogar a prisão preventiva decretada em desfavor do paciente, que poderá responder o processo em liberdade se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de eventual decretação de prisão preventiva devidamente fundamentada.?

(HC 41742/MT, 5.ª Turma, de minha relatoria, DJ de 22/8/2005).

?HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. CARACTERIZAÇÃO.

1. A simples referência ao clamor público, sem mais, e a alusão a notícia de ameaças por parte dos apontados autores dos delitos, desprovida de efetiva definição e indicação da prova da sua existência, não podem ser acolhidas como bastantes à preservação da prisão decretada, porque não demonstram as suas razões legais, como o exige a natureza excepcional da cautelar prisional, decorrente do princípio constitucional da presunção de não culpabilidade.

2. A fuga do autor do delito, para evitar a prisão em flagrante, sem outras circunstâncias que revelem a sua deliberação de livrar-se da ação da justiça, não autoriza a decretação da prisão provisória.

3. Ordem concedida, com extensão ao co-réu?.

(HC 35026/MG, 6.ª Turma, rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 14/2/2005).

Ante o exposto, concedo a ordem para revogar o decreto da segregação cautelar, se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de que venha a ser novamente decretada a custódia cautelar, devidamente fundamentada.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.