Processual civil. Prisão civil. Depositário infiel. Furto do bem penhorado. Boletim de ocorrência.

EMENTA

I – Intimado para apresentar os bens penhorados, deve o depositário prontamente atender a determinação ou depositar o equivalente em dinheiro, sob pena de não o fazendo, ser considerado depositário infiel, sujeito à pena de prisão civil.

II – O boletim de ocorrência, com a simples assertiva de que o bem penhorado foi furtado, sem qualquer outro elemento de convicção, não é suficiente para comprovar o caso fortuito e isentar o depositário de responsabilidade. Precedentes.

III – Recurso em habeas corpus desprovido.

(STJ/DJU de 02/05/05, pág. 334)

Não basta para isentar o depositário de responsabilidade, a simples alegação constante de Boletim de Ocorrência que o bem penhorado foi furtado, sem qualquer outro elemento de convicção. Decisão da terceira Turma, relator o ministro Antônio de Pádua Ribeiro, com o seguinte voto:

Exmo. Sr. ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Conforme se verifica, o ora recorrente aceitou o encargo de depositário dos bens arrecadados na falência, responsabilizando-se, portanto, pela guarda e conservação dos mesmos.

Quando da avaliação, os referidos bens não foram encontrados e o ora recorrente intimado para apresentá-los ou depositar o valor de R$ 215.649,00, como salientado pelo Juízo a quo (fls. 59/60). Não atendida a determinação, foi expedida a ordem de prisão que ora se ataca.

O recorrente tenta imputar a culpa ao síndico e ao Juízo que, segundo entende, não tomaram as medidas corretas quando das informações sobre os furtos dos bens arrecadados.

Ocorre que a jurisprudência tranqüila desta Corte é no sentido de que, intimado para apresentar os bens penhorados, deve o depositário prontamente atender a determinação ou depositar o equivalente em dinheiro, sob pena de não o fazendo, ser considerado depositário infiel, sujeito à pena de prisão civil.

A alegação de que os referidos bens foram furtados não exime o depositário de cumprir com a sua obrigação, que é o de zelar pela guarda e conservação dos mesmos.

No caso dos autos, apenas boletins de ocorrência foram juntados aos autos, sem qualquer outro elemento de convicção. A simples declaração de furto do objeto penhorado pelo próprio paciente perante a autoridade policial é insuficiente para comprovar o caso fortuito, como reiteradamente vem decidindo esta Corte, in verbis:

"HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. DEPÓSITO JUDICIAL. EXECUÇÃO. FURTO DO BEM PENHORADO. ARTIGO 1.277, CÓDIGO CIVIL. PROVA INSUFICIENTE.

Sem a prova inequívoca da ocorrência do caso fortuito ou da força maior em data posterior à penhora, não fica o depositário judicial escusado da sua obrigação.

A simples assertiva do paciente, em boletim de ocorrência policial, desacompanhado de outros elementos de convicção, não é suficiente à prova da excludente de responsabilidade.

Ordem negada"

(HC n.º 22.488-MG, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 2/12/2002).

"Recurso de habeas corpus. Prisão civil. Depositário judicial.

1. É legal a prisão civil do depositário judicial que não apresenta os bens que estavam sob sua guarda quando solicitado pelo Juízo.

2. O Boletim de Ocorrência, não complementado por outros elementos de convicção, comprova, apenas, que o interessado efetuou a declaração, no caso relativa a um furto, perante a autoridade policial, não a veracidade do conteúdo desta.

3. Recurso ordinário desprovido"

(RHC n.º 12.907-SP, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 7/10/2002).

"(……………………………………………..)

2. A simples alegação de furto do veículo objeto de garantia, consubstanciada isoladamente em boletim de ocorrência não conduz à isenção de responsabilidade (prisão civil) quando desacompanhado de outras providências concretas (requisição de inquérito, comunicação ao credor, etc.) dada a sua natureza unilateral. Incide a letra do art. 1.277 do Código Civil.

3. Ordem denegada"

(HC n.º 7.459-SP, rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 8/9/1998).

Veja-se, ainda, o que está afirmado no aresto recorrido:

"Registre-se, por fim, que o depositário comunicou ao E. juízo o furto dos "bens da massa falida" (fls. 17), aproximadamente um ano após a ocorrência do alegado evento, juntando aos autos os boletins de ocorrência por cópia a fls. 18/19, sem relacionar, contudo, quais os bens que foram furtados , a par de não demonstrar ter adotado as cautelas necessárias no sentido de preservar os bens que estavam sob sua guarda e depósito, conforme se verifica do auto de constatação (fls. 44)."

(fls.89).

Ante o exposto, e à vista do parecer do Parquet Federal, nego provimento ao recurso.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Humberto Gomes de Barros, Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho.

 Processual Penal. Habeas Corpus. Competência jurisdicional. Crime de roubo "qualificado" praticado a bordo de aeronave. Art. 109, IX, da CF. Competência da Justiça Federal.

HABEAS CORPUS

N.º 40.913/SP

Rel.: Min. Arnaldo Esteves Lima

EMENTA

1. "Aos juízes federais compete processar e julgar os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar" (art. 109, IX, da CF).

2. O fato de encontrar-se a aeronave em terra não afeta a circunstância de a prática criminosa ter-se verificado no seu interior.

3. É indiferente a qualidade das pessoas lesadas, constituindo razão suficiente e autônoma para a fixação da competência federal, a implementação da hipótese prevista no inciso IX, do art. 109, do Texto Maior.

4. Ordem denegada.

(STJ/DJU de 15/08/05, pág. 338)

Diante da desenganada redação do art. 109, IX, da Constituição Federal (aos juízes federais compete processar e julgar os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvando a competência da Justiça Militar) decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quinta Turma, relator o ministro Arnaldo Esteves de Lima, que o fato de encontrar-se a aeronave em terra não afeta a competência da Justiça Federal.

Consta do voto do relator:

Ministro Arnaldo Esteves Lima (Relator):

Prescreve o art. 109, inciso IX, da Carta da República:

Aos juízes federais compete processar e julgar: IX – os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar.

Assim, verificado que o crime tenha-se perpetrado no interior da aeronave, não importa que esta se encontre em vôo ou em pouso ou, ainda, a qualidade da vítima.

Paralelamente às considerações doutrinárias e jurisprudenciais sobre o tema, tem-se que a regra sobre a competência territorial da lei brasileira, inscrita no art. 5.º, § 2.º, do Código Penal, fornece embasamento legal para concluir sobre a identidade do termo "a bordo" com ambas as situações, de pouso e de vôo, nos termos seguintes:

Art. 5.º, § 2.º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.

Dessa forma, constatado no caso que a subtração violenta do produto do roubo foi perpetrada no interior da aeronave, impõe-se a aplicação da regra de competência da Justiça Federal prevista na Constituição da República (art. 109, IX).

Nesse sentido, segue a jurisprudência deste Superior Tribunal:

PROCESSUAL PENAL. CRIME COMETIDO A BORDO DE AERONAVE POUSADA. COMPETÊNCIA.

– "HABEAS CORPUS". CONCESSÃO QUE SE RECOMENDA EM FACE DA INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, DADO QUE, PARA EFEITO DA COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA FEDERAL (CF/1988, ART. 109, IX), O ESTADO DE POUSO DA AERONAVE NÃO AFETA A CIRCUNSTÂNCIA DO DELITO TER-SE DADO "A BORDO".

(HC 6.083/SP, Rel. Min. JOSÉ DANTAS, Quinta Turma, DJ 18/5/1998, p. 111.)

Nesse passo, é indiferente a qualidade das pessoas lesadas, constituindo razão suficiente e autônoma para a fixação da competência federal, a implementação da hipótese prevista no inciso IX, do art. 109, do Texto Maior.

Estas foram, aliás, as razões para a declinação de competência pelo Juízo de Direito da 7.ª Vara Criminal da Comarca de São Paulo/SP, determinando a remessa dos autos para a Justiça Federal, onde o feito foi processado (fl. 12).

Sendo assim, tem-se como competente a Justiça Federal para o processo e o julgamento do feito, restando infundado o inconformismo do impetrante manifestado nestes autos.

Pelo exposto, denego a ordem impetrada.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Nancy Andrighi, Castro Filho e Humberto Gomes de Barros.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.