HABEAS CORPUS N.º 26.834-CE

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Rel. Min. Paulo Medina

EMENTA

O limite máximo de 8 (oito) testemunhas descrito no art. 398, do Código de Processo Penal, deve ser interpretado em consonância com a norma constitucional que garante a ampla defesa no processo penal (art. 5.º, LV, da CF/88).

Para cada fato delituoso imputado ao acusado, não só a defesa, mas também a acusação, poderá arrolar até 8 (oito) testemunhas, levando em conta o princípio da razoabilidade e proporcionalidade.

Ordem concedida para garantir a oitiva das testemunhas arroladas pelo paciente (fls. 106/107).

(STJ/DJU de 20/11/06)

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Segundo o Superior Tribunal de Justiça, o limite de 8 (oito) testemunhas diz respeito com cada fato imputado ao acusado, cabendo à acusação igual direito em razão da isonomia, razoabilidade e proporcionalidade.

Decisão da 6.ª Turma, Relator o Ministro Paulo Medina.

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Consta do voto do Relator:

O Exmo. Sr. Ministro Paulo Medina (Relator): Cinge-se o pedido na possibilidade de serem arroladas testemunhas em número superior ao determinado pelo art. 398, do Código de Processo Penal.

Preludialmente, reconheça-se que o processo penal não pode mitigar esforços na busca da verdade material, devendo assegurar a ampla defesa, em respeito ao art. 5.º, LV, da Constituição Federal, in verbis:

?LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusado em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;?

Ora, em denúncia que descreve vários fatos tidos como criminosos, é de se resguardar ao acusado seu direito constitucional de se defender de todos os fatos, e não apenas de alguns.

Assim, faz-se necessário uma re-leitura da norma processual insculpida no art. 398 do Código de Processo Penal, para que o limite máximo de 8 (oito) testemunhas leve em conta a quantidade de fatos imputados ao denunciado, e não de maneira absoluta, como fez o Tribunal a quo.

Nesse sentido, no que atine ao número máximo de testemunhas, colaciono ensinamentos dos principais processualistas pátrios:

?(…) Há, no entanto, posição jurisprudencial admitindo a aplicação analógica do Código de Processo Civil ao caso, isto é, oito testemunhas para cada fato: ?Prova criminal – Testemunha -Denúncia que descreve mais de um fato – Defesa que, igual à acusação, pode arrolar até oito testemunhas para cada um – Oitiva determinada – Recurso provido. Se a denúncia descreve mais de um fato, a defesa, assim como a acusação, pode arrolar até oito testemunhas pata cada um (TJSP, Apelação 203.161-3, Limeira, 2.ª Câmara Criminal Extraordinária, rel. Pereira da Silva, 01.06.1998, v. u., com grifo nosso).

(in Guilherme de Souza Nucci, Código de Processo Penal Comentado, 3.ª edição, 2004, pág. 642)

?(…) Cumpre observar que a restrição legal não se refere a processo ou a réus, mas a fatos. Assim, se a denúncia descreve dois fatos, o Promotor de Justiça pode arrolar até oito testemunhas para cada um. Nesse sentido: STF, RHC 65.673, DJU 11.3.88, p. 4742.?

(in Damásio E. de Jesus, Código de Processo Penal Anotado, 19.ª edição, 2002, pág. 308)

?(…) Segundo se tem entendido, o número máximo de testemunhas diz respeito a cada fato criminoso – TJSC: J. Cat. 69/391 -, e, no caso de concursos de pessoas, a cada réu. (…)?

(in Julio Fabbrini Mirabete, Processo Penal, 10.ª edição, 2000, pág. 298)

?(…).

É importante observar que o número de testemunhas diz respeito aos fatos imputados. Assim, se houver imputação da prática de mais de um crime, o número de testemunhas variará em relação à quantidade dos delitos. O limite é, assim, para cada fato. Do contrário, bastaria a Ministério Público oferecer denúncias separadas, ali arrolando o número de testemunhas que lhe parecesse suficiente, para depois requerer o apensamento dos autos, seja em razão da conexão, seja em razão de continência entre ele (os fatos)?

(in Eugênio Pacelli de Oliveira, Curso de Processo Penal, 3.ª edição, 2004, pág. 415)

Os Tribunais, de maneira mais tímida, também vem decidindo que o número máximo de 8 (oito) testemunhas, deve levar em conta a quantidade de fatos que necessitam de provas.

Assim, precedentes desta Corte:

?PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL (ART. 105, INCISO III, ALÍNEA ?A? DA ?LEX MAXIMA?). HOMICÍDIO CULPOSO (36) E LESÃO CULPOSA (33). INÉPCIA DA DENÚNCIA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. PROVA ILÍCITA. LAUDO PERICIAL. TESTEMUNHOS CONTRADITÓRIOS. FIXAÇÃO DA RESPOSTA PENAL.

I – ?omissis?

III – A inobservância da limitação do número de testemunhas não acarreta, de pronto, uma nulidade. Além do mais, o número de testemunhos diz, pelo lado da acusação, como o número de fatos.

IV – ?omissis?

Recurso não conhecido.? (Resp 94.709/MG, Relator o Min. Felix Fischer, DJ de 09.11.1998, pág. 131) (grifei)

?PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO DE HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUTO DE PRISÃO EM, FLAGRANTE NULO. FALTA DE MATERIALIDADE. INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS. LIBERDADE PROVISÓRIA.

I – ?omissis?

IV – Sendo um único contexto fático, inexiste motivo, de regra, para extrapolar, pela defesa, a limitação imposta no art. 398 do C. P. P.

V – ?omissis?

Recurso desprovido?. (RHC 9.413/SP, Relator o Min. Felix Fischer, DJ de 08.03.2000, pág. 134) (grifei)

No mesmo sentido, decidiu o Colendo Supremo Tribunal Federal:

?- PROCESSO PENAL. NUMERO DE TESTEMUNHAS. DIVERSOS PACIENTES E ACUSAÇÃO DE MAIS DE UM CRIME. E JUSTIFICAVEL QUE TENHA SIDO EXCEDIDO O NUMERO DE OITO TESTEMUNHAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO SE HÁ MAIS DE UM RÉU E A ACUSAÇÃO E DE TEREM SIDO COMETIDOS DOIS CRIMES. ADEMAIS, NO CASO DOS AUTOS, NÃO FOI SEQUER DEMONSTRADO TER HAVIDO PREJUIZO PARA A DEFESA NA INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS EM NUMERO SUPERIOR A OITO, CONSIDERADO EXCESSIVO PELO RECORRENTE.? (RHC 65.673/SC, Relator o Min. Aldir Passarinho, Segunda Turma, DJ de 11.03.1988, pág. 4.742)

Destarte, sob pena de malferimento do texto constitucional, o limite do número de testemunhas do art. 398 do Código de Processo Penal, interpretado em consonância com o art. 5.º, LV, da CF/88, leva em consideração cada fato imputado ao acusado.

Posto isso, CONCEDO A ORDEM para determinar a oitiva das 20 (vinte) testemunhas arroladas pelo paciente às fls. 106/107, levando em conta que tal número se encontra dentro do razoável, dada a quantidade de fatos descritos no pórtico acusatório.

É o voto.

Decisão por maioria, votando com o Relator os Ministros Hélio Quaglia Barbosa e Paulo Gallotti.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.