Processo Civil. Recursos. Prazos. Quarta-Feira de Cinzas.

EMENTA

Se o prazo recursal termina na Quarta-Feira de Cinzas, nada importa que o expediente forense seja apenas vespertino, desde que não encerre antes da hora normal (CPC, art. 184, § 1.º, II). Recurso especial não conhecido.

(STJ/DJU de 19/09/05)

Decidiu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Ari Pargendler, que o expediente forense incompleto só é relevante se for encerrado antes da hora normal.

Consta do voto do Relator:

Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler (Relator):

Ao julgar os embargos de declaração, o tribunal a quo decidiu:

?Não conhecida a apelação interposta pela autora, por intempestividade, apresentou ela embargos de declaração. Diz que o acórdão é omisso por ter deixado de analisar os arts. 172 e seu § 3.º e 184, § 1.º e incisos, ambos do Código de Processo Civil, além de estar em contradição com a jurisprudência deste Tribunal e do egrégio Superior Tribunal de Justiça.

(…)

O acórdão não apresenta a omissão apontada pela embargante, pois o primeiro dispositivo legal acima indicado nada tem a ver com o thema decidendum. O segundo, sim, tem a ver e foi até citado expressamente no acórdão, na parte em que apresenta interesse (fl. 1235)? fls. 1.245/1.246, 7.º vol.

O art. 172 e o respectivo parágrafo terceiro têm a seguinte redação:

?Art. 172 Os atos processuais realizar-se-ão em dias úteis, das seis às vinte horas.

(…)

§ 3.º – Quando o ato tiver que ser praticado em determinado prazo, por meio de petição, esta deverá ser apresentada no protocolo, dentro do horário de expediente, nos termos da lei de organização judiciária local.?

À toda evidência, nem o caput nem o citado parágrafo podem influenciar o desate da lide, que depende de saber se o expediente meramente vespertino, no último dia do prazo recursal, tem o efeito de prorrogá-lo.

A matéria está, a contrario sensu, regulada no artigo 184, § 1.º, II, do Código de Processo Civil, segundo o qual:

?Art. 184 …

§ 1.º – Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil se o vencimento cair em feriado ou em dia em que:

II o expediente forense for encerrado antes da hora normal.?

Quer dizer, o expediente forense incompleto só é relevante se for encerrado antes da hora normal; o expediente meramente vespertino, como ocorre na Quarta-Feira de Cinzas, não induz a prorrogação de prazo.

Tal como decidiu o tribunal a quo, os precedentes colacionados ?dizem respeito a prazos iniciados na Quarta-Feira de Cinzas, quando é certo que a hipótese dos autos é diversa, ou seja, o prazo para apelar, no caso, expirou naquele dia? (fl. 1.246, 7.º vol.).

Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Carlos Albeto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho.

Penal. Tentativa de estupro. Impotência sexual ocasional. Inocorrência de crime impossível.

RECURSO ESPECIAL N.º 556.939/SC 

Rel.: Min. Gilson Dipp

EMENTA

I. Iniciada a execução do crime de estupro, através de violência e de grave ameaça, e não tendo a empreitada se consumado por circunstância alheia à vontade do agente, responde esse pela tentativa de estupro.

II. Hipótese em que o agente não conseguiu consumar o delito pela ocorrência de impotência sexual ocasional, praticando, contudo, atos idôneos de começo de execução (violência e grave ameaça).

III. Inocorrência de crime impossível.

IV. Recurso conhecido e provido.

(STJ/DJU de 12/04/05)

Decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quinta Turma, Relator o Ministro Gilson Dipp, que a impotência ocasional não desnatura a tentativa de estupro e nem configura o crime impossível.

Consta do voto do Relator:

Exmo. Sr. Ministro Gilson Dipp (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que deu parcial provimento ao recurso de apelação, isentando de pena o réu condenado pela prática de estupro tentado.

Consta dos autos que o recorrido foi denunciado como incurso nas penas do art. 213 do Código Penal, tendo sido condenado, em primeira instância a 4 anos de reclusão, em regime integralmente fechado, como incurso no art. 213, c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal.

Buscando a absolvição, sob a alegação de ausência de provas da autoria do delito, o réu interpôs recurso de apelação.

O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, no entendimento de que a consumação do delito não ocorreu por ineficácia absoluta do meio, enquadrou a conduta do réu no art. 17 do Código Penal, isentando-o de pena.

No presente recurso especial, aponta o Ministério Público divergência jurisprudencial com julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sob a alegação de que a não ocorrência da conjunção carnal por circunstâncias alheias à vontade do agente configura estupro tentando e não crime impossível.

Merece prosperar a irresignação.

O Tribunal a quo acatou a hipótese de crime impossível, sob o fundamento de que o crime não se consumou por ineficácia absoluta do meio porque o ?réu não teve potência, ou seja, não houve ereção?.

O art. 17 do Código Penal assim dispõe:

Art. 17. Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

Damásio E. de Jesus dá a seguinte noção de crime impossível:

?Em determinados casos, após a prática do fato, verifica-se que o agente nunca poderia consumar o crime, quer pela ineficácia absoluta do meio empregado, quer pela absoluta impropriedade do objeto material (pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta).?

Não é o que se verifica, no entanto, no presente caso, em que o meio, ao contrário do que entendeu a Corte a quo, não se mostrou inteiramente ineficaz para a produção do resultado, uma vez que havia o perigo de consumação do delito. Nas palavras de Mirabete, ?não se pode tachar de meio ineficaz aquele que, na prática, demonstra eficácia.?.

E, se não há absoluta impossibilidade de consumação do delito, não há que se falar na hipótese de crime impossível.

Com efeito, o agente percorreu o iter criminis, praticando atos de execução, ao forçar a vítima a ir para os fundos de um ginásio de esportes, constrangendo-a, mediante violência e grave ameaça, a manter com ele relações sexuais, que não ocorreram por circunstâncias independentes de sua vontade – ausência de ereção.

Assim, se o réu iniciou a execução do crime – através do exercício de violência e de grave ameaça – que somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, in casu, a impotência sexual, deve responder, na medida de seus atos, ou seja, pela tentativa do crime.

Vale registrar, no mesmo sentido, o seguinte trecho do parecer ministerial de fls. 271/275:

?Inicialmente, é sabido que para a caracterização do crime impossível, por absoluta ineficácia do meio, o objeto utilizado para o resultado pretendido pelo agente, deve ser totalmente inidôneo, pois, se relativa a ineficácia estaremos diante de uma tentativa.

Sendo assim, não se pode dizer que a falta de ereção, pelo excesso de bebida e pelo consumo de drogas, como é o caso dos autos, torna o meio absolutamente ineficaz, para a prática do delito de estupro.

Ademais, in casu, houve início da execução, porquanto o estupro é crime complexo e, desta forma, a grave ameaça e a violência exercida contra a vítima, fazem parte do iter criminis.

Dessa forma, iniciado o delito, que não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do agente (impotência ocasional), não há de se falar em crime impossível, e, sim, em crime tentado.

Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso, para restabelecer a sentença de primeiro grau.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Jorge Scartezzini, Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca e Felix Fischer.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.