Processo Civil. Contrato de Seguro. Cobertura por Danos Pessoais. Abrangência dos Danos Morais.

RECURSO ESPECIAL N.º 131.804/PR

Rel.: Min. Fernando Gonçalves

EMENTA

1 – Em contrato de seguro em que a apólice prevê cobertura por danos pessoais, compreendem-se nesta expressão os danos morais. Precedentes desta Corte.

2 – Recurso especial não conhecido.

(STJ/DJU de 15/3/04)

Nesta decisão posta em destaque, o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quarta Turma, Relator o Ministro Fernando Gonçalves, confirmou julgado do Tribunal de Alçada do Paraná na linha de precedentes da Corte Superior, no sentido de que os danos pessoais cobertos pelo contrato de Seguro compreendem também os danos morais.

Consta do voto do Relator

Exmo. Sr. Ministro Fernando Gonçalves (Relator):

Em virtude da morte, por atropelamento, de sua mulher, José Luís de Mello fez propor ação de indenização contra o causador do evento, Laércio Arantes de Araújo. Na contestação houve denunciação da lide da seguradora – Paulista Companhia de Seguros – PADAMI PARTICIPAÇÕES S.A. que, em preliminar, sustentou não ter a obrigação de ressarcimento de danos morais, não previstos no contrato de seguro. A preliminar foi afastada em primeiro grau, sendo esta decisão mantida, conforme se colhe do ven. acórdão, verbis:

“Segundo LUDWIG ENNECCERUS, citado por Clayton Reis, em sua obra “Dano Moral”, Ed. Forense, terceira edição, pg. 06, “dano é toda desvantagem que sofremos em nossos bens jurídicos (patrimônio, corpo, vida, saúde, honra, crédito, bem estar, capacidade de aquisição, etc..)”.

Dano moral, segundo o Professor ANTÔNIO CHAVES (ob. cit. pg. 5), “é a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado sem repercussão patrimonial.”

MARIA HELENA DINIZ preconiza que “o dano moral vem a ser a lesão de interesse não patrimonial de pessoa física jurídica.”

A presente lide cinge-se à discussão quanto à natureza dos danos morais, se estes fazem parte dos danos pessoais ou têm caráter autônomo.

O agravante sustenta que o dano moral constitui-se em espécie autônoma do gênero dano, e que os danos pessoais seriam uma sub-espécie dos danos patrimoniais.

Tal entendimento, contudo, não merece acolhida.

Os danos pessoais, quanto aos efeitos, podem ser patrimoniais e não-patrimoniais. Nesta última categoria incluem-se os danos morais, que lesionam o patrimônio psíquico.

Desta forma, a reparação do dano faz-se mediante compensação, por meio de uma prestação pecuniária que assegure à vitima uma satisfação compensatória.

A empresa agravante firmou com o agravado Laércio Arantes de Araújo contrato de seguro cujas condições gerais foram acostadas às fls, 38/42.

No item 1 que trata do objeto do seguro, consta:

“O presente seguro visa garantir, no limite da importância segurada e no âmbito nacional, o reembolso dos seguintes eventos:

a) Das indenizações que for obrigado a pagar, em decorrência de sentença judicial ou de acordo, por danos involuntários pessoais ou materiais, causados a terceiros, desde que autorizados expressamente pela seguradora”.

Assim, tendo sido acordado que o seguro cobriria danos pessoais, não há como excluir-se o dano moral, posto que este é um dano pessoal de caráter não patrimonial.

Ademais, o contrato de seguro não exclui, na cláusula referente aos riscos não cobertos, a indenização por danos morais.

Por conseguinte, a agravante é parte passiva legítima para figurar na presente lide, devendo responder pelos eventuais danos morais causados ao agravado José Luís de Mello, nos limites fixados na apólice respectiva.” (fls. 69/70)

Ao assim decidir, coloca-se o Tribunal de origem em consonância com o entendimento desta Corte sobre a matéria, vale dizer, em contrato de seguro em que a apólice prevê cobertura por danos pessoais, compreendem-se nesta expressão os danos morais.

A propósito:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. FILHO MENOR. INDENIZAÇÃO. SEGURO. DANO MORAL E DANO PESSOAL.

1. A indenização pelo dano moral decorrente da morte de filho menor com cinco anos de idade, que ainda não trabalhava e não auxiliava no sustento dos pais, pode ser calculado sobre a possível contribuição que prestaria durante a sua provável sobrevida, até o limite de 25 anos.

2. O contrato de seguro por danos pessoais compreende o dano moral, recurso conhecido e provido em parte.” (Resp 106.326/PR, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, DJU, 12.05.97)

“SEGURO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. EXCLUSÃO PRETENDIDA PELA SEGURADORA POR NÃO SE ENCONTRAR O DANO MORAL ABRANGIDO PELO DANO DE NATUREZA PESSOAL.

– O contrato de seguro por danos pessoais compreende o dano moral.

Precedentes da Quarta Turma.

Recurso especial conhecido, mas desprovido.” (Resp 122.663/RS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, DJU, 02.05.00)

Ante o exposto, não conheço do recurso.

Processual penal. Crime tributário. Parcelamento do débito antes da denúncia. Extinção da punibilidade. Desnecessidade do pagamento integral.

RECURSO ESPECIAL N.º 475.002/RS

Rel: Min. José Arnaldo da Fonseca

EMENTA

A Terceira Seção desta Corte pacificou o entendimento de que o acordo de parcelamento do débito tributário, feito antes do recebimento da peça vestibular, enseja a extinção da punibilidade prevista no art. 34 da Lei n.º 9.249/95, sendo irrelevante se pago em parte ou na sua totalidade.

A expressão “promover o pagamento”, disposta no art. 34 da Lei n.º 9.249/95, deve ser entendida como qualquer manifestação do contribuinte no sentido de liquidar seu débito, ainda que de forma parcelada.

Recurso conhecido, mas desprovido.

(STJ/DJU de 16/2/04, pág. 241)

Na linha do entendimento adotado pela Terceira Seção, decidiu a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, relator o ministro José Arnaldo da Fonseca que a exintção da punibilidade prevista no art. 34 da lei n.º 9.249/95 pode ocorrer com o simples parcelamento do débito feito antes do recebimento da denúncia, não havendo necessidade da quitação integral.

Consta do voto do relator:

Exmo. sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca (relator):

A questão está em saber se o simples parcelamento do débito antes do recebimento da denúncia é causa de extinção de punibilidade, ainda que este não tenha sido devidamente cumprido.

Conforme se extrai dos autos, de fato o parcelamento do referente débito – que deu entrada no INSS em 27.10.1997 – foi anterior ao recebimento da denúncia, que se deu somente em 20.05.1999. Assevere-se que o que interessa, aqui, não é o fato de ter sido o parcelamento cumprido ou não, mas sim seu efetivo requerimento, uma vez que o atraso no pagamento das parcelas não é questão pertinente ao âmbito penal, pois nesta esfera só restará a declaração da extinção da punibilidade.

Dessarte, torna-se irrelevante saber se as parcelas foram pagas somente em parte ou na sua totalidade, importando, sim, que o acordo de parcelamento tenha sido afamado antes do recebimento da exordial, impondo-se a declaração da extinção da punibilidade do crime da qual dispõe o art. 34 da Lei n.º 9.249/95, verbis:

“Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei n.º 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei n.º 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.”

A propósito, a expressão “promover o pagamento” tem de ser entendida como qualquer manifestação do contribuinte no sentido de liquidar seu débito, ainda que de forma parcelada, presumindo-se daí sua impossibilidade de fazê-lo à vista. Assim, o que se deve enaltecer é a realização de providência efetiva para quitação do débito pelo agente, desde que antes do recebimento da denúncia, comprovando-se, daí, sua aparente intenção de satisfação da dívida. É o que dispõem os precedentes a seguir transcritos:

“RECURSO ESPECIAL. DÉBITO TRIBUTÁRIO. TRANSAÇÃO. PAGAMENTO DO TRIBUTO APÓS A DENÚNCIA, MAS DENTRO DO PRAZO ESTABELECIDO PELA AUTORIDADE FAZENDÁRIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.

Este Superior Tribunal de Justiça tem-se posicionado no sentido de ser possível a extinção da punibilidade se o parcelamento de dívida tributária ocorrer antes do recebimento da denúncia.

Também é assente o entendimento de que não ocorre a extinção da punibilidade se o parcelamento da dívida se der após o recebimento da denúncia.

Segundo precedentes, ‘a transação proposta pelo contribuinte e aceita pelo Fisco, antecedentemente ao recebimento da denúncia, com vista à extinção do crédito tributário pelo pagamento, ainda que de forma parcelada e mediante concessões mútuas, retira a justa causa para a ação penal. O art. 34, da Lei 9.249/95 fala em “promover o pagamento” e, nestas circunstâncias, formalizado bilateralmente o ajuste, com providências efetivas ao pagamento, nada impede que este se faça após o ato de recebimento da acusação.’

Recurso conhecido, mas desprovido.”

(REsp 228.228/DF, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, in DJ 23/10/2000)

“PENAL. DÉBITO TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO ANTERIOR AO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE.

1. O acordo de parcelamento do débito tributário, efetivado antes do recebimento da denúncia, enseja a extinção de punibilidade prevista na Lei n.º 9.249/95, art. 34, porquanto a expressão ‘promover pagamento’ deve ser interpretada como qualquer manifestação concreta no sentido de pagar o tributo devido.

2. “Habeas Corpus” conhecido; deferido.”

(HC n.º 9.909/PE; Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, DJ 13.12.1999)

Outro, aliás, não tem sido o entendimento desta C. Corte, que por meio de sua 3.ª Seção, apreciando o RHC 11.598/SC, de relatoria do eminente Ministro Gilson Dipp, entendeu que o parcelamento do débito, antes do recebimento da peça vestibular, deve ser entendido como promoção do pagamento e, conseqüentemente, novação da dívida, cuja decisão restou assim ementada:

“CRIMINAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. OMISSÃO DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. PARCELAMENTO ANTERIOR À DENÚNCIA. DESNECESSIDADE DO PAGAMENTO INTEGRAL. RECURSO PROVIDO.

I. Uma vez deferido o parcelamento, em momento anterior ao recebimento da denúncia, verifica-se a extinção da punibilidade prevista no art. 34 da Lei n.º 9.249/95, sendo desnecessário o pagamento integral do débito para tanto.

II. Recurso provido para conceder a ordem, determinando o trancamento da ação penal movida contra os pacientes.”

(DJ de 02/09/2002)

Ainda neste sentido:

“RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL. PARCELAMENTO DO DÉBITO ANTES DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.

1. É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, em se tratando de crime contra a ordem tributária, o parcelamento do débito, antes do recebimento da denúncia, extingue a sua punibilidade (Intelecção do artigo 34 da Lei 9.249/95).

2. Recurso conhecido e provido.”

(REsp. 430.816/SC, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 23.06.2003)

“CRIMINAL – OMISSÃO DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS – CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA – OMISSÃO NO PAGAMENTO DE TRIBUTOS – PARCELAMENTO ANTERIOR À DENÚNCIA – DESNECESSIDADE DO PAGAMENTO INTEGRAL.

– Uma vez deferido o parcelamento, em momento anterior ao recebimento da denúncia, verifica-se a extinção da punibilidade prevista no art. 34, da Lei n.º 9.249/95, sendo desnecessário o pagamento integral do débito para tanto (entendimento adotado pela 3.ª Seção desta Corte por ocasião do julgamento do RHC 11.598/SC).

– Ordem concedida para trancar a ação penal.”

(HC 28.278/SP, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ de 01.12.2003)

PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. OCORRÊNCIA. PARCELAMENTO DO DÉBITO. POSSIBILIDADE. CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, DESPROVIDO.

1. Pacificou-se o entendimento na 3.ª Seção desta Corte que o parcelamento do débito, decorrente do não recolhimento das contribuições previdenciárias descontadas dos empregados, não impede o reconhecimento da causa de extinção de punibilidade prevista no art. 34, da Lei n.º 9.249/95. Precedentes.

2. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.”

(REsp. 378.799/RS, Rel.ª Min.ª Laurita Vaz, DJ de 16.06.2003)

À vista do exposto, conheço do recurso, mas lhe nego provimento.

Ronaldo Botelho

é advogado e professor da Escola da Magistratura.