HABEAS CORPUS N.º 54.164-MS

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Rel.: Min. Felix Fischer

EMENTA

Se a confissão na fase inquisitorial, posteriormente retratada em juízo, serviu, destacadamente, para o deslinde do feito, alicerçando o decreto condenatório, é de ser reconhecido o benefício da atenuante do art. 65, inciso III, alínea d do CP (Precedentes).

Writ concedido.

(STJ/DJU de 12/06/06)

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Mesmo que o acusado se retrate em Juízo da confissão feita na polícia, tem cabimento a atenuante do art. 65, inciso III, alínea d do Código Penal, se a confissão extrajudicial influiu na decisão da causa.

Decisão da 5.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Félix Fischer, com o seguinte voto:

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O Exmo. Sr. Ministro Felix Fischer: Busca-se pelo presente mandamus a concessão da ordem para que se faça incidir a atenuante a que se refere o art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal. Para tanto, aduz a impetrante que muito embora tenha havido retratação em juízo quanto ao delito mencionado, a confissão na fase extrajudicial foi essencial para a condenação do paciente.

A irresignação merece ser acolhida.

Com efeito, se a confissão na fase inquisitorial, posteriormente retratada em juízo, serviu, destacadamente, para o deslinde do feito, alicerçando o decreto condenatório, é de ser aplicada a atenuante do art. 65, inciso III, alínea d, do CP.

Veja-se o que constou da r. sentença penal condenatória, no que se refere ao ponto em escopo:

?No que se refere à materialidade delitiva, tenho não colher razão à defesa.

Não obstante do auto de exibição e apreensão de fl. 16 não conste importância em dinheiro encontrada com o acusado, certo é seu depoimento prestado em sede de inquérito policial, onde confirma ter subtraído R$ 200,00 (duzentos reais) da vítima, como também ter se desfeito deste numerário quando da chegada dos policiais militares.

Por outro lado, a testemunha Lucilene confirma ter recebido R$ 50,00 (cinqüenta reais) em dinheiro do acusado, esclarecendo, inclusive, ter visto mais dinheiro com Éder neste momento, não tendo o acusado comprovado que a sua origem era outra que não o roubo que lhe é imputado.

Não bastassem tais elementos, a vítima e Maria Delaides confirmam a subtração do dinheiro, sendo estes elementos suficientes para o reconhecimento da materialidade delitiva, no aspecto subtração.

Quanto à utilização da violência, o auto de apreensão de fl. 36 tem por objeto um cabo de vassoura fragmentado, o qual foi utilizado para atingir a vítima na nuca, fazendo com que ficasse inconsciente, viabilizando-se a subtração do dinheiro que tinha consigo, sendo que o laudo pericial de fls. 43/45 esclarece que ?a peça em questão foi examinada macroscopicamente, após o que pode o Perito classificá-lo como instrumento de ação contundente e, a considerar a consistência, encontra-se apto a produzir o ferimentos de natureza contusa. Dito cabo de vassoura acha-se quebrado, indicando ter sido produzido por força de impacto, uma vez que tal quebramento ocorreu em forma de lascas?.

Nesta trilha, o laudo pericial de fls. 32/34 comprova a destruição causada na residência de Maria Delaides, local onde os fatos ocorreram, aduzindo que ?após observar todos os elementos de interesse Pericial, constatou-se que o imóvel apresentava avarias de quebramento na taramela da porta da cozinha e, no interior do mesmo foi encontrado um cabo de vassoura quebrado em vários fragmentos?.

Todas estas informações constantes nos autos, dentre elas os depoimentos das testemunhas, são suficientes para caracterização da materialidade delitiva, conforme entendimento jurisprudencial que se apresenta:

Autoria e a materialidade delitivas amplamente demonstradas por meio dos boletins de ocorrência, termo de declaração e reconhecimento de pessoa, pelas evidências apreendidas em poder do réu, e pelos depoimentos das testemunhas (19/21, 31/33, 196/200). (…) Decisão: A turma, à unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) relator(a). (Apelação Criminal n. 9695/SP (200003990137282), 5.ª Turma do TRF da 3.ª Região, Rel.ª Juíza Ramza Tartuce. j. 02.04.2002, DJU 30.04.2002, p. 524).

Quanto à autoria delitiva, melhor sorte não assiste ao denunciado.

Com efeito, não obstante negar a prática do ato que lhe é imputado quando interrogado em Juízo, na fase investigativa o acusado confessou a prática delituosa, esclarecendo ter subtraído da vítima a importância de R$ 200,00 (duzentos reais), sendo que, deste total, R$ 50,00 (cinqüenta reais) foram repassados a Lucilene.

Ainda neste seu interrogatório, o acusado deixa claro que o fim dado à parte do dinheiro foi o pagamento de bebidas e os R$ 78,00 (setenta e oito reais) que tinha consigo, após cerca de uma hora da prática dos fatos, dispensou-os quando da chegada da polícia militar, pois não queria ser identificado como o autor dos fatos.

Se é certa a negativa posteriormente apresentada pelo réu, não menos certo é que esta afirmação tem por amparo a alegação de ter ele apanhado quando de seu interrogatório policial, onde o Sr. Delegado de Polícia teria obtido sua confissão ?a base de pancadas?.

Tais afirmações, todavia, não possuem respaldo nas provas coligidas aos autos, em especial diante do exame médico realizado no acusado quando de sua prisão, onde é certificado que este ?encontra-se em perfeitas condições de higidez física e mental e ao exame corpo delito não apresnta-se com nenhuma alteração ou ferimento?.

Verifica-se que malgrado a confissão do réu tenha servido de fundo para a condenação, a r. sentença não fez incidir a atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, o que restou confirmado pelo e. Tribunal a quo.

É de se reconhecer que a confissão posteriormente retratada propiciou o deslinde do feito, alicerçando o decreto condenatório e sua confirmação em segundo grau de jurisdição. Assim, nestas circunstâncias, não há como negar o favor legal. Entendimento contrário conduziria a situação contraditória.

Acerca do tema, destaco os seguintes precedentes:

?HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. FASE INQUISITORIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. CONDENAÇÃO BASEADA EM ELEMENTOS DA CONFISSÃO. ATENUANTE. RECONHECIMENTO.

1. Aplica-se a atenuante da confissão espontânea (art. 65, inciso III, alínea ?d?, do Código Penal) quando a confissão extrajudicial efetivamente serviu para alicerçar a sentença condenatória, ainda que tenha havido retratação em juízo.

2. Ordem concedida para, reformando-se o acórdão ora atacado, anular a sentença condenatória no tocante à dosimetria da pena, para que nova decisão seja proferida, com o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea?

(HC 47950/MS, 6.ª Turma, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJU de 10/04/2006).

?PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 12, DA LEI N.º 6.368/76. DOSIMETRIA DA PENA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO. GRANDE QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA EXTRAJUDICIAL POSTERIORMENTE RETRATADA EM JUÍZO. INCIDÊNCIA COMO ATENUANTE.

I – Para efeito de apreciação em sede de writ, a decisão condenatória reprochada está suficientemente fundamentada, uma vez que, não obstante tenha estabelecido a pena-base acima do mínimo legal, o fez motivadamente. In casu, a pequena exacerbação está motivada pela grande quantidade de substância entorpecente apreendida (Precedentes do STJ e do STF).

II – Se a confissão na fase inquisitorial, posteriormente retratada em juízo, alicerçou o decreto condenatório, é de ser reconhecido o benefício da atenuante do art. 65, III, alínea ?d?, do CP (Precedentes do STJ).

Writ parcialmente concedido?

(HC 44809/MS, 5.ª Turma, de minha relatoria, DJU de 19/12/2005).

?RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. RETRATAÇÃO EM JUÍZO DA CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. IRRELEVÂNCIA, QUANDO CONSIDERADA PARA FINS DE CONDENAÇÃO. RECURSO ESPECIAL FUNDADO NA ALÍNEA ?C? DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL INTEMPESTIVO E QUE NÃO COMPROVA O DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO CONHECIMENTO, COM CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO.

1. Não se conhece do recurso especial intempestivo.

2. A divergência jurisprudencial, autorizativa do recurso especial interposto, com fundamento na alínea ?c? do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, requisita comprovação e demonstração, esta, em qualquer caso, com a transcrição dos trechos dos acórdãos que configurem o dissídio, mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, não se oferecendo, como bastante, a simples transcrição de ementas ou votos.

3. A retratação em Juízo da confissão espontânea realizada na sede inquisitorial somente não se presta para fins de redução da pena quando não tiver sido considerada pelo juiz quando da edição da sentença condenatória (Precedentes da Corte).

4. Recurso não conhecido. Concessão de habeas corpus de ofício para reduzir ao mínimo as penas do recorrente?

(REsp 733874/DF, 6.ª Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 14/11/2005).

Feitas essas considerações, concedo a ordem para determinar que o e. Tribunal a quo refaça a dosimetria da pena, devendo sobre ela incidir a atenuante a que se refere o art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal.

É o voto.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.