Mandado de segurança

EMENTA

1. É lícito ao terceiro prejudicado requerer Mandado de Segurança contra ato judicial, em lugar de interpor, contra ele, embargos de terceiro.

2. A sentença que prejudica terceiro estranho ao processo expõe-se a Mandado de Segurança, mesmo que tenha transitado em julgado.

3. O pedido de Mandado de Segurança impetrado por terceiro prejudicado contra sentença transitada em julgado visa tornar ineficaz o ato judicial na parte que extrapolou os limites subjetivos da lide. Não tem o condão de rescindir a decisão.

(STJ/DJU de 18/6/07)

Conforme se vê da ementa, explicitada no corpo do acórdão, o terceiro prejudicado por decisão judicial, prolatada no processo do qual não foi parte, pode impetrar mandado de segurança para defender direito violado, mesmo que a decisão tenha transitado em julgado.

Decisão unânime da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Humberto Gomes de Barros, que foi acompanhado pelos Ministros Ari Pargendler, Carlos Menezes Direito e Castro Filho. Ausente, justificadamente, a Minista Nancy Andrighi.

Consta do voto do Relator:

Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): Nossa jurisprudência ajustou-se no sentido de permitir ao terceiro prejudicado por decisão judicial interpor recurso (CPC, Art. 499) ou impetrar Mandado de Segurança. Veja-se:

?(…) I – Ao permitir o recurso de terceiro prejudicado, o Art. 499 do CPC outorga direito potestativo, a ser exercido a critério do prejudicado, cuja inércia não gera preclusão.

II – É lícito ao terceiro prejudicado requerer Mandado de Segurança contra ato judicial, em lugar de interpor, contra ele, o recurso cabível.

III – É nula e ineficaz, por ofender os Arts. 460 e 472 do CPC, a sentença que, sem requerimento do autor, decreta a indisponibilidade de bens pertencentes a terceiros, alheios à relação processual.

IV – A circunstância de a sentença estar sob desafio de recurso com efeito suspensivo não lhe retira o potencial ofensivo nem a imuniza contra Mandado de Segurança em favor de terceiro prejudicado.? (RMS 8.879/HUMBERTO).

Nessa orientação: RMS 1.983/ZVEITER, RMS 150/GUEIROS LEITE, RMS?s 12.775 e 14.266/HUMBERTO, RMS 14.075/GARCIA, RMS 14.995/SCARTEZZINI, dentre outros.

No estuário desses entendimentos implantou-se a Súmula 202/STJ dizendo que ?a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso?.

Assim, o terceiro prejudicado pode requerer Mandado de Segurança contra ato judicial mesmo quando cabível a oposição de embargos de terceiro. Óbvio que a conveniência e/ou propriedade da medida judicial a ser usada está ao talante do prejudicado.

A 3.ª Turma decidiu, na assentada de 8/3/2007, que é lícito ao terceiro prejudicado requerer Mandado de Segurança contra ato judicial, em lugar de interpor, contra ele, embargos de terceiro (RMS 20.541/HUMBERTO).

Naquela ocasião, entretanto, a questão tratada no writ exigia dilação probatória. Por isso, a segurança foi denegada. Mas a tese principal – cabimento do Mandado de Segurança mesmo quando cabíveis, também, embargos de terceiro – foi acolhida.

Nestes autos, o Tribunal fluminense opôs outro obstáculo ao cabimento do writ: existência de trânsito em julgado da sentença objeto da impetração.

Tal obstáculo também pode ser afastado. Confira-se precedente específico:

?(…) O terceiro prejudicado por decisão judicial, prolatada em processo do qual não foi parte, pode impetrar mandado de segurança para defender direito violado, mesmo que a decisão tenha transitado em julgado, vez que o processo judicial transcorreu sem o seu conhecimento (…)? (RMS 14.554/FALCÃO)

Segundo o Art. 472 do CPC, ?a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros?. Dessa norma é que se extrai o raciocínio do precedente acima citado.

É claro que a sentença transitada em julgado não será desconstituída pela decisão proferida no Mandado de Segurança.

No caso concreto, por exemplo, os impetrantes pretendem, apenas, que os efeitos do ato judicial não os atinja. Não querem – e nem poderiam licitamente querer – a rescisão da sentença.

Sustentam apenas que os efeitos da sentença transitada em julgado que prejudica terceiros podem ser afastados por Mandado de Segurança.

O cabimento do pedido de Segurança é, portanto, incontroverso.

Valendo-me do Art. 515, § 3.º, do CPC, porque não há discussão sobre fatos e provas pertinentes que acompanharam a inicial do pedido de Segurança, passo ao exame de mérito do pedido.

Voltando ao caso concreto, observo que os impetrantes, ora recorrentes, não participaram do processo no qual foi proferida a sentença objeto da impetração.

Não se lhes nega, portanto, a condição de terceiros.

Em sendo terceiros, não poderiam ser atingidos por qualquer determinação da sentença proferida no processo do qual não participaram.

Evidentemente, a ordem expedida pelo juízo ao oficial do registro de imóveis impede que os impetrantes exerçam direito emergente de contrato não desconstituído pelo Judiciário.

Vale dizer: nada atingiu a escritura de compra e venda na qual os impetrantes figuram como compradores, mas aquele documento não tem valor porque, em processo envolvendo terceiros, expediu-se ordem ao oficial de registro para que não transferisse o imóvel.

A esfera jurídica dos impetrantes foi ilicitamente atingida por decisão judicial.

Concedo a segurança exclusivamente para declarar a ineficácia, em relação aos impetrantes, da sentença que julgou procedente pedido de cancelamento de contrato formulado por Leonardo Sava D?Almeida contra Cláudio Moreira de Alencar.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.