Habeas corpus. Medida de segurança…

Habeas corpus. Medida de segurança. Internação. Doença superveniente. Prazo estabelecido na condenação. Ordem concedida.

HABEAS CORPUS N.º 26.535-SP
Rel.: Min. Paulo Gallotti
EMENTA

1. O entendimento desta Corte é no sentido de que a superveniência de doença mental no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade autoriza sua substituição por medida de segurança, limitada, contudo, ao tempo que faltar para o termino da sanção imposta na condenação.

2. Mostrando-se o apenado inapto ao retorno à sociedade, deverá ser aplicado o disposto no artigo 682, § 2.º, do Código de Processo Penal.

3. Ordem concedida.

(STJ/DJU de 8/6/09)

Decidiu o Superior Tribunal de Justiça por sua Sexta Turma, Relator o Ministro Paulo Gallotti que a superveniência de doença mental no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade autoriza sua substituição por medida de segurança, limitada, contudo, ao tempo que faltar para o término da sanção imposta na condenação. Se a internação se prolongar até o término do prazo e não houver sido imposta medida de segurança detentiva, o indivíduo terá o destino aconselhado pela sua enfermidade, feita a devida comunicação ao juiz de incapazes.

Consta do voto do Relator:

O Senhor Ministro Paulo Gallotti(Relator): A ordem é de ser concedida.

Inicialmente, cabe ressaltar que a assessoria de meu gabinete obteve informação da comarca de origem dando conta que o paciente permanece internado, por força de decisão proferida em 13 de outubro de 2004, cuja cópia determino seja juntada aos autos.

O entendimento desta Corte é no sentido de que a superveniência de doença mental no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade autoriza sua substituição por medida de segurança, limitada, contudo, ao tempo que faltar para o termino da sanção imposta na condenação.

Vejam-se:

A – “HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. DOENÇA MENTAL SUPERVENIENTE. MEDIDA DE SEGURANÇA. PRAZO.

1. A medida de segurança substitutiva, imposta em razão de doença mental superveniente, tem como limite máximo o tempo faltante de pena a cumprir.

2. Ordem concedida.”

(HC n.º 29.796/SP, Relator o Ministro HAMILTON CARVALHIDO, DJU de 17/2/2005)

B – “HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO CRIMINAL. SUPERVENIÊNCIA DE DOENÇA MENTAL. MEDIDA DE SEGURANÇA SUBSTITUTIVA. DURAÇÃO. CUMPRIMENTO INTEGRAL DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRECEDENTES DO STJ.

1. Se no curso da execução da pena privativa de liberdade sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental do condenado, o juiz poderá determinar a substituição da pena por medida de segurança, a teor do disposto no art. 183, da Lei de Execuções Penais. A duração dessa medida substitutiva não pode ser superior ao tempo restante para cumprimento da reprimenda. Precedentes do STJ.

2. Assim, ao término do referido prazo, se o sentenciado, por suas condições mentais, não puder ser restituído ao convívio social, o juiz da execução o colocará à disposição do juízo cível competente para serem determinadas as medidas de proteção adequado à sua enfermidade (art. 682. § 2.º, do Código de Processo Penal).

3. Ordem concedida.”

(HC n.º 31.702/SP, Relatora a Ministra LAURITA VAZ, DJU de 5/4/2004)

Assim também entendeu a Subprocuradoria-Geral da República, no parecer exarado às fls. 332/337, que adoto como razão de decidir, verbis:

“A questão que se coloca é saber se a medida de segurança substitutiva de pena privativa de liberdade, prevista no artigo 183 da LEP, pode ultrapassar o tempo delimitado na reprimenda, pela sentença condenatória transitada em julgado.

A doutrina diverge. Penso, no entanto, que a melhor solução está com os que entendem que a medida de segurança imposta no curso da execução da pena, não pode ter duração superior ao tempo restante da sanção.

É que a medida de segurança prevista na lei penal – art. 26, c/c o art. 97 do CP – destina-se aos semi-imputáveis ou inimputáveis, assim reconhecidos durante o processo de conhecimento, o que não é o caso do paciente, pois restou condenado como imputável.

Como anteriormente dito, ao réu imputável o direito penal vigente determina a aplicação de pena privativa de liberdade ou restritiva de direito, conforme o caso, nunca, medida de segurança.

Há os que argumentam, entretanto, que quando ocorre a conversão não se cogita mais da pena imposta. Este entendimento não pode prevalecer. Isto porque, a substituição em questão não tem como base a periculosidade do agente – eis que esta sequer foi considerada no curso da ação penal – é antes uma “medida de tratamento’, que tem como objetivo curar, ou, no mínimo, tratar o doente mental.

Assim, com o advento do termo final da pena substituída, independentemente da cessação ou não da periculosidade, a medida tem que ser declarada extinta.

Esse é o entendimento firmado no âmbito do Supremo Tribunal Federal e dessa Eg. Corte de Justiça, e.g:

“Habeas Corpus. Reformatio in pejus. 2. Réu condenado, em primeiro grau, à pena de dois anos de reclusão e pagamento de multa, por infringir o art. 155, § 4.º, I, do Código Penal. 3. Provida a apelação do acusado para absolvê-lo, impondo-se lhe, porém, medida de segurança, com internação em hospital psiquiátrico pelo prazo mínimo de três anos, considerando o acórdão inimputável o paciente. 4.

Hipótese em que se caracteriza reformatio in pejus. Não houve recurso do Ministério Público. Embora absolvido o paciente, com o provimento de sua apelação, impôs-se-lhe medida de segurança, apesar de o laudo pericial o haver tido como imputável.’ 5. No caso, o paciente já cumpriu a pena restritiva de liberdade imposta na sentença. Não cabe, ainda, submetê-lo, sem recurso do Ministério Público, a medida de segurança, nos termos do acórdão. 6. Habeas corpus deferido, para cassar aresto da Corte local, na parte relativa à medida de segurança, remetendo-se os autos ao Juízo de Execução (Lei n.º 7.210/1984, art. 66).’

(HC n.º 74.874/SP, in DJU de 5/9/1997, pág. 111, Rel. Min. Neri da Silveira – Segunda Turma)

“HABEAS CORPUS. PROVA DA REINCIDÊNCIA DO PACIENTE, QUE FOI PRODUZIDA, EM SEDE RECURSAL, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ADMISSIBILIDADE. RETRATAÇÃO EM JUÍZO DA CONFISSÃO POLICIAL. INAPLICABILIDADE DA CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PEDIDO INDEFERIDO. CONCESSÃO DE OFÍCIO DO WRIT, NO ENTANTO, PARA CANCELAR MEDIDA DE SEGURANÇA IMPOSTA A RÉU IMPUTÁVEL.

A legislação processual penal admite a ampla possibilidade jurídica de os sujeitos processuais produzirem, em juízo, a prova documental por eles reputada pertinente e adequada à demonstração da verdade real (CPP, arts. 231 e 400). A prova da reincidência do acusado pode ser validamente produzida pelo Ministério Público em sede recursal. – Não se beneficia da circunstancia atenuante obrigatória da confissão espontânea o acusado que desta se retrata em juízo. A retratação judicial da anterior confissão efetuada perante a Polícia Judiciária obsta a invocação e a aplicação da circunstância atenuante referida no art. 65, III, “d”, do Código Penal. – O criminoso reincidente não mais está sujeito à medida de segurança pessoal e detentiva. – A jurisprudência dos Tribunais, ao ressaltar a abolição das medidas de segurança para os imputáveis (pela antiga periculosidade real ou presumida), tem reconhecido, com fundamento na superveniência de lei penal benéfica, a aplicação retroativa do novo sistema a casos pretéritos.”

(HC n.º 6.9188/SP, in DJU de 26/3/1993, pág. 175, Rel.

Min. Felix Fischer 1.ª Turma)

“PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DA PENA. DOENÇA MENTAL SUPERVENIENTE. MEDIDA DE SEGURANÇA SUBSTITUTIVA. DURAÇÃO.

– Havendo medida de segurança substitutiva da pena privativa de liberdade, a sua duração não pode ultrapassar ao tempo determinado para cumprimento da pena.

Writ deferido.’

(HC n.º 12.957/SP, in DJU de 4/9/2000, pág. 175, Rel. Min. Felix Fischer)

“PROCESSO PENAL. EXECUÇÃO DA PENA. DOENÇA MENTAL SOBREVINDA. MEDIDA DE SEGURANÇA. DURAÇÃO. AFEITA AO SISTEMA VICARIANTE DE 1984, A MEDIDA DE SEGURANÇA DETENTIVA APLICÁVEL NOS TERMOS DO ART. 183 DA LEP.

Não pode ter duração superior ao tempo restante da pena, sem prejuízo de que, afinal, recomende-se a providência prevista no art. 682, § 2.º, do CPP.

(RHC n.º 2.445/SP, DJU de 31/5/1993, pág. 10.678, Rel. Min. José Dantas 5.ª Turma)

Por fim, cumpre acrescentar que a solução encontrada para casos como o do paciente, que segundo o laudo de fls. 295/296, não se mostra apto para voltar ao convívio social e, tampouco dispõe de familiares para o acolher, é o Juiz da execução o colocar à disposição do Juízo Cível competente para as medidas de proteção recomendadas por sua enfermidade, nos termos do artigo 682, § 2.º, do CPP:
“Art. 682. O sentenciado a que sobrevier doença mental, verificada por perícia médica, será internado em manicômio judiciário, ou, à falta, em outro estabelecimento adequado, onde lhe seja assegurado a custódia.
(…)
Se a internação se prolongar até o término do prazo restante da pena e não houver sido imposta medida de segurança detentiva, o indivíduo terá o destino aconselhado pela sua enfermidade, feita a devida comunicação do juiz de incapazes.’

Por estas razões, o Ministério Público Federal manifesta-se pelo deferimento do writ.”

Diante do exposto, concedo a ordem de habeas corpus para declarar extinta a pena privativa de liberdade imposta na ação penal de que aqui se cuida, devendo o paciente ser imediatamente posto em liberdade, recomendando-se que o Juízo da Execução, se necessário e conveniente, adote a providência prevista no artigo 682, § 2.º, do Código de Processo Penal.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Paulo Medina, Hélio Quaglia Barbosa e Nilson Naves.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.