EMENTA
I – O objeto jurídico tutelado pelo tipo em questão é a proteção da moralidade do menor e visa coibir a prática de delitos em que existe sua exploração. Assim, a corrupção de menores é crime formal, o qual prescinde de prova da efetiva corrupção do menor.
II – Recurso provido, nos termos do voto do relator.
(STJ/DJU de 18/12/06)
Por mais de uma vez, o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quinta Turma, Relator o Ministro Gilson Dipp, decidiu que o delito do art. 1.º da Lei 2.252/54 é delito de natureza formal, prescindindo da efetiva corrupção do menor para sua configuração.
Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Felix Fischer.
Consta do voto do Relator:
Exmo. sr. Ministro Gilson Dipp (Relator):
Trata-se de recurso especial interposto em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Alçada do Estado, que negou provimento ao recurso ministerial e deu parcial provimento ao apelo da defesa, com extensão ao co-réu não-apelante.
Em razões, aponta o Ministério Público negativa de vigência ao art. 1.º da Lei 2.252/54, alegando se tratar de delito formal, que prescinde da efetiva corrupção do menor para sua configuração. Aduz divergência jurisprudencial.
O recurso é tempestivo. O Ministério Público foi intimado na pessoa de seu representante legal no dia 26/11/2005 (fl. 210v.), e a petição de interposição do recurso especial foi protocolada em 07/12/2004 (fl. 232).
A matéria foi devidamente prequestionada, conforme se verifica no teor da própria ementa do julgado.
A divergência está configurada nos moldes determinados no art. 255 do RISTJ.
Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso especial, merecendo prosperar a irresignação.
O Juízo sentenciante entendeu não configurado o delito de corrupção de menores, sob os seguintes fundamentos (fl. 117):
?O crime de corrupção de menores não resta provado, considerando que é crime de natureza material, necessária a demonstração de que os adolescentes não eram corrompidos e o foram pela participação nos crimes de roubo acima descritos.?
O acórdão recorrido, por sua vez, assim considerou para manter afastada a caracterização do delito de corrupção de menores (fl. 182):
?(…)
Isto porque é entendimento majoritário desta Câmara que o delito de corrupção de menores é eminentemente de caráter material, conquanto inexiste resultado presumido, isto é, o dano ou perigo efetivamente ocorrem, ocasionando impacto no bem jurídico tutelado, sob pena de se constatar a atipicidade da conduta. Assim, para a configuração de tal empreitada criminosa prevista no art. 1.º da Lei 2.252/54, necessária é a demonstração de que, à época dos fatos, o menor não era penalmente corrompido e que, com a prática delituosa, perpetrada juntamente com os apelados, o teria tornado…?
Entretanto, o objeto jurídico tutelado pelo art. 1.º da Lei 2.252/54 é, em essência, a proteção da moralidade dos menores, visando a coibir a prática de delitos em que existe a sua exploração. Assim, o tipo trata de delito formal, o qual prescinde, para sua configuração, de prova da efetiva corrupção do menor.
No julgamento do REsp. 107.594/PR, transcrevi trecho de parecer proferido pela, então, Subprocuradora-Geral da República Laurita Vaz, deste teor:
?Por fim, convém ressaltar, que, da mesma forma, não pode ser afastada a configuração do delito ao simples argumento de que os menores, à época do fato criminoso em questão, já estavam corrompidos. Primeiramente, há que se lembrar que a delinqüência admite graus, sendo certo que a reiteração de condutas delituosas pelo adolescente age como um reforço à sua tendência delitiva anteriormente adquirida…?
A respeito do tema, trago à colação os seguintes julgados:
?RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. ROUBO PRATICADO COM O CONCURSO DE MENOR. LEI 2.252/54, ART. 1.º. PENA. REINCIDÊNCIA. AGRAVANTE. ART. 61, I, CÓDIGO PENAL. APLICAÇÃO.
Delito de corrupção de menor configurado. Crime de perigo. Presunção decorrente do próprio texto legal. Tutela penal de moralidade dos menores contra a corrupção penal. Segundo precedentes, ?dentro dos limites legais, uma vez caracterizada a reincidência, a agravante deve ser aplicada?.
Recurso conhecido e provido.?
(REsp 608.849/RS, Rel. Min. José Arnaldo, DJ de 30/8/2004).
?- Latrocínio praticado com o concurso de menor. Lei 2.252/54, art. 1.º.
– Delito de corrupção de menor configurado. Crime de perigo. Presunção decorrente do próprio texto legal. Tutela penal de moralidade dos menores contra a corrupção penal.
– Recurso conhecido e provido.?
(REsp. 140.899/PR; Rel. Min. José Arnaldo; DJ 27/4/1998).
?PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO E CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 1.º DA LEI N.º 2.252/54). PRONÚNCIA. CRIMES CONEXOS.
I – A pronúncia pelo crime de competência do Tribunal do Júri obriga a que se submeta – ressalvada a total falta de justa causa detectável na via do writ – a julgamento, também, o delito conexo.
II – O crime previsto no art. 1.º da Lei n.º 2.252/54 é de perigo, sendo despicienda a demonstração de efetiva e posterior corrupção penal do menor (Precedente).
III – A anterior inocência moral do menor também se presume, só que iuris tantum.
IV – O tipo subjetivo, na enfocada corrupção de menores, se esgota no dolo, sendo prescindível qualquer elemento subjetivo diverso.
V – A norma insculpida no art. 1.º da Lei n.º 2.252/54, uma dentre tantas que se destinam à proteção da infância e da juventude, tem por objetivo que os maiores não pratiquem, em concurso com menores, infrações penais e que, também, não os induzam a tanto. Exigências adicionais para a tipificação são extra-legais e até esbarram no velho brocado commodissimum est, id accipi, quo res de qua agitur, magis valeat quam pereat (?Prefira-se a inteligência dos textos que torne viável o seu objetivo, ao invés da que os reduz à inutilidade?).
Recurso provido?.
(REsp. 197.762/PR; Rel. Min. Felix Fischer; DJ 13/9/1999).
Desta forma, merece ser provido o recurso, para condenar os réus pelo delito de corrupção de menores.
Remetam-se os autos ao Juízo de primeiro grau para fixação da pena.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso, nos termos da fundamentação acima.
É como voto.
Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola de Magistratura.