HABEAS CORPUS N.º 58.620-PR

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Rel.: Min. Gilson Dipp

EMENTA

I. A fuga do réu após interpor recurso de apelação enseja a sua deserção, ainda que a recaptura ocorra antes do julgamento do apelo pelo Tribunal de 2.º grau.

II. Situação dos autos que não configura a hipótese de deserção.

III. Paciente que empreendeu fuga durante a instrução processual, antes, portanto, da prolação da sentença condenatória, não tendo dela tomado conhecimento.

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IV. Deve ser anulado o acórdão impugnado, a fim de que o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região conheça e analise o mérito do recurso de apelação interposto em favor do paciente.

V. Determinada a anulação do aresto da Corte a quo, restam prejudicadas as demais alegações.

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VI. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.

(STJ/DJU de 25/09/06)

Firma-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a deserção somente ocorre quando o réu, condenado, empreende fuga após a interposição do apelo.

Não há deserção quando a fuga ocorre antes da sentença ou do recurso.

Decisão da Quinta Turma, Relator o Ministro Gilson Dipp.

Consta do voto do Relator:

O Exmo. Sr. Ministro Gilson Dipp (Relator):

Trata-se de habeas corpus contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, que não conheceu do recurso de apelação interposto em virtude deste não ter se recolhido à prisão para recorrer.

O paciente foi condenado à pena de 05 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado, como incurso no art. 1.º, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, não tendo sido permitido o recurso em liberdade.

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, o qual não foi conhecido pelo Tribunal a quo, em virtude de o acusado não ter se recolhido à prisão para apelar.

Em razões, sustenta-se a ocorrência de constrangimento ilegal, em virtude do condicionamento do julgamento do mérito do recurso de apelação ao prévio recolhimento do condenado à prisão, o qual violaria a garantia do duplo grau de jurisdição, bem como o princípio da presunção de inocência.

Pugna-se, assim, pela determinação de recebimento do apelo defensivo, com a análise do mérito recursal pela Corte Estadual.

Posteriormente, um dos impetrantes apresentou aditamento à inicial, oportunidade em que, não obstante asseverar que ?a presente emenda, portanto, não traz nenhum fato que já não tivesse sido trazido ao conhecimento dessa Colenda Corte na petição inicial? (fl. 156), aduziu ser nulo o julgamento da apelação em virtude da ocorrência reformatio in pejus, bem como em razão da ausência de intimação da defesa.

Passo à análise da irresignação.

Na esteira do entendimento firmado nesta Turma, a fuga do réu após interpor o recurso de apelação enseja a sua deserção, ainda que a recaptura ocorra antes do julgamento do apelo pelo Tribunal de 2.º grau, nos termos do art. 595 da Lei Processual Penal (RHC 10071/SP, DJ de 18/12/2000, Relator Min. EDSON VIDIGAL; RHC 10650/SP, DJ de 02/04/2001, Relator Min. JOSÉ ARNALDO; HC 16742/MG, DJ de 20/08/2001, Relator Min. FELIX FISCHER).

Porém, esta não é a situação do paciente.

Consta dos autos que o paciente foi citado e interrogado, tendo sido apresentada defesa prévia, com rol de testemunhas.

Posteriormente, todavia, foi decretada a revelia do réu, tendo a instrução processual sido realizada sem a presença do acusado.

A sentença condenatória foi proferida somente em 06/05/2005 (fls. 25/40), sendo certo que desde a data de sua fuga o paciente não foi mais localizado.

É o que se extrai do dispositivo da decisão monocrática:

?(…)

O condenado não poderá apelar em liberdade. Além de possuir maus antecedentes (CPP, art. 594) conforme analisado no item III Aplicação de Pena, o ora condenado encontra-se foragido, fazendo-se necessária sua prisão para fins de aplicação da lei penal (CPP, art. 312), pois não há de se esperar daquele que esteve foragido durante o trâmite do processo que se apresente à Justiça para cumprimento de pena?. (fl. 40).

Assim, evidenciado que o paciente empreendeu fuga durante a instrução processual, antes, portanto, da prolação da sentença condenatória, não tendo dela tomado ciência, não resta configurada a deserção, a qual, conforme a reza do art. 595 do CPP, somente ocorre quando ?o réu condenado fugir após haver apelado?.

A propósito, destaco os recentes julgados desta Corte:

?CRIMINAL. HC. FURTO. TENTATIVA. APELAÇÃO. RÉU QUE EMPREENDEU FUGA. DESERÇÃO NÃO-CONFIGURADA. FUGA OCORRIDA MAIS DE UM ANO ANTES DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. ORDEM CONCEDIDA.

I. A fuga do réu após interpor recurso de apelação enseja a sua deserção, ainda que a recaptura ocorra antes do julgamento do apelo pelo Tribunal de 2.º grau. Precedentes.

II. Situação dos autos que não configura a hipótese de deserção.

III. Paciente que empreendeu fuga mais de um ano antes da prolação da sentença condenatória, não tendo dela tomado conhecimento.

IV. Ordem que deve ser concedida para anular o acórdão impugnado, a fim de que o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais prossiga no julgamento do recurso de apelação interposto em favor do paciente.

I. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.?

(HC 46.779/MG, DJ de 13/03/2006, de minha Relatoria).

?HABEAS CORPUS. FUGA DO RÉU ANTES DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DE APELAÇÃO. DESERÇÃO.

A regra do art. 595 do CPP, que prevê a deserção do recurso de apelação caso o réu venha empreender fuga não pode ser estendida à situação pretérita à sentença, no caso em que o apelo sequer podia ser manejado.

Ordem concedida para permitir o julgamento da apelação pelo Tribunal de Justiça?.

(HC 41.551/SP, DJ de 03/10/2005, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca).

Ante o exposto, faz-se mister anular o acórdão impugnado, a fim de que o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região conheça e analise o mérito do recurso de apelação interposto pela defesa.

Determinada a anulação do aresto da Corte a quo, restam prejudicadas as demais alegações.

Diante do exposto, concedo a ordem, nos termos acima expostos.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Felix Fischer.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.