Civil. Indenização por danos morais. Alteração do valor indenizatório na instância especial. Possibilidade

EMENTA

1 – Se as instâncias ordinárias entenderam suficientes para julgamento da causa as provas constantes dos autos, não cabe a esta Corte afirmar a ocorrência de cerceamento de defesa, em face do julgamento antecipado da lide, ante o veto da súmula 7-STJ.

2 – Admite-se, na instância especial, a alteração do valor indenizatório de danos morais, para ajustá-lo aos limites do razoável, quando patente, conforme acontece in casu, a sua desmesura.

3 – Tem sido de cinqüenta salários mínimos a indenização por danos morais, resultante de situações semelhantes como a inscrição inadvertida em cadastros de inadimplentes, a devolução indevida de cheques, o protesto incabível de cambiais, etc, conforme vários julgados da Quarta Turma, a saber: Resp n.º 110.091/MG, unânime, DJU de 28.08.2000; REsp n.º 294.561/RJ, unânime, DJU de 04.02.2002; REsp n.º 232.437/SP, unânime, DJU de 04.02.2002; REsp n.º 218.241/MA, unânime, DJU de 24.09.2001; REsp n.º 332.943/SP, unânime, DJU de 17.02.2003 e REsp n.º 296.555/PB, unânime, DJU de 20.05.2002.

4 – Recurso especial conhecido em parte e, nesta extensão, provido apenas para reduzir o valor da indenização.

(STJ/DJU de 16/11/04, pág. 282)

Decidiu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quarta Turma, relator o ministro Fernando Gonçalves, que é possível a alteração do valor indenizatório na instância especial e que, segundo a jurisprudência da corte, é de 50 (cinqüenta) salários mínimos a indenização por danos morais decorrentes:

a) de inscrição indevida em cadastros de inadimplentes;

b) devolução indevida de cheques;

c) protesto incabível de cambiais.

Consta do voto do relator:

Exmo. Sr. Ministro Fernando Gonçalves (Relator): De início, quanto ao cerceamento de defesa pela não produção de provas, colhe-se do voto condutor do acórdão recorrido, verbis:

?Da análise detida dos autos ressalta que a nulidade processual suscitada pelo apelante, violação do princípio da ampla defesa e do contraditório não ocorreu. O autor, ao seu pedido, juntou provas suficientes capazes de levar o Juiz a decidir a lide.

O art. 330 do C.P.C. dispõe; verbis:

?O Juiz conhecerá diretamente o pedido proferindo sentença:

I – quando a questão de mérito for unicamente de direito ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência?.

Ora, no caso dos autos as provas acostadas eram suficientes não havendo necessidade de dilação probatória.

Demais ainda a jurisprudência assente nos Tribunais Superiores assim entende:

?Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz e não mera faculdade assim proceder?. (STJ 4.ª Turma, Resp. 2.832/RJ, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo, j. 14.8.90, negaram provimento, v.u, DJU 17.9.90, p. 9.513). No mesmo sentido RSTJ 102/500.

Diante do que rejeito a preliminar por não restar caracterizada.? (fls. 124)

Se as instâncias ordinárias, foro próprio para a apreciação de matérias fáticas, entenderam suficientes para julgamento da causa os elementos constantes dos autos, não cabe a esta Corte pronunciar-se novamente sobre o tema, sob risco de infringência ao verbete sumular n.º 7 deste Tribunal.

Nesse sentido:

?CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. BUSCA E APREENSÃO. AÇÃO DE DEPÓSITO. CONVERSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DEPOSITÁRIO INFIEL. PRISÃO CIVIL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DESTA CORTE. CERCEAMENTO DE DEFESA. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME. MATÉRIA DE PROVA. ENUNCIADO N.º 7 DA SÚMULA/STJ. RECURSO DESACOLHIDO.

I – É admissível pelo nosso direito a conversão do pedido de busca e apreensão, nos mesmos autos, em ação de depósito, se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor.

II – Segundo tem decidido a Corte Superior deste Tribunal, na linha do entendimento do Supremo Tribunal Federal, ratificado recentemente pelo seu Plenário (HC 76.561 e RE 206.482, ambos julgados em 27.5.98), e sem embargo da força dos argumentos em contrário, a prisão do depositário infiel na alienação fiduciária não vulnera a legislação federal infraconstitucional.

III – Afirmando o acórdão recorrido que restou comprovada a condição de depositário e a desnecessidade de produção de outras provas, em face do acervo probatório carreado aos autos, não há como desconstituir-se essa afirmativa sem penetrar no terreno fático, circunstância vedada em sede de recurso especial a teor do enunciado n.º 7 da Súmula/STJ.

IV –  A simples transcrição de ementas não é suficiente para caracterizar o dissídio jurisprudencial apto a ensejar a abertura da via especial, sendo necessário, para tanto, a identificação de circunstâncias que assemelham ou identificam os caso em confronto a realização do cotejo analítico entre elas.

V – Não tendo o Tribunal enfrentado a matéria discutida no especial impossível a sua análise, por falta de prequestionamento, nos termos do enunciado n.º 282 da Súmula/STF.? (REsp n.º 164.858/SP, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ de 15.03.1999)

Quanto ao valor do quantum indenizatório, foi ele fixado em 1000 salários-mínimos, em face de abalo no crédito do recorrido, ocasionado por cobrança indevida e a conseqüente inscrição do seu nome em cadastro de inadimplentes.

Em casos como o presente, esta Corte, consoante entendimento pacífico, tem admitido a alteração do valor indenizatório, para ajustá-lo aos limites do razoável, quando patente, conforme acontece in casu, a sua desmesura.

A respeito disso, em caso análogo, o voto proferido pelo Ministro Barros Monteiro, em recente pronunciamento da Quarta Turma, no Resp n.º 527414/PB (DJU 16/02/2004), verbis:

?1. Acha-se evidenciado quantum satis o dissenso pretoriano no caso em exame, pois a jurisprudência desta Corte é, hoje, assente no sentido de que o montante da indenização por dano moral se sujeita ao controle do STJ quando a quantia fixada se mostrar ínfima, de um lado, ou visivelmente exagerada, de outro. Nessa linha acham-se os Arestos paradigma colacionados pelo Banco recorrente: REsp n.º 87.719/RJ, Relator Ministro Eduardo Ribeiro, e REsp n.º 214.053/SP, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha.

2. Das circunstâncias descritas pelas instâncias ordinárias ressai o excesso havido no arbitramento da indenização relativa ao dano moral.

O autor, advogado, houvera sido assaltado, motivo pelo qual tomou as providências junto ao ?Banco do Brasil S/A?, para sustar o pagamento de dois cheques, um no importe de R$ 145,00 (cento e quarenta e cinco reais), cheque n.º 727685, outro no valor de R$ 212,20 (duzentos e doze reais e vinte centavos), cheque n.º 727733. Desses dois títulos de crédito, o último foi sustado num primeiro momento, mas, em seguida, devolvido por insuficiente provisão de fundos. Em conseqüência, o demandante perdeu o cheque especial em outra instituição financeira (Banco Sudameris) e teve o nome incluído na ?Serasa?.

O MM. Juiz de Direito fixou o montante reparatório em 100 (cem salários mínimos), correspondente, à época, a R$ 18.000,00 (dezoito mil reais) em maio de 2001, quantum este mantido pelo Tribunal a quo. Hoje equivale a R$ 24.000,00 (vinte e quatro mil reais).

Tal soma ultrapassa, em muito, o critério usualmente adotado por este órgão fracionário do Tribunal, que costuma determinar a indenização em torno da quantia equivalente a 50 salários mínimos.

Não há motivo relevante para alterar-se, aqui, o parâmetro estabelecido em hipóteses anteriormente examinadas. A despeito de tratar-se a vítima de um causídico, a verdade é que o cheque devolvido com a anotação de insuficiência de fundos consigna o valor de R$ 212,20 (duzentos e doze reais e vinte centavos) e o Banco réu, tão logo tomou conhecimento do equívoco, promoveu a exclusão do nome do demandante do cadastro de proteção ao crédito.

De sorte que, diante dos fatos e das conseqüências advindas ao autor, o seu sofrimento, a sua perturbação psicológica se apresentaram-se de reduzida monta.

É certo que a sentença registra a tentativa de acordo entre os litigantes, tendo o ora recorrido proposto a importância de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) enquanto o réu, a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

O Julgador, bem de ver, não se acha adstrito a tais valores, que, muito ao reverso, devem mostrar-se compatíveis com a intensidade da culpa; aos efeitos no psiquismo do ofendido; às repercussões do fato na comunidade; às condições pessoais e econômicas da vítima e do ofensor. Sabe-se que o quantum a ser estipulado não deve servir de enriquecimento indevido da vítima, mas constituir apenas compensação pela dor por ela sofrida. Tem ele sobretudo o escopo de desestimular o ofensor a reiterar a prática em que incorreu.

Todos esses elementos conduzem à redução do valor indenizatório à quantia de R$ 12.000,00 (doze mil reais), correspondente nesta data a 50 (cinqüenta salários mínimos).?

Tem sido, portanto, de cinqüenta salários mínimos a indenização por danos morais, resultante de situações semelhantes como a inscrição inadvertida em cadastros de inadimplentes, a devolução indevida de cheques, o protesto incabível de cambiais, etc, conforme vários julgados da Quarta Turma, a saber: Resp n.º 110.091/MG, unânime, DJU de 28.08.2000; REsp n.º 294.561/RJ,unânime, DJU de 04.02.2002; REsp n.º 232.437/SP, unânime, DJU de 04.02.2002; REsp n.º 218.241/MA, unânime, DJU de 24.09.2001; REsp n.º 332.943/SP, unânime, DJU de 17.02.2003 e REsp n.º 296.555/PB, unânime, DJU de 20.05.2002.

Ante o exposto, conheço em parte do recurso e, nesta extensão, lhe dou provimento apenas para reduzir o montante da indenização a 50 salários mínimos.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Aldir Passarinho Júnior, Jorge Scartezzini, Barros Monteiro e César Asfor Rocha.

Ronaldo Botelho é advogado e professor da Escola da Magistratura.