Civil. Casamento realizado no estrangeiro. Matrimônio subseqüente no País, sem prévio divórcio. Anulação

RECURSO ESPECIAL N.º 280.197 ? RJ

REL.: MIN. ARI PARGENDLER

EMENTA ? O casamento realizado no estrangeiro é válido no País, tenha ou não sido aqui registrado, e por isso impede novo matrimônio, salvo se desfeito o anterior. Recurso especial não-conhecido”.

(STJ/DJU de 05/08/02, pág. 328).

Decidiu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, relator o ministro Ari Pargendler, que, estando em vigor o casamento realizado no estrangeiro, é nulo novo matrimônio celebrado no Brasil, ainda que aqui não registrada a primeira união, pois não é a averbação ou a transcrição do ato das primeiras núpcias no cartório brasileiro de registro civil das pessoas naturais que vai dar validade ou existência a ele.

Consta do voto do relator:

Exm.º Sr. ministro Ari Pargendler (relator):

Os autos dão conta de que José Eduardo Amaral de Sá propôs ação de anulação de casamento contra Elisabete Saad (fl. 02/10).

A MM. juíza de Direito Dr.ª Vera Maria Soares da Silva julgou improcedente a ação (fl. 181/183).

A sentença foi reformada pelo Tribunal a quo, cujo voto condutor assim dispôs.

“Em 19/03/1966, Elisabete Saad, brasileira, solteira, se casou com Plínio Barbarino, italiano, divorciado, em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, como se nota de fls. 19/21.

Em 29/9/1994, a mesma Elisabete Saad, dizendo-se solteira, veio a se casar com José Eduardo Amaral de Sá, divorciado, no Rio de Janeiro, no Brasil, de acordo com fls. 13.

O segundo varão propôs uma ação com fulcro nos artigos 183, inciso VI e 207 do Código Civil, como se observa de fls. 2, que é de prosperar.

A mulher havia se casado na Bolívia, um ato jurídico perfeito e acabado.

Quando voltou a se casar no Brasil, praticou um ato nulo.

A mulher estava casada na Bolívia quando praticou o ato de fls. 13.

Não era a averbação desse ato no cartório do Registro Civil das Pessoas Naturais no Brasil que iria completar ou consumar esse casamento.

A averbação ou transcrição no cartório do Registro Civil deste País tem o propósito de dar publicidade a terceiros, pelo efeito que daí possa advir no mundo das relações jurídicas do cônjuge brasileiro.

Não significa que só então o ato do casamento passe a ter validade ou existência.

Casando-se novamente a mulher, quando ainda estava em vigor o seu primeiro casamento, o segundo é nulo” (fl. 256/257).

Seguiu-se recurso especial, interposto por Elisabete Saad, com base no artigo 105, inciso III, letras “a” e “c”, da Constituição Federal, por violação ao artigo 32, § 1.º, da Lei de Intodução ao Código Civil e artigo 32, § 1.º, da Lei n.º 6.015, de 1973, bem como divergência jurisprudencial

(fl. 263/276).

Sem razão.

Artigo 6.º § 1.º, da LICC

Inexiste violação ao citado dispositivo legal, pois quando o acórdão recorrido afirmou que “A mulher havia se casado na Bolívia, num ato jurídico perfeito e acabado” (fl. 257) foi no sentido de que o casamento de brasileira com estrangeiro divorciado, realizado no exterior, é válido em independe de homologação do divórcio do estrangeiro no Brasil.

Artigo 32, § 1.º, da Lei n.º 6.015, de 1973).

Não houve violação a essa norma legal. Como está disposto na obra de Jacob Dolinger, “não foi intenção do legislador obrigar o registro; sua necessidade só ocorre para efeito, de provar o casamento celebrado no exterior, mas o reconhecimento de sua validade no Brasil se dá independentemente do registro local” (Direito Civil Internacional, volume I: a família no direito internacional privado ? Rio de Janeiro: Renovar, 1997, pág. 49).

Divergência jurisprudencial

O dissídio jurisprudencial deixou de ser comprovado, pois as hipóteses fáticas dos acórdãos paradigmas tratam de situação diversa da exposta nos autos.

Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Castro Filho e Antônio de Pádua Ribeiro.

 

Recurso Especial. Divergência Jurisprudencial. Indicação de Paradigma através do Diário da Justiça da União e do site do Superior Tribunal de Justiça na internet. Admissibilidade.

“RECURSO ESPECIAL N.º 327/687-SP

REL.: MIN. RUY ROSADO DE AGUIAR

EMENTA: Indicado como paradigma acórdão do próprio STJ, com referência do Diário da Justiça da União, órgão de publicação oficial, e com a reprodução do inteiro teor divulgado na página que o STJ mantém na internet, tem-se por formalmente satisfeita a exigência de indicação da fonte do acórdão que serve para caracterizar o dissídio.”

(STJ/DJU de 15/4/02)

É conhecido o rigor com que as instâncias extraordinárias tratam o dissídio jurisprudencial como fundamento dos recursos, exigindo que o aresto paradigma conste dos repertórios autorizados e, ainda, que a divergência seja demonstrada através de confronto analítico, não bastando a simples referência e ementas ou a trechos dos acórdãos.

Felizmente, a presente decisão representa uma atenuação em parte, desse rigor ao admitir que o dissídio possa ser demonstrado com paradigma extraído do Diário da Justiça da União (ementa), acompanhado da transcrição na íntegra obtida através da página que o Superior Tribunal de Justiça mantém na internet.

Quando a esse aspecto, consta do voto do relator, ministro Ruy Rosado de Aguiar, da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça:

O ministro Ruy Rosado de Aguiar (relator):

1. A primeira questão diz com a admissibilidade do recurso especial fundado na divergência quando indicados como fonte o Diário Oficial e o site do STJ na internet.

Tratando-se de acórdão paradigma deste Tribunal, tendo por suficiente a referência à publicação no Diário da Justiça da União, que é a via oficial de divulgação e de registro dos atos do Tribunal, de acesso a todos quantos atuam em Juízo.

De outro lado, o acórdão publicado na página que o STJ mantém na internet, embora não possa servir à intimação das partes nem de título para a sua execução, não tendo por isso, efeitos processuais, pode ser usado para a demonstração da divergência, porquanto se trata de texto elaborado e divulgado pelo próprio Tribunal. Sendo aquela fonte acessível pela parte adversa e pelos juízes que julgarão o recurso fundado no precedente, qualquer dúvida sobre o seu conteúdo seria facilmente conferida.

Posto isso, aceito a demonstração da divergência.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Aldir Passarinho Júnior, Barros Monteiro e César Asfor Rocha.

Ronaldo Botelho

é advogado e professor da Escola da Magistratura.