Ação Civil Pública. Queda de qualidade nos serviços de operadora de televisão. Interesse individual homogêneo. Legitimidade ativa do Ministério Público.

RECURSO ESPECIAL N.º 547.170/SP

Rel.: Min. Castro Filho

EMENTA

I – É comportável ação civil pública com o objetivo de proteger consumidores de eventual queda na qualidade de serviço prestado por operadora de televisão por assinatura, o que confere legitimidade ativa ao Ministério Público, conforme o disposto na Constituição Federal, no Código de Defesa do Consumidor e na Lei 7.347/85.

II – É de ser negado conhecimento ao recurso fundado na alínea “c” do permissivo constitucional, quando não demonstrada a existência do propalado dissídio.

Com ressalvas quanto à terminologia, não conheço do recurso.

(STJ/DJU de 10/2/04, pág. 253)

Reconheceu o Superior Tribunal de Justiça, através de sua Terceira Turma, relator o ministro Castro Filho, que o Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em favor de assinantes de TV por assinatura, em razão de deficiência na prestação dos serviços para resguardar os interesses coletivos dos consumidores (interesse individual homogêneo).

Consta do voto do relator:

O Exmo. Sr. Ministro Castro Filho (Relator): Conforme relatado, tratam os autos da legitimidade do Ministério Público para propor ação civil pública.

Sobre o tema, esta Terceira Turma já decidiu, no julgamento do Recurso Especial n.º 308.486/MG, DJ de 02/09/2002, REVFOR vol.:367 pg.:241, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, nos mesmos moldes do acórdão recorrido. Consignou a ementa do referido julgado, verbis:

” CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TELEVISÃO POR ASSINATURA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DISSÍDIO. PRECEDENTES DA CORTE.

1. O Ministério Público está legitimado pelo Código de Defesa do Consumidor para ajuizar defesa coletiva quando se tratar de interesses ou direitos individuais homogêneos.

2. A televisão por assinatura tem hoje importante presença como instrumento de lazer, contribuindo para a qualidade de vida dos cidadãos, e alcançando significativas parcelas da população, não estando confinada aos estratos mais abastados.

3. Há, entre os assinantes, direito individual homogêneo, decorrente de origem comum, que autoriza a intervenção do Ministério Público.

4. Recurso especial não-conhecido.”

Merecem transcritas as ponderações feitas pelo eminente ministro relator no precedente supracitado:

” Como assinalei em outra ocasião (REsp n.º 72.994-SP, DJ de 17/9/01), o Código de Defesa do Consumidor, expressamente, estabeleceu a definição legal dos direitos individuais homogêneos, ou seja, ‘os decorrentes de origem comum’, e, igualmente, no art. 82 conferiu a legitimação ativa ao Ministério Público para a defesa coletiva quando se tratar de interesses ou direitos individuais homogêneos. Ora, o argumento apresentado pela empresa recorrente, no sentido de que a atividade que desempenha não se reveste de relevância social, não tem força para desqualificar a legitimação ativa do Ministério Público considerando que, sem dúvida, há, no caso, direitos individuais homogêneos de consumidores de serviços de televisão por assinatura, pouco importando o universo de pessoas alcançado, sendo certo que, como está no especial, dispõe a recorrente de 22.000 assinantes, correspondendo a 5% da população de Uberlândia. De igual modo, o fato de ter nascido a ação da impugnação manifestada por cinco assinantes, na minha compreensão, não tem força para afastar a legitimidade do Ministério Público. O fato é que o direito é individual homogêneo, nos termos da lei especial, o que basta para justificar a iniciativa. Mas, além disso, a televisão a cabo, por assinatura, com o número de assinantes alto, hoje com significativa presença na vida dos cidadãos, não confinada aos de classe mais abastada, tem repercussão suficiente, como instrumento de lazer social, e, portanto, ligada à qualidade de vida, para autorizar a intervenção do Ministério Público. Não enxergo, assim, a passagem do recurso pela alínea “a” do permissivo constitucional.” – grifo nosso.

Na esteira desse entendimento, não vislumbro a existência de violação legal.

Por outro lado, é também inadmissível o recurso especial pelo alegado dissídio jurisprudencial, em virtude da não obediência ao parágrafo único do artigo 541 do Código de Processo Civil e aos §§ 1.º e 2.º do artigo 255 do Regimento Interno desta egrégia Corte.

O recorrente limitou-se a transcrever trechos de julgados, sem demonstrar as similitudes fáticas e divergências decisórias. Ausente, portanto, o necessário cotejo analítico entre as teses adotadas no acórdão recorrido e nos paradigmas colacionados.

Deixou também de proceder à juntada de cópia autenticada dos arestos, e até mesmo de citar os repertórios de jurisprudência, oficiais ou credenciados, nos quais publicados, sendo certa, ainda, a ausência de similitude entre as bases fáticas dos precedentes trazidos a confronto.

À vista do exposto, ainda atento à terminologia adotada por esta Corte, não conheço do recurso.

É como voto.

Decisão unânime, votando com o relator os ministros Humberto Gomes de Barros, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi.

Processual penal. Recursos criminais. Prazos contínuos e peremptórios que não são interrompidos pelas férias forenses – CPP, art. 798.

RECURSO ESPECIAL N.º 511.100/PR

REL.: MIN. LAURITA VAZ

EMENTA

1. A despeito de ter havido inicialmente alguma vacilação na jurisprudência, e bastante controvérsia, ainda hoje, na doutrina, o entendimento predominante nesta Corte aponta no sentido de que a regra insculpida no art. 798 do CPP subsiste, isto é, os prazos para a interposição de recursos criminais são fatais: contínuos e peremptórios, não sendo interrompidos ou suspensos por férias, domingos ou feriados, ressalvadas as excepcionalidades previstas no próprio dispositivo legal em comento, ou, ainda, obviamente, no caso de o respectivo Tribunal, no período de recesso, não ter disponível o serviço de protocolo geral.

2. Nesse contexto, mostra-se escorreita a decisão recorrida ao declarar a intempestividade dos embargos infringentes, opostos após o transcurso do decêndio legal, considerando o disposto no art. 798 do CPP.

3. Recurso especial não conhecido.

(STJ/DJU De 10/5/04, pág. 330)

Para que as partes não sejam surpreendidas, é conveniente observar esta decisão do Superior Tribunal de Justiça, através de sua Quinta Turma, relatora a ministra Laurita Vaz, no sentido de que os prazos recursais no processo penal são regidos pela norma constante do art. 798 do Código de Processo Penal, não sofrendo interrupção ou suspensão com o advento das férias forenses.

Consta do voto do relator:

Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz (Relatora):

A questão posta em debate se resume em saber se no processo penal os prazos se suspendem no transcurso das férias forenses, considerando o advento da Lei Complementar n.º 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN), que dispõe:

“Art. 68. Durante as férias coletivas, nos tribunais onde não houver Turma ou Câmara de férias, poderá o presidente, ou seu substituto legal, decidir de pedidos de liminar em mandado de segurança, determinar liberdade provisória ou sustação de ordem de prisão, e demais medidas que reclamem urgência.”

A despeito de ter havido inicialmente alguma vacilação na jurisprudência, e bastante controvérsia, ainda hoje, na doutrina, o entendimento predominante nesta Corte aponta no sentido de que a regra insculpida no art. 798 do Código de Processo Penal subsiste, isto é, os prazos para a interposição de recursos criminais são fatais: contínuos e peremptórios, não sendo interrompidos ou suspensos por férias, domingos ou feriados, ressalvadas as excepcionalidades previstas no próprio dispositivo legal em comento, ou, ainda, obviamente, no caso de o respectivo Tribunal, no período de recesso, não ter disponível o serviço de protocolo geral.

Eis o que dispõe a lei processual penal, in verbis:

“Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.

§ 1.º Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento.

§ 2.º A terminação dos prazos será certificada nos autos pelo escrivão; será, porém, considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do dia em que começou a correr.

§ 3.º O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato.

§ 4.º Não correrão os prazos, se houver impedimento do juiz, força maior, ou obstáculo judicial oposto pela parte contrária.

§ 5.º Salvo os casos expressos, os prazos correrão:

a) da intimação;

b) da audiência ou sessão em que for proferida a decisão, se a ela estiver presente a parte;

c) do dia em que a parte manifestar nos autos ciência inequívoca da sentença ou despacho.”

Com efeito, o entendimento contrário, ao que consta, único, consignado por esta Eg. Quinta Turma, no julgamento do HC n.º 15.791/RJ, relatado pelo eminente Ministro Jorge Scartezzini, se contrapõe a inúmeras outras decisões, colegiadas e monocráticas, proferidas por este Tribunal. Merece ainda destaque o fato de que, na hipótese daqueles autos, o argumento principal a justificar a devolução do prazo recursal foi justamente o não-funcionamento do Protocolo Geral, já que, por óbvio, no caso, “não poderia a defesa interpor o devido recurso durante o recesso”, conforme ressaltou o relator.

Confira-se, a propósito, a jurisprudência desta Egrégia Corte:

“HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO INTEMPESTIVO. NÃO RECEBIMENTO.

A teor do art. 798, caput, do CPP, no processo penal os prazos são contínuos e peremptórios, não se interrompendo pela superveniência de férias, domingos ou feriados.

Ordem denegada.” (HC 15.137/PE, 5.ª Turma, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJ de 02/04/2001.)

“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO INTEMPESTIVO. PROCESSO PENAL. PRAZO. FÉRIAS FORENSES. FLUÊNCIA. ART. 798 DO CPP.

1 – Consoante entendimento desta Corte, nos termos do art. 798 do Código de Processo Penal, o prazo para interposição de recursos criminais flui normalmente no período de recesso e férias forenses.

2 – Agravo regimental improvido.” (AgRg 456.948/RJ, 6.ª Turma, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ de 02/12/2002).

“CRIMINAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECONSIDERAÇÃO. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. FLUÊNCIA DO PRAZO DURANTE AS FÉRIAS FORENSES. AGRAVO DESPROVIDO.

[…]

I. As férias forenses não suspendem a contagem do prazo recursal em matéria penal – que é contínuo e peremptório, não se interrompendo nas férias, domingos e feriados.

II. Intempestivo o RESP, não há como prosperar o agravo de instrumento.

Agravo regimental desprovido.” (AgRg 421.569/PR, 5.ª Turma, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 16/09/2002.)

“PROCESSUAL PENAL. RECURSO DE HABEAS CORPUS. PRAZO. FÉRIAS FORENSES.

O prazo para a interposição do recurso de habeas corpus e de cinco dias (art. 30 da lei 8.038/90), e não e suspenso nas férias forenses.

Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

Recurso de habeas corpus não conhecido.” (RHC 5.218/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. ASSIS TOLEDO, DJ de 01/04/1996.)

No mesmo sentido, dentre outras, as seguintes decisões monocráticas: AG 535.525/SC, Rel. Min. Felix Fischer, DJ de 03/12/2003; AG 482.791/GO, Rel. Min. Paulo Medina, 05/06/2003; RE no Resp 276.009/PR, Min. Vice-Presidente Edson Vidigal, DJ de 01/08/2003.

Nesse contexto, mostra-se escorreita a decisão recorrida ao declarar a intempestividade dos embargos infringentes. Eis o teor da decisão vergastada:

“A publicação do acórdão que negou provimento ao apelo dos ora agravantes ocorreu em 10/07/02 (fl. 343), ou seja, durante as férias dos juízes integrantes desta Corte. Nesse período há expediente forense, o Tribunal permanece funcionando, inclusive julgando feitos na Turma Especial, outrora denominada Turma de Férias.

É de se salientar que o art. 79 do Regimento Interno do TRF da 4.ª Região, ao contrário do que afirmam os Recorrentes, é plenamente válido, encontrando-se em plena consonância com o caput do art. 798 do CPP, o qual dispõe que Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingos e feriados.

[…]

Os agravantes foram intimados pelo DJ em 10/07/02 (fl. 343), tendo início em 11/07/2002 o prazo para a interposição do recurso. Desse modo o último dia para a entrega da peça recursal era 22/07/02. Tendo a mesma sido protocolada em 12/08/02, não há como deixar de reconhecer a sua intempestividade.

Em face do exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo regimental.” (fls. 378/379)

Ante o exposto, estando o acórdão recorrido em perfeita consonância com o entendimento desta Corte, NÃO CONHEÇO do recurso especial.

É o voto.

Decisão unânime, votando como relator os ministros Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini.

Ronaldo Botelho

é advogado e professor da Escola da Magistratura.