Volta ao mundo de táxi

Na semana do Carnaval deu para fazer um teste atualizado com a desesperadora falta de táxis em Curitiba. Com a cidade em marcha lenta e ainda por cima chovendo três dias sem parar, os bares e restaurantes sentiram no caixa os rigores da tolerância zero com o álcool: das seis às nove da noite, quem pretendesse tomar um vinho com a namorada (ou amante) não conseguia um táxi.

Como alternativa, das duas, uma: sem chuva, sobra tempo para ler esta Tribuna de cabo a rabo. Com chuva, seria aconselhável a leitura das 403 páginas do livro “Diários mínimos”, de Umberto Eco. Nesta coletânea de crônicas, o escritor italiano faz uma deliciosa caricatura do taxista nas principais cidades do mundo.

******

“O motorista de táxi é um indivíduo que passa o dia inteiro dirigindo no tráfico das cidades – em conflito direto com outros motoristas humanos. Por consequência, é nervoso e odeia as criaturas antropomorfas. Isto pode induzir o “radical chique” a dizer que todos os motoristas são fascistas. Não é verdade, o motorista de táxi não se interessa por problemas ideológicos: odeia as manifestações sindicais não por sua coloração política, mas porque engarrafam o trânsito. O motorista de táxi só deseja um governo forte que leve ao paredão todos os motoristas particulares e estabeleça um toque de recolher razoável entre as seis da manhã e a meia-noite”.

*******

“O motorista de táxi italiano é dividido em três categorias. O que exprime suas opiniões ao longo de todo o trajeto; o que não fala nada, contraído, e só comunica sua misantropia através da forma de dirigir; e o que, se contasse suas histórias num bar, faria o dono do estabelecimento mandar embora o narrador, dizendo que já é hora de ir para a cama”.

******

“Em Nova York, não há como chamar um táxi por telefone, a menos que se pertença a algum clube. Já em Paris é possível. Só que o táxi não atende ao chamado. Em Estocolmo, o único meio de se pegar um táxi é pelo telefone, porque não vão confiar em qualquer um que encontrem pela rua. Mas para ficar sabendo do número do telefone você precisa pegar um táxi que esteja passando pela rua, e eles, como eu já disse, não confiam nos passageiros a pé”.

******

“Se colocarmos em disputa um motorista de táxi de Frankfurt ao volante de um Porsche e um motorista do Rio pilotando um Volkswagen caindo aos pedaços, o motorista do Rio vai chegar primeiro, por que não para nos sinais vermelhos. Se parasse, seria abalroado por outro Volkswagen caindo aos pedaços, pilotado por rapazinhos que, além do mais, ainda esticam a mão para fora da janela e tiram o seu relógio do pulso”.

******

Umberto Eco não se refere aos taxistas de Curitiba, embora já conheça a cidade de outros carnavais. Mas nunca pegou um táxi em dias de chuva.