Vinho com churros

A Guerra Cisplatina, entre Brasil e Argentina, começou com uma discussão besta. O gaudério do lado argentino teimava que o melhor vinho era aquele do fundo da garrafa, enquanto o gaudério do lado brasileiro insistia que vinho era aquele do topo da garrafa. “Pero que si, pero que no”, os dois foram para os tapas, e daí para uma guerra sem fronteiras bastou entrar a turma do deixa disso.

O conflito fronteiriço foi de1825 a 1828, mas não é de hoje que os enochatos estão a provocar guerras entre si e nós outros inocentes bebedores de vinho de mesa. Nas degustações de vinho, o nariz funciona assim: se o barbudo à esquerda murmura “ótimo nariz” (o vinho tem um bom aroma), é bem provável que as outras pessoas concordem com ele. Se as anotações forem feitas de maneira independente, no entanto, sem discussões, muitas vezes veremos que o barbudo escreveu “ótimo nariz”, o camarada de cabeça raspada rabiscou “não tem nariz nenhum” e a loira falsa escreveu, “nariz interessante com camadas de salsa e couro recém-curtido com tanino”.

Pois foi essa questão de nariz que provocou uma pancadaria entre argentinos e brasileiros, quando o gringo pedante perguntou:

– Degustar es perceber la plenitud del viño. Degustar es una especie de analise sensorial, impregnada de aspectos subjetivos y afectivos, de bueno gusto. Por esto lo pregunto: qual es lo mejor viño para harmonizar con los churros?
– Vinho com churros? – perguntou o espantado brasileiro.
– Si! Viño con churros!
Para o brasileiro, diante de tamanha aberração, para o açucarado do churros só cabia um vinho tão doce quanto, e chutou:
– Para beber com churros, só mesmo um bom vinho de Santa Felicidade!
O argentino cuspiu na calçada.
– Es un boludo! Es un pasmado! Un ignorante!
E assim começou a guerra do vinho com churros entre o Brasil e Argentina.
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Dante Mendonça está de férias. Vale a pena ler de novo suas crônicas.