Velhas chuvas de verão

O notável escritor paranaense Temístocles Linhares era um praieiro apaixonado. Das areias escaldantes de Copacabana às águas geladas de Punta del Este, o curitibano da cepa curtia com água do mar a pele que o fazia dos mais respeitados e temidos intelectuais brasileiros. Temístocles morreu na praia de Punta del Este, como bem merecia. Das suas tantas obras, a Imprensa Oficial do Paraná editou o “Diário de um Crítico”. De 1957 a 1963, suas memórias em três volumes. 

Em 1959, por exemplo, Temístocles Linhares esteve em Ubatuba e não encontrou muitas mudanças naquela temporada de verão: “O hotel é o mesmo, com pequenas melhorias. Ao contrário de outras praias sulinas, esta não cresceu muito nestes dois anos. Até o tempo parece ser o mesmo, pois não esqueço a temporada de chuvas aqui passada. Ontem tomamos à tarde o primeiro banho de mar, mas hoje já amanheceu chovendo. Todos se mostram apreensivos, o hoteleiro procurando animar os hóspedes com previsões otimistas. Eu, porém, não creio nele, sentindo a sua esperteza e a sua missão caritativa de dar esperanças aos menos conformados com os desígnios da natureza”.

Em 1960, Temístocles Linhares foi para Balneário Camboriú, onde naquela época se podia esbarrar com o ex-presidente Jango Goulart caminhando na praia deserta: “Desde ontem aqui, nesta bela praia catarinense, que visito pela quarta vez, em companhia da família. Confortavelmente instalado em meu hotel, desta vez o Fischer, situado num dos extremos da enseada, fico longe da multidão que se aglomera no centro. Ainda não pude descansar quanto desejava, pois várias providências tive de tomar em relação ao meu Dodge, que sofreu bastante na viagem, em virtude das péssimas condições em que se achavam as estradas deste Estado em consequência do mau tempo. Foram quinze ou vinte dias de chuvas consecutivas que as arruinaram completamente. Nunca vi tanto buraco na minha vida. O carro, contudo, se portou airosamente. Venci os duzentos e tantos quilômetros que nos separam de Curitiba sem nenhum desarranjo. Mas aqui verifiquei os resultados: o carro com falta de alguns parafusos e porcas, cujo problema não consegui resolver na oficina local. Apesar disso, vi o sol em todo o seu esplendor a se derramar pela praia inteira, coisa que sempre agrada à gente, depois de vê-lo tão arredio e arisco, como sucedeu nestes últimos vinte dias de céu cinzento e carregado de nuvens”.

Em suas temporadas de mar e sol, Temístocles Linhares pegou muitas chuvas. Mas não chuvas como agora, quando as chuvas de verão se transformaram em tragédias anunciadas e nunca prevenidas pelas autoridades incompetentes de sempre.