Com um abraço solidário aos bravos amigos de União da Vitória

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Antes de atravessar os trilhos que dividem para fins cartográficos União da Vitória (PR) e Porto União (SC), as cidades gêmeas, é preciso ouvir com atenção as histórias que contam nos pesqueiros das barrancas do rio Iguaçu. Das tantas, uma delas é o “causo” de um visitante de primeira viagem que partiu de São Paulo, pelos trilhos da Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande, para comprar madeira em União da Vitória.

E lá veio o trem, passa boi, passa boiada, atravessou os pinheirais forrados de erva-mate e, enfim, chegou à antiga estação ferroviária. Dizem os antigos que o forasteiro desceu do trem e, desavisado daquele composto urbano, só teve tempo para ler numa placa o nome da cidade em que pisava:

–Porto União.

O passageiro com destino a União da Vitória, imediatamente, comprou uma passagem e retornou a São Paulo.

Dizem que uma estrada de ferro separa os dois municípios, fazendo divisa com o Paraná e Santa Catarina. Só mesmo colando um pé lá e outro cá é que se descobre que nada os separa, tudo os une: a cultura, os costumes, a linguagem, a camaradagem e, principalmente, o rio Iguaçu.

Para melhor desenhar a paisagem que cerca União da Vitória e Porto União, é preciso buscar no fundo do baú a genérica narrativa do viajante Visconde de Taunay:

“Com efeito, dali se descortina o pitoresco e alongado vale em que majestoso corre o Iguaçu, cercado por densa orla de vegetação. E por toda a parte, lindas quebradas, inúmeros capões de mato a salpicarem de pontos sombrios a imensa, interminável alfombra verde do prado”.

Hoje a paisagem já não é a mesma, por força da natureza do homem. Igualmente, é outra a saúde das águas, porque ali deságuam todas as mazelas das nascentes de Curitiba (mazelas políticas, inclusive). Assim mesmo, a natureza que envolve aquele braço do rio é, justamente, um orgulho para quem vive nas cidades gêmeas. Se Curitiba da falta do mar se ressente, Porto União e União da Vitória fazem daquele alargado remanso do Iguaçu o seu próprio balneário: nos dias de verão, os esportes náuticos são tão praticados quanto em Guaratuba. Nos dias nem tão quentes, mesmo no úmido inverno, o vale é um pesqueiro generoso agregado a mais de 80 cachoeiras. Somadas, a qualidade de vida naquela curva fechada do rio Iguaçu é de causar inveja. Em União da Vitória, 94,3% da população habitam a área urbana, enquanto em Porto União 30% vivem no campo. Com 97% da população alfabetizada e várias faculdades (que atraem estudantes das regiões sul e sudoeste do Paraná e do norte de Santa Catarina), em União da Vitória e Porto União o doutorado em gastronomia se faz no restaurante Porto Grill, com aulas do chef Luiz Sérgio Buch. Junto a um mirante, o belo avarandado panorâmico abraça o rio Iguaçu e o almoço aos sábados resume as etnias das cidades gêmeas: feijoada completa, delícias mineiras, italianas, polacas, árabes e, como se não bastasse, a comida alemã só igual em Blumenau.

Não exagera o viajante que volta das margens do rio Iguaçu levitando. A 15 quilômetros, está instalado um Instituto Aeroespacial, similar a uma outra estação de vigilância do espaço localizada no Hemisfério Norte. Isso porque a região possui a Anomalia Magnética do Atlântico Sul (South Atlantic Anomaly), falha na atmosfera que interfere nos satélites e espaçonaves, expostos durante vários minutos às fortes radiações que ali existem. O Hubble Space Telescope não faz observações enquanto está passando pelas cidades irmãs.

Assim sendo, quem, entra naquele cenário da Guerra do Contestado não sai andando. Por força de um buraco no céu, levita. É ver para crer: na mais bonita curva do rio Iguaçu, o umbigo do Hemisfério Sul.

(Do meu livro “Serra Abaixo, Serra Acima – O Paraná de trás pra frente”)

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