Terrível coincidência

Neste trágico final de semana, muito acima do Pico da Marumbi, do alto de uma nuvem com vista para o outro lado do mundo, o cartunista Claudio Seto chorava duas vezes.

Coautor do livro “Ayumi (Caminhos Percorridos) Memorial da Imigração Japonesa – Curitiba e Litoral do Paraná”, com Maria Helena Uieda, o cartunista e artista plástico Seto pranteava uma terrível coincidência: no mesmo momento em que o terremoto seguido de tsunami devastava parte do Japão, no litoral do Paraná as águas de março desceram serra abaixo para levar de arrasto o verde de Cacatu, berço em 1917 da primeira colonização japonesa do Paraná.

Localizado em Antonina, Seto e Maria Helena ressaltam que o núcleo de Cacatu teve uma característica diferente: não foi uma imigração. “O que houve foi uma migração, pois os japoneses vieram para cá por suas próprias pernas, deixando para trás experiências difíceis nas fazendas de café, buscando oportunidades melhores e mais autônomas”. Cacatu recebeu no litoral paranaense o primeiro grupo de japoneses proprietários de terras no estado: “Ao contrário do que muitos pensam, os primeiro japoneses se estabeleceram em torno de Curitiba e não no norte do estado, apesar da atual concentração de nikkeis em cidades como Londrina e Maringá”, contam Seto e Maria Helena.

Na Colônia Cacatu pela primeira vez os imigrantes japoneses se tornaram proprietários de terras no Paraná. Atraídos para Antonina e Morretes pelo sonho de cultivar arroz em terras próprias, o plano inicial acabou não dando retorno. Se dedicaram então para o cultivo de cana-de-açúcar e, por consequência, para a produção de cachaça artesanal. Donde podemos nos ufanar que a nossa cachaça de Morretes não é “Made in Japan”, mas é tão boa quanto o melhor dos saquês.

Em 1942, o projeto de colonização japonesa no litoral foi interrompido pela guerra. Considerados inimigos da pátria, japoneses, alemães e italianos e suas famílias foram removidos do litoral para o interior.

Esta página negra da nossa história não foi a primeira no capítulo da formação dos paranaenses: formadores de opinião manifestavam-se totalmente contrários à vinda de japoneses para o estado e o governo jamais apoiou qualquer tentativa de sua imigração. Nas publicações da época, a intolerância nativa destacava a imagem de trabalhadores árduos dos japoneses, capazes de suportar privações e se sujeitar a salários abaixo da média, como seu grande defeito: “Eles diziam que por estas razões o japonês era um competidor injusto para os outros grupos imigratórios”, escondendo que a imigrações em massa de europeus brancos fazia parte de um projeto de “clareamento” da morena população brasileira. A “raça ridiculamente inferior dos japoneses” não cabia neste plano.

Claudio Seto chora duas vezes e suas duplas lágrimas devem estar caindo sobre a Chácara Ito, em Cacatu, local onde a colônia japonesa pretende construir uma Jinja, templo japonês de caráter ecumênico. Tão ecumênico quanto era o nosso querido Claudio Seto.