Supremo caso de polícia

O ministro mais antigo do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, vai decidir na quarta-feira o recurso que garante um novo julgamento para 12 dos 25 condenados pelo mensalão. Conforme o seu voto, no dia seguinte os editores de jornais, no lugar do cronista político, devem mandar um outro profissional para cobrir os acontecimentos: o “carrapicho”.

“Carrapicho” é o repórter policial que não desgruda da polícia, sempre na pista de uma manchete. Da editoria política para a polícia, uma letra a mais, uma a menos, não vai fazer falta, porque estes novos tempos transformaram a política num escabroso caso de polícia. Em consequência, os casos policiais são tratados como fatos políticos.

Nos tempos barulhentos da máquina de escrever, quando as redações de jornais recendiam a álcool e cigarro, o falecido Rafles era um autêntico “carrapicho”: não tirava o olho do delegado e da garrafa no outro lado da rua. No extinto Correio do Paraná, o jornalista Renato Muniz Ribas era o chefe de redação. Certa feita, Renatão chamou o seu principal “carrapicho” para uma conversa “no particular”:

– Rafles, você é um grande repórter, todos nós aqui gostamos de você, mas, por favor, controle a bebida ou não vou mais controlar a situação.

Rafles não controlou a bebida, muito menos Renato Ribas controlou a situação. “Carrapicho” de bom texto, Rafles não ficou sem emprego. Foi convidado por Jorge Narozniak para trabalhar no Diário do Paraná, com a condição de controlar a malvada. E por uns meses ele controlou. Até que um dia o “carrapicho” desgrudou do prumo.

– Narozniak, vou ali no Bar do Luiz tomar umazinha para firmar o pulso e já volto. Juro, só umazinha.

Rafles foi e Narozniak ficou. Ficou esperando o Rafles. Sem o “carrapicho”, sem a reportagem e com o jornal quase na rotativa, o desolado editor telefonou para o Correio do Paraná.

– Renatão, me ajuda! Estou aqui com a manchete da página policial pendurada. O Rafles saiu para tomar um trago e até agora não apareceu.

– O Rafles? Então foi isso… Ele entrou aqui na redação, sentou e ficou escrevendo por bem duas horas. Levantou, passou na minha mesa e deixou uma matéria prontinha. Assim como entrou, saiu: sem cumprimentar ninguém.

A bem da verdade, Rafles cumpriu as recomendações de Narozniak. Foi no Bar do Luiz, tomou um trago e voltou ligeiro para a redação. Só que para a redação errada.

Nesses tempos estranhos, os repórteres policiais estão trabalhando no lugar errado. Deviam estar cobrindo o Supremo Tribunal Federal.