Simpósio do Barreado (3)

O Barreado nasceu em Morretes, Antonina ou Paranaguá? Para tentar resolver esse entrevero foi realizado em Porto de Cima, o 1.º Simpósio da Origem do Barreado. Na terceira rodada de conversações, a entrada do tomate na receita
tradicional provocou azia generalizada.

– “Questão de ordem, presidente! (interpelou a jornalista Rosy de Sá Cardoso) Uma questão de ordem histórica: o tomate no Barreado é uma heresia!”

Silêncio no recinto. Alexandre Dumas, autor do Grande Dicionário da Culinária, editado em 1870, se manifestou conforme o prometido:

– “Rosy em bom momento levantou a questão de ordem histórica. Apesar ser originário da América Central e do Sul, o lycopersicun esculentum não pode estar nas origens do Barreado: somente no século XIX é que o tomate passou a ser consumido e cultivado na Itália, depois na França e na Espanha. Inicialmente o tomate era tido como venenoso pelos europeus e cultivado apenas para efeitos ornamentais”.

– “No Barreado, o tomate é veneno! (disparou a jornalista) Só foi incorporado à receita depois das invasões bárbaras, no final do século XX. Atualmente alguns puristas já o admitem, conquanto depois de abrir a panela, e conforme o mau gosto de cada um”.

– “Prosseguindo, ma chérie…”

– “Pois não, caro Alexandre!Nova York só foi descobrir que não tinha um restaurante decente em 1825. Nessa época, o suíço e mercador de vinho Giovanni Delmonico juntou suas economias e se estabeleceu em Manhattan. Ele foi o primeiro a reagir a essa espantosa falta de restaurantes, mas de acordo com outros relatos, ele estava simplesmente se antecipando ao crescimento e à excelente oportunidade que surgia. Voltou para a Suíça para buscar seu irmão mais velho, Pietro, um pasteleiro de sucesso em Berna.

Como um era negociante de vinhos e o outro pasteleiro, eles abriram um café num prédio de dois andares de tijolos (no número 23 da William Street) e deram o nome de Delmonico’s. Em 1831, eles já não se anunciavam como Delmonico’s & Irmãos Confeiteiros, mas como Confeiteiros e Restaurant Français. Foram os Delmonico que introduziram em Nova York um hábito que se tornaria uma de suas instituições, o almoço de negócios.

Em 1834, os Delmonico (agora com o sobrinho Francesco, ou François) compraram uma fazenda de 250 acres, no que hoje é parte do Brooklyn, para plantar produtos que não encontravam no mercado americano. Muitos desses itens eram franceses ou italianos, mas os Delmonico também eram criativos com produtos naturais da América.

Numa época em que os tomates eram conhecidos como maçãs do amor, e começavam a se tornar populares como planta ornamental para alegrar jardins, os Delmonico apresentaram aos nova-iorquinos a comida com tomate”.

– “Depois disso, o ketchup virou uma praga mundial!” (protestou o escritor Valêncio Xavier)

Então Rosy de Sá Cardoso, a decana feminina da imprensa paranaense, completou a dissertação do autor de Os Três Mosqueteiros:- “A colonização do litoral do Paraná começou em 1550, na Ilha da Cotinga, em Paranaguá. Tomateiro, naqueles antanhos, não tinha nem para decoração de jardim. Sendo que a versão mais difundida da origem do Barreado relaciona-se às festas do Entrudo, o atual Carnaval. Está fora de questão o uso do tomate no Barreado: o Entrudo foi introduzido no Brasil pelos portugueses no Século XVI. Ora, se até 1834 os nova-iorquinos não comiam tomate, não seria em Paranaguá que os carnavalescos iriam botar tomate no tempero do Barreado!”

Diante dos fatos, o mediador Farofa colocou a questão em votação. Por unanimidade, o Simpósio do Barreado consagrou a tradicional receita: carne, sal, cebola, alho, cheiro verde, vinagre, louro, cominho e pimenta. Sem tomate!

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Este Simpósio do Barreado, aqui publicado, é extrato (de tomate?) de um dos capítulos do livro que estou terminando de alinhavar: Serra Abaixo Serra Acima (Cultura, História, Estórias e MordaCidades do Paraná). Se Nossa Senhora da Guia ajudar, vai para as livrarias em março.