O 1.º Simpósio do Barreado não foi realizado em Porto de Cima por acaso. Pesou a história de Porto de Cima: no início do século XVII, na antiga Vila do Porto Real era feito o transbordo de cargas que vinham de Curitiba, pelo Caminho do Itupava, para as embarcações do Rio Nhundiaquara seguirem para Morretes, Antonina e Paranaguá.

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Dando por abertos os trabalhos com uma primeira rodada de pinga mineira (a de Morretes poderia influenciar a opinião dos debatedores), o presidente Vitamina iniciou o simpósio com um histórico de sua própria lavra:

– O barreado nasceu em Morretes, Antonina ou Paranaguá? Senhores, a resposta para esta pergunta se perde no tempo. Portanto, estamos aqui reunidos para tentar recuperar o berço perdido. Nossa responsabilidade é grande, porque as divergências regionais conflitam-se também quanto a alguns insumos da sua composição. A versão mais difundida da sua história relaciona-se às festas do Entrudo, o atual Carnaval.

O caiçara envolvia-se com a dança do fandango aguardando ansioso pelo barreado, coroando o encerramento dos folguedos. O “púcaro caiçara” é uma mistura de carnes bovinas com temperos verdes acondicionados em uma panela de barro cuja tampa é barreada com uma miscelânea de farinha de mandioca, cinza e água, para impedir a saída do vapor.

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A seguir, coloca-se sob ou sobre o forno de lenha, que outrora também servia para “alumiar” os fandanguistas. A cocção deve durar até 24 horas, dependendo da intensidade e condições do calor. Na oportunidade do entrudo, com a panela enterrada e a fogueira em cima, esse processo poderia durar dois dias. Reza a tradição que a cerimônia de abrir a panela, quebrando o selo barreado, deve ser feita debaixo do espocar de grande foguetório. O caldo deve ser servido quente, em prato fundo, onde por primeiro se coloca a farinha de mandioca crua. O barreado por cima e, com garfo ou colher, amassa-se até formar o pirão. Deve ser acompanhado de banana, mas aqui cabe uma outra controvérsia: Paranaguá prefere banana-maçã, Antonina banana prata e Morretes banana caturra. De minha parte, para agradar gregos e troianos, aconselho a banana terra cozida. Aqueles que professam a religião do barreado de origem africana, como na feijoada, incluem também a laranja descascada. Uns dizem que sim, outros dizem que não, enfim, eu corto a banana terra em duas ou três partes, colocada numa panela com água para ferver até inchar levemente, por cerca de cinco a dez minutos. No arremate cai bem uma cerveja bem gelada. Se bem que nos últimos tempos tenho bebido apenas vinho.

– Peço a palavra, presidente Vitamina! (solicitou o jornalista Aramis Millarch) Gostaria de um resumo da receita básica e seus insumos.
– Pois não, insigne jornalista. Temperos: sal, vinagre, louro, cebola, alho, cominho e pimenta. E depois botaram também o tomate. Equipamentos básicos: panela de barro, concha, prato fundo, talher, folha de bananeira e barbante. Acompanhamentos: cerveja, batidas ou caipirinha, banana, farinha, mandioca crua, ou laranja descascada, palitos, copos e guardanapos.
Neste ponto, o mediador Farofa intervém:
– Senhor presidente, Rafael Greca de Macedo pede a palavra!
– Obrigado, Farinha!
– Olha o respeito, Greca! Meu nome é Farofa!
– Perdão, senhor mediador! Antes do Vitamina detalhar a receita, seria importante um esclarecimento: vai ou não vai tomate no barreado?
O escritor Alexandre Dumas pede a palavra, silêncio no recinto:
– Quanto ao uso do tomate, gostaria de fazer um questionamento mais adiante.
– Será uma honra, monsieur Dumas!

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Neste domingo, a terceira ata do Simpósio do Barreado: a jornalista Rosy de Sá Cardoso levanta uma questão de ordem histórica (“O tomate no barreado é uma heresia!”) e Alexandre Dumas explica por que o tomate não pode fazer parte do barreado tradicional.