Sabedoria das ruas

Dizia o poeta Mário Quintana: “O autodidata é um ignorante por conta própria”. Quando se atribui o vandalismo à massa ignara – ou seja, à ignorância da massa – a frase de Quintana sugere que o Movimento Passe Livre (MPL) deveria abrir uma escola para o seu exército de simpatizantes.

Seria a Universidade Livre do Passe Livre (ULPL). Com essa sonora sigla, o movimento poderia angariar um respeitável corpo docente, a começar por professores argentinos especializados em estratégias de manifestação de rua: em Buenos Aires, quando os vândalos começam a quebrar tudo, os verdadeiros manifestantes se sentam. Com a bunda no chão, facilitam a ação da polícia para disparar balas de borracha, baixar o cassete e algemar os verdadeiros culpados pela destruição.

Por enquanto, no vai ou racha, as manifestações de rua conseguiram adesões no “arco da sociedade”, como gostavam de dizer os petistas em seus bons tempos de estilingue. Daqui pra frente, qual será o futuro das manifestações? Para responder essa e outras perguntas é que se faz necessária a ULPL, com especialistas das mais diversas tendências.

A professora Marilene Chauí, por exemplo, poderia ressuscitar a disciplina de “Moral e Cívica” – tão decantada pelos militares –para passar aos jovens ativistas suas teorias sobre a classe média, segunda ela a verdadeira massa ignara da nação: “A classe média é uma abominação política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante”.

Na sala ao lado, a ULPL poderia contar com o filósofo Olavo de Carvalho para explicar como realizar passeatas e protestos ombro a ombro com os militares: “Se um único general tomasse a dianteira e prendesse os corruptos que a massa revoltada quer ver na cadeia, ganharia instantaneamente o apoio de toda a população, inclusive de grande parte dos agitadores de rua”.

Entre outros professores, o trombonista Raul de Souza ensinaria como botar a boca no trombone; o ex-ministro Delfim Neto revelaria porque não existe almoço grátis; Roberto Requião e Beto Richa explicariam como ganhar eleições para prefeito de Curitiba em cima de um ônibus; o deputado e militar Jair Bolsonaro lecionaria armas e munições de borracha; Zé da Bíblia falaria sobre o Apocalipse; Lula não poderia deixar de botar um dedinho; e os médicos cubanos ensinariam as modernas práticas de primeiros socorros numa democracia.

O único entrave para a criação da ULPL seria quanto à parte didática: as aulas seriam presenciais ou pelo Facebook? – eis a questão!