Na noite de sexta-feira passada, alguns dos primeiros passarinhos do pintor Rogério Dias se reuniram para gorjear no mesmo quintal. Foi uma revoada de velhos pássaros para comemorar, com arrulhos de felicidade, o aniversário de 64 anos do pintor que assumiu o posto de Poty Lazzarotto na viva iconografia curitibana.

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São sete os requisitos básicos para se identificar um curitibano: o sotaque na ponta da língua, a timidez no comportamento, um louquinho no porão, um guarda-chuva na porta, um livro de Dalton Trevisan na estante e os pássaros de Rogério Dias na parede.

Na passarinhada de aniversário (quando no lugar de alpiste foram servidos sopas e carnes, bem entendido), o passaredo não podia ser mais curitibano, da cepa ou não, dos quais cito apenas cinco para o esquecimento não injustiçar os demais que foram tantos: Dona Regina Camargo (representando a memória do marido Guilhobel Camargo), Paulinho Vítola, Marinho Gallera, Nelson Padrella e Eloi Zanetti. O mais antigo dos passarinhos do artista, Eloi Zanetti, não só nos gorjeou de qual árvore conheceu Rogério Dias, como também no dia seguinte nos descreveu por escrito:

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A melhor definição sobre Rogério Dias quem já deu foi o Solda: “O Rogério Dias não é um só, são vários. Existem muitos. Eles estão disfarçados e às vezes se juntam numa só pessoa”. Com a arte do Rogério Dias passei por uma das mais incríveis experiências de sensibilidade à arte da minha vida. Há alguns anos o Rettamozo me apresentou o Rogério Dias e este me mostrou o trabalho que fazia. Eram pássaros feitos de tocos de lenha. No mesmo instante meu pensamento voou para minha infância, minha cidade, meu ambiente. Eu disse a ele: “Puxa, isto aqui é muito forte. Está me transmitindo todo o meu passado, cheiro de terra, de mato, toda a natureza da cidade onde fui criado”. Ele me perguntou: “De onde você é?” Respondi na hora: “De Jacarezinho”. O Rogério ficou mudo, deu um passo para trás e disse: “Eu, também sou de Jacarezinho”. Ele havia conseguido transmitir num simples pedaço de lenha, ajustado para a forma de um pássaro, todo o ambiente da nossa infância. Muitos anos depois, estava com o Rogério no carro e passava perto da casa da minha mãe. Convidei: “Vamos lá tomar um café, talvez ela até conheça a sua família”. Apresentados, ela perguntou: “Mas de que família você é? Quem são os seus pais? E ele disse: “Minha mãe chamava-se Mariazinha e meu pai trabalhava como escrivão da polícia.” E ela: “Mas então vocês eram nossos vizinhos de cerca. Existia um garoto loirinho, meio espeloteado chamado Rogério.” Respondeu ele: “Era eu!”. Fomos vizinhos de cerca na primeira infância, nenhum dos dois se lembrava disso, só fomos nos encontrar graças à sua arte muitos anos depois.”

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Três dos primeiros e mais queridos passarinhos dos Rogérios Dias (o gênio singular) não assobiaram no quintal da filha Regininha Dias: Rettamozzo, Solda e Leminski, esta ave que foi assobiar num galho bem além do Pilarzinho. Às aves presentes e ausentes, Selma Urbano agradeceu em nome do companheiro de voo: “Gostaria de agradecer muito a todos os amigos que estiveram presentes na Festa do Rogério, e também aos que por algum motivo não puderam comparecer, mas mandaram mensagens ou telefonaram. De todos, eu sou a pessoa que conhece o Rogério há menos tempo. Muitas pessoas costumam me cumprimentar falando aquela velha frase: Por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher! Gostaria de fazer uma pequena correção: o Rogério já era muito grande quando eu o conheci, no final de 1989. Portanto, em primeiro lugar, por trás de um grande homem tem sempre grandes amigos. Agradeço a todos pela amizade, pois, mesmo que o contato entre vocês não seja constante, sei que todos tem por ele muito carinho, e podem ter certeza que ele tem por todos vocês muita admiração. Um Abraço, Selma Albano”.