Relaxa e goza, Roberto!

No périplo paranaense da ministra Marta Suplicy, os analistas políticos de faro fino deixaram de registrar o diálogo entre a ministra e o governador. Para poucos e bons, Marta Suplicy foi recebida por Roberto Requião com um jantar na Granja do Cangüiri. O entreato etílico-gastronômico começou com brinde de Marta Suplicy ao anfitrião: ?Relaxa e goza, Roberto!?

– Marta, você está me gozando? Todos sabem que eu sou intelectual orgânico das classes populares. Eu sou rigorosamente radical naquilo que eu acredito. E eu acredito nos meus projetos. Então, me classificaria como um existencialista sartreano, de esquerda, com determinados projetos. E, entre esses meus projetos, de modo algum sou capaz de ?relaxar e gozar?.

– Roberto, relaxa e goza! Sai do armário, todos sabem que você sempre foi um gozador. Não fosse assim, no quartel você não teria pintado o cavalo do comandante de cor-de-rosa!

– Marta, vamos esclarecer essa história. Quando eu entrei no CPOR, o fiz de forma radical. Como sempre fui. Porque eu acredito nas coisas que eu faço. Minha perspectiva era ser o primeiro aluno do CPOR inteiro, sendo aluno da cavalaria. Mas, a partir de um determinado momento, o ambiente interno de deteriorou. Era uma grande escola de oficiais embriagados, acampamento onde se escondia bebida alcoólica, as pessoas enchiam a cara e, irresponsavelmente, disparavam tiros à noite. E eu, como um bom radical, naquela época de CPOR não tinha tomado, ainda, meu primeiro gole de bebida alcoólica.

– Depois relaxou e gozou?

– Deixa eu terminar, Marta! Um belo dia estava com um grupo de pessoas, no intervalo de um exercício lá na área do Pinheirinho, quando um capacete de fibra, no meio de nós, deu um salto. Eram alguns oficiais, brincando de dar tiros. Aquela bala poderia ter matado qualquer um de nós. Então a respeitabilidade hierárquica, a credibilidade do quartel, acabou.

– Acabou o respeito, relaxou e gozou?

– Uma noite surgiu a idéia de dar o troco. Fomos ao quartel e decoramos com listras cor-de-rosa o cavalo do oficial-comandante da cavalaria, e que iria participar do campeonato de equitação no dia seguinte. Mas tudo aquilo com muito cuidado, para não bloquear a sudorese do cavalo.

– Que gracinha, Roberto! Um cavalinho branco pintado com listras cor-de-rosa!

– Não me arrependo. Mas confesso que já naquela época eu não tinha jogo de cintura. Muito menos o comandante, que me expulsou.

– É por isso que eu sempre digo, Roberto: é preciso ter jogo de cintura, relaxar e gozar.

– Marta, não me venha com ironias! O irônico aqui sou eu! Gramsci tem um texto, nas Cartas do Cárcere, onde ele cita a ironia como uma das principais armas do combate político, principalmente contra o autoritarismo. Quando você põe um autoritário no ridículo, ele se dissolve. Ironia é o solvente do autoritarismo, principalmente da burrice autoritária.

– Roberto, então vamos relaxar e gozar: é verdade que você diz ao seu motorista ?toca pra casa? e ele pára em frente a Catedral, a casa de Deus?

– Marta, que horas parte o teu avião?

– Ora, estou com um avião da FAB! Relaxa e goza, Roberto!

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(Trechos desta crônica foram retirados e adaptados de uma entrevista de Roberto Requião, então prefeito de Curitiba, em outubro de 1988)