Reclamações de barriga cheia

Como dizem os boleiros, cada um sabe onde lhe apertam as chuteiras. Ou como dizem os cartolas, com a boca calada ninguém engole o microfone. Como também sabem que quem fala o que quer ouve ou que não quer, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, informou que a abertura da Copa do Mundo, em 12 de junho, não terá discursos. Dilma Roussef respirou aliviada e concordou de pronto. O motivo, explica o rei dos cartolas, são as inevitáveis vaias, como aconteceu na Copa das Confederações, quando ele e Dilma foram alvos de vaias na cerimônia de abertura do torneio, no Estádio Mané Garrincha, em Brasília. Na ocasião, quando Dilma falava, Blatter chegou a repreender o público, pedindo respeito.

O mesmo respeito que a Fifa não está tendo com o Brasil, afirma Pedro Trengrouse, professor da Fundação Getúlio Vargas e consultor da ONU para a Copa. Em entrevista ao colunista Ancelmo Gois, do jornal O Globo, ele acha que a Fifa decidiu pegar no pé das autoridades brasileiras, diferentemente do que fez na África do Sul, quando o estádio-sede da abertura do Mundial, por exemplo, foi entregue a apenas dez dias do início da competição. E na África o Jérôme Valcke não deu um pontapé na bunda de ninguém. Para saber por que a Fifa está reclamando de barriga cheia, eis o que Pedro Trengrouse revelou ao coleguinha Ancelmo:

A diferença entre a Copa de 2014 e a de 2010: “A principal diferença é que o Brasil é o país do futebol, e a África gosta de rugby. Além disso, nós já temos nove estádios prontos e entregues. O outro ponto é que a Fifa arrecadou no Brasil, com a Copa, o maior volume de patrocínio e direitos de transmissão de sua história. Foram US$ 5 bilhões. Aqui, também teve a maior demanda por ingressos. Na África, a Fifa fez até promoções com as entradas”. 

O legado da Copa no Brasil: “A Copa está passando pelo Brasil e deixando o futebol para trás. Na África, a Fifa investiu US$ 70 milhões para fortalecer o futebol local. Construiu 54 centros de treinamentos, patrocinou clubes, competições e fez cursos técnicos. Aqui, a entidade não fez nada. Entre 2010 e 2014, o orçamento da Fifa para desenvolver o futebol no mundo chegou a US$ 800 milhões. Não chegou um tostão aqui”. 

A participação do povo: “Nós somos 200 milhões de brasileiros. Com sorte, 0,75% conseguirá algum ingresso. E o resto? O governo vai pagar a conta e deixar o povo fora da festa. Ainda dá tempo. O governo deveria organizar eventos para que todos participassem do Mundial no seu país. Sete empresas deram (cada) US$ 3 milhões para a Fifa realizar uma FanFest em cada cidade-sede. E ela quer cobrar a conta das prefeituras. O governo deveria ter agenda própria e organizar eventos em cada uma das cinco mil cidades do país”.