Quem te viu, quem tevê

“Nosotros vamos a ganar la Copa del Mundo! Somos llamados de La Fúria”. Quando estreou em Curitiba na Copa de 1950, a Fúria espanhola chegou assustando a praça, contou o ex-locutor esportivo Paulo de Avelar em suas memórias. Com o campo do Clube Atlético Ferroviário completamente lotado, a torcida encapotada para se proteger do vento frio da Vila Capanema, a primeira vítima das chifradas do touro da Catalunha seriam os Estados Unidos. Ninguém acreditava que aquele timinho de camisas brancas, com gola azul e calções vermelhos jogasse futebol. O que se sabia é que eles jogavam bem com uma bola ovalada e arremessada com as mãos.

O que ninguém sabia era que a seleção dos Estados Unidos tinha só dois norte-americanos escalados, conta Paulo Avelar: “O goleiro e o centro médio. Este chamava-se Charles Colombo, jogava com a camisa 5 e fazia sozinho o meio de campo. Jogava com grossas luvas negras, algo como luvas de boxe. Mais tarde se soube que ele jogava com aquelas grossas luvas porque era futebolista amador e médico operador dos melhores, de uma clínica da América do Norte. Precisava defender suas mãos pois elas eram o seu patrimônio. O resto do time era inglês, escocês, francês, italiano, argentino, tinha até um português bom de bola chamado João de Souza”.

A Espanha esperava encontrar um amontoado de cabeças de bagre e se deu mal, pois logo de cara o portuga marcou um gol de placa no Durival de Brito, depois de fintar toda a defesa da Fúria: “O zagueiro esquerdo, marcador do português, estava no desespero porque não pegava na criança. Estava pisando na bola. A Espanha se desmontou e quase vira o jogo numa corrida de touros. No segundo tempo os norte-americanos abriram o bico. Não tinham o menor preparo físico. Estavam caindo pelas tabelas. Daí os espanhóis empataram e ganharam o jogo por 3×1. Uma coisa ficou evidente. A Fúria não era de nada”.

Tanto não era de nada que nas quartas-de-final levou uma sonora goleada de 6x1do Brasil, com o Maracanã inteiro cantando a marchinha “Touradas em Madrid”, de Braguinha e Alberto Ribeiro: “Eu fui às touradas em Madrid / Pararatibumbum bum / E quase não volto mais aqui / Pra ver Peri beijar Ceci”.

A Fúria voltou para casa com a marchinha no ouvido e o rabinho entre as pernas. O olé foi tão grande que os espanhóis levaram quase sessenta anos para aprender a jogar futebol. E aprenderam direitinho.

Se no campo econômico a Espanha aplicasse o mesmo exemplo de superação que mostrou no futebol, hoje os espanhóis estariam rindo à toa. Dentro e fora de campo.