Lá pelos anos 1960, quando o maior programa em Curitiba era assistir um filme qualquer na Cinelândia da Rua XV e depois comer pizza com vitamina na lanchonete Acrópole, certa feita a cidade se alvoroçou com a mostra na Biblioteca Pública de uma pintura de Von Gogh.

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Os curitibanos, que costumam fazer fila até para pular poça d´água, ficaram tão encantados com a visita de tão ilustre obra – até então só vista nos calendários da HM (Lojas Hermes Macedo) – que não se falava de outra coisa na cidade:

– Van Gogh é o nosso Bakun, só que não cortou a orelha.

No meio daquela extensa fila do holandês, uma ilustre madame frequentadora da coluna social do Dino Almeida perguntou então para o jornalista Fernando Pessoa Ferreira:

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– Van Gogh é nome ou apelido?

– É apelido. O nome é Kirk Douglas!

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Quem te viu, que te vê. Quarenta anos depois do fechamento da Rua XV de Novembro, Curitiba não é mais a mesma do pintor Miguel Bakun, o van-goghiano de Mallet a se suicidar de tão amargurado com aquela Curitiba provinciana. Em 19 de maio de 1972, quando as obras do arquiteto Abrão Assad recuperaram o antigo nome de Rua das Flores e entregaram a principal avenida da cidade exclusivamente aos pedestres, a acanhada Curitiba se olhou no espelho e descobriu que não era de se jogar fora.

A bela adormecida abriu os olhos e com a Rua das Flores despertou sua autoestima. Se os jovens urbanistas, tendo o prefeito Jaime Lerner como condutor, não contavam com a surpreendente boa receptividade, não contavam também com a reação desconfiada dos pedestres. O que aconteceu a seguir não deveria ter surpreendido ninguém, pois outra coisa não se podia esperar do curitibano arredio, tímido e desconfiado. Muitos anos depois, contou o falecido arquiteto Rafael Dely, na época presidente do Ippuc: “Quando se fechou a rua, o povo continuava andando nas calçadas. Não se sentia dono da rua, apesar de não estar passando mais carro algum. Daí veio a ideia de se implantar equipamentos no meio da rua – bancas, cafés, quiosques – para que os pedestres se sentissem donos do espaço. Só assim é que a rua passou a ter fluxo de pedestres em todas as direções, como ocorre hoje”.

Entre outras de suas criações para a rediviva Rua das Flores, na quadra entre a Marechal Deodoro e a Muricy o arquiteto Abrão Assad implantou um ponto de encontro e cafezinho revestido de acrílico roxo – talvez para ilustrar os ares de modernidade que a cidade estava ganhando -, que imediatamente passou a ser chamado de “penteadeira de puta”. O local era uma espécie de Facebook, pois todos passavam ali e deixavam recados, convites para festas e espetáculos, troca de telefones, enfim, era a “caixa de mensagens” da cidade. E foi assim que a futura curitiba.com.br começou a receber mensagens do mundo.