Numa sequência de festejos, o arquiteto Jaime Lerner foi celebrado no Museu Oscar Niemeyer com a retrospectiva de seu 50 anos de profissão e, no final da tarde de ontem, reuniu num pequeno restaurante alguns poucos amigos, não mais do que suficientes para uma boa conversa, com o pretexto de brindar seus 77 anos.

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Quando Curitiba completar 500 anos, pouco vai restar do que temos hoje: os livros de Dalton Trevisan; os murais de Poty; o Restaurante Madalosso; o bebedouro do Largo da Ordem; as calçadas da Rua Saldanha Marinho; o Passeio Público jogado no esquecimento; o Terminal do Guadalupe, do jeito que está; o projeto do Metrô; o inacabado teto retrátil da Arena da Baixada; e uma polêmica:

– Quem foi o criador de Curitiba? Ébano Pereira ou Jaime Lerner?

Como se sabe, os historiadores de Curitiba estão divididos entre os lernistas e os do contra. Estes sustentam que Curitiba começou como uma daquelas cidades do Velho Oeste, em busca do ouro. Foi uma correria em Paranaguá. Muitos afirmavam que a maior jazida se localizava onde hoje é o Palácio Iguaçu, uma premonição que atraiu os primeiros garimpeiros para a região. E que até hoje continua atraindo.

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Em 1649, Ébano Pereira, capitão das canoas de guerra da Costa do Sul, comandou uma expedição exploratória para subir ao planalto em busca de ouro. Para tanto, Ébano Pereira pegou a laço uns caiçaras da Vila de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá. Com saudade do pirão com peixe frito, alguns voltaram para o caniço e o samburá, outros se estabeleceram na margem esquerda do rio Atuba, entre a Vila Perneta e o atual Bairro Alto. Como não acharam nem dente de ouro naquele charco que era o Atuba, posteriormente se mudaram para um local mais salubre, às margens do rio Ivo, atual centro de Curitiba.

Os historiadores não têm coragem de revelar, mas diz-se à boca pequena que Ébano Pereira, um visionário, queria mesmo era abrir uma picada entre Curitiba e Paranaguá, para posteriormente cobrar pedágio. Isso sim, uma verdadeira mina de ouro.

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Os historiadores lernistas são da corrente revisionista. E com certa razão, porque até 1971, Curitiba não existia. Pelo menos na mídia nacional. Só depois que Jaime Lerner fechou a Rua XV e abriu a Rua das Flores para pedestres é que a cidade nasceu para o mundo.

Reza a cartilha dos historiadores lernistas que a escolha do sítio foi determinada no século XVII pelo cacique Tindiquera, o touro-sentado dos pinheirais. Insistentemente assediado pelos homens de Ébano Pereira, que queriam porque queriam se mudar das margens do Rio Atuba para um lugar mais saudável, depois de muitas negociações o chefe tingui decidiu ceder parte de suas terras para a povoação. Com os caras-pálidas atrás, em fila indiana, Tindiquera caminhou até onde é hoje a Praça Tiradentes e ali parou. Olhou para um lado e outro, observou a direção do vento e, de repente, fincando no chão a sua lança, disse a famosa e misteriosa frase:

– Táki-Keva!

E sem ao menos se despedir, o cacique foi-se embora.

Os povoadores brancos ficaram de boca aberta. O que Tindiquera queria dizer? Como não havia nenhum tradutor presente, chegaram à versão óbvia:

– É aqui!

No dia seguinte os colonos consultaram um tradutor tingui, que revelou o mistério:

– Táki-Keva que dizer o seguinte: “O arquiteto faz o resto!”