Quando nada acontece

Se existem dois profissionais sacrificados no verão brasileiro, são eles os vendedores ambulantes e os jornalistas políticos. O vendedor de cerveja em lata percorre o calvário de areia carregando aquela cruz de isopor feito um Cristo de sandálias havaianas. Quanto aos editores políticos, em janeiro e fevereiro, coitados…

Onde está o Sindicato dos Jornalistas, que não toma nenhuma atitude em defesa da classe? Durante o verão, repórter político devia ganhar adicional de insalubridade, ou então ter o direito de passar os meses de janeiro e fevereiro em férias remuneradas, nas mesmas condições dos companheiros da classe política.

Exagero? Então vejamos um dia típico da editoria de política:

– Qual é a pauta para hoje, chefia?

– A mesma de ontem: encher linguiça!

– Com trema ou sem trema?

– Isso vale para qualquer profissional de respeito: “Jamais trema em cima de uma linguiça!”. Pega o telefone e entrevista os suspeitos de sempre!

Um cafezinho e um cigarro depois (na área infecta do jornal), o repórter consegue localizar um importante líder partidário.

– O prefeito Beto Richa foi recebido ontem pelo presidente Lula, junto com o ministro Paulo Bernardo. O senhor acredita que essa audiência…

– Um momentinho, caro repórter! (No fundo o barulho do mar e uma voz feminina perguntando pelo bronzeador) Continuando… não tenho elementos para julgar a importância política desta cordial aproximação entre petistas e tucanos. Estou aqui no Costão do Santinho e… garçom, mais uma caipirinha! De vodka, pouco açúcar e bastante gelo!

Se os políticos têm uma vida sacrificada quando consultam suas bases à beira-mar, em janeiro e fevereiro a vida de um jornalista político é mais sacrificada ainda. Viram malabaristas. O leitor, que exige diariamente notícias frescas, não sabe o calor dos coitados para fechar uma, duas e até três páginas diárias com abobrinhas políticas. Com a crise do mercado de publicidade, a Newsweek, segunda maior revista semanal dos Estados Unidos, planeja mudanças em seu projeto editorial, que deverá ser menor e com papel mais nobre. Aqui no Brasil, os jornais devem seguir o mesmo caminho, com um ganho a mais: em janeiro e fevereiro as editorias políticas ficarão restritas a uma coluninha por dia, nem mais nem menos, e o leitor estará perfeitamente informado sobre o que não acontece. Em respeito ao assinante, no pé da coluninha bastaria um aviso: “Voltaremos depois do Carnaval”.

É exagero, claro, afirmar que todo político passa janeiro e fevereiro “al mare”, enquanto o eleitorado fica no Planalto vendo navios, iates, lanchas e veleiros lotados de correligionários daquela “vida mais ou menos”. O senador Alvaro Dias é uma das exceções: como ele sabe da vida dura dos editores para fechar uma página, sempre vem em socorro dos repórteres com algum fato relativamente novo. Em retribuição, ganha de presente a manchete e uma foto colorida na primeira página. Agora, por exemplo, enquanto não mudam o disco e insistem no samba de uma nota só da eleição para governador, presidente, etc (daqui a um ano e meio!), o senador participou de uma reunião do tucanato nativo dos pinheirais e deixou claro que quer ser o candidato do PSDB em 2010.

O senador Alvaro Dias deve ter aprendido que o melhor dia para enviar aos jornais uma “abobrinha” é no domingo à noite, quando só futebol e crimes acontecem de verdade. Na falta de assunto melhor nas páginas dedicadas à política, até o técnico Geninho tem grandes possibilidades de ser cogitado como candidato a governador.