Poty e o milagre da Vila

Lembra o médico Carlos Medeiros, oncologista da maior qualidade, que certa vez o pai dele pediu ao artista Poty Lazzarotto que fizesse o retrato de um amigo, que naquele tempo jogava futebol no Palestra. Poty foi observar um jogo do amigo para colher dados para o desenho. Quando a obra ficou pronta, ele a entregou para o pai do doutor Carlos, que observou:

– Mas Poty, o jogador está com as chuteiras ao contrário!

Poty deu uma ajeitada nos óculos e, revendo com vagar os pés trocados com os dois bicos virados para fora, respondeu:

 – É assim mesmo: o seu amigo não acertou um só chute durante o jogo! 

A cena poderia se repetir, caso Poty Lazzarotto – que assistia futebol montado num vagão de trem -, ainda estivesse morando na vizinhança da Vila Capanema. Só o nosso saudoso mestre para fazer um retrato do futebol paranaense neste início de temporada. Seria um bico pra cá, uma bicuda pra lá e bola pro mato que o jogo é de campeonato, porque não apenas no Paraná a mediocridade apita o jogo. Os campeonatos estaduais se encontram num nível tão rasteiro que até o zagueiro Paulo André, do Corinthians, se obrigou a reconhecer: “Excluindo os clássicos eu não assistiria jogos do Paulista nem que me pagassem!”. 

A milagrosa vitória do Clube Atlético Paranaense na Vila Capanema – numa quarta-feira em que até choveu de verdade -, valeu muito além do preço do ingresso. Foi digna de uma obra de Poty, modelo vivo para uma ilustração das histórias do Sobrenatural de Almeida, o tão celebrado personagem de Nelson Rodrigues. Não fosse um jogo de futebol, poderia ser comparado a um filme de terror, com quase todos os personagens enlouquecidos no final.

Quando o Furacão perdeu a Copa do Brasil para o Flamengo em pleno Maracanã, em Curitiba os atleticanos desligaram a televisão, envergonhados. Já os que estavam no Rio de Janeiro, assistindo aquela batalha ao vivo, se retiraram do Maracanã num humilhante silêncio. O silêncio de quem não podia ser identificado, dentro do metrô, nem mesmo pelo sotaque leitE quentE. 

Depois da surpreendente vitória sobre os peruanos do Sporting Cristal, os guerreiros atleticanos saíram da Vila Capanema irreconhecíveis. Nem de longe lembravam os torcedores ainda marcados pelo massacre de Joinville, arrastando consigo o vexaminoso atraso nas obras da Arena da Baixada e o ultimato de JérômeValcke.