Numa de suas inúmeras entrevistas, Paulo Leminski alfinetava o provincianismo dizendo que tudo em Curitiba se faz a nível maçônico. Ou então não se faz. “Existem na cidade mais ou menos uns dez gurus (contabilizava o polaco para o Diário do Paraná em setembro de 1975) que chefiam a imaginação da rapaziada e lideram correntes, em alguns casos, expressivas da nossa inteligência”.

continua após a publicidade

Dentro da regra ainda hoje válida, com cada polaco em sua colônia, Leminski observava que os guruatos não coabitam os mesmos bares, por exemplo. Não admitem estabelecimentos fora da sua jurisdição. Só frequentam aqueles locais onde ouvem, de seus musos, teorizações estéticas, ideológicas, filosóficas e assim por diante. O guruato do sicrano não frequenta o bar do fulano, o guruato do beltrano passa longe dos dois. Existe uma espécie de rixa entre eles, com ações inspiradas na guerrilha urbana. Todas essas escaramuças eram justificadas pela ideia comum de que não existe unanimidade em Curitiba. No zoneamento cultural da cidade, poetas no botequim do fulano, escritores no bar do beltrano, artistas plásticos no restaurante do sicrano e cada macaco no seu galho.

Com a recente pororoca a varrer o país, surgiu um estranho fenômeno: são tantas as marchas e contramarchas de protestos que os guruatos já não mais se reconhecem nos bares. Agora se identificam nas cores de suas bandeiras de protesto: a Marcha dos Fulanos não se cruza com a Marcha dos Beltranos, sendo que a Marcha dos Sicranos têm por objetivo desmoralizar fulanos e beltranos pelo Facebook.

E assim essa pororoca atinge também as redes sociais, fazendo com que os fulanos do Facebook não sentem sob o mesmo teto dos beltranos do Twitter, onde os sicranos dos blogues não se misturam com os demais.

continua após a publicidade

Como tudo em Curitiba acontece de maneira organizada, o IPPUC precisa pensar num escalonamento de protesto: na segunda-feira a Marcha dos Fulanos picha as paredes do Palácio Iguaçu; na quarta-feira a Marcha dos Beltranos quebra as vidraças da Prefeitura; na sexta-feira a Marcha dos Sicranos faz piquenique nas calçadas do Batel; e no domingo todos se unem na saída do Atletiba para quebrar as estações tubos e botar fogo nos ônibus.

Além do latim e grego, Paulo Leminski também lia as cartas, considerando-se o que ele previa em setembro de 1975 ao seu nascente guruato: “Em suma, estamos vivendo aqui no Brasil, culturalmente, uma situação que poderia chamar de pororoca, aquela água que se levanta para cima e afoga e escamoteia todas as tentativas de solidificar a homogeneidade da nossa cultura”.

continua após a publicidade