Porcadeiros

Foi lançada sábado passado, em Palmeira, uma obra que não vai para as vitrinas das livrarias, não vai constar nas listas dos best-sellers, não vai ganhar páginas inteiras dos suplementos culturais, os urbanoides vão sentir um estranho odor, mas mesmo assim será um dos livros mais vendidos do Paraná. Não o Paraná de serra abaixo, mas o Paraná de serra acima.

Os leitores urbanos têm motivos para torcer o nariz: na foto da capa, centenas de porcos atravessando o centro de Pato Branco em 1954 (foto), conduzidos pelos “porcadeiros”, o título do novo livro do escritor Arnoldo Monteiro Bach.

No Paraná de serra acima o bravo escritor de Palmeira é um campeão de vendas, porque não é de hoje que os livros de Bach retratam o ontem do Brasil meridional. Três deles: Trens, Vapores e Carroções. Essas e outras obras trazem, além de subsídios para a história, capítulos da heroica colonização do Paraná e, talvez, o mais importante, o registro da memória de vida dos desbravadores. Gente humilde, que perseguiu selva adentro a fortuna ou a falência, com sangue, suor, lágrimas e muita alegria de viver, por que não? E vem daí o sucesso de Arnoldo Monteiro Bach: em suas alentadas páginas ele não conta façanhas de heróis notáveis. Narra a saga de anônimos homens e mulheres do campo, principalmente da comunidade anônima dos Campos Gerais.

É famoso o tropeirismo de gado; poucos sabem do tropeirismo de porcos. Porcadeiro (485 páginas, edição do autor) é exemplo acabado da sensibilidade de Arnoldo Monteiro Bach. De deliciosa leitura (tão boa quanto um torresminho com cerveja), o livro relata as travessias dos condutores de porcos pelos campos do Paraná. Em viagens que duravam meses, marcadas pela paciência e determinação das comitivas, as tropeadas reuniam milhares de porcos ao longo dos difíceis caminhos: “Em pontos estratégicos, comerciantes instalavam-se para receber os porcadeiros e os animais. Em grandes mangueiras, pelas quais cobravam aluguel, recolhiam os porcos e ainda vendiam a comida para alimentá-los durante a permanência no local. Em dias de muito calor, as viagens eram interrompidas, para evitar o desgaste dos animais muito gordos. Quando um animal se machucava, era sacrificado, sua carne transformada em charque e usada na alimentação da comitiva. O barulho da porcada e a cantoria dos chamadores (os que caminhavam à frente, chamando os animais com grãos de milho) quebravam o silêncio dos lugares distantes e isolados”.

Da criação de porcos em regiões das matas, distantes dos grandes centros, originou-se o tropeirismo de porcos. Cidades nasceram e se desenvolveram com os porcadeiros. Pato Branco é o exemplo mais notável, onde homens de espírito aventureiro foram buscar vida melhor num pedaço do sertão.

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Se você não achar o livro de Arnoldo Monteiro Bach na livraria do shopping, faça um programa melhor. Tome o rumo de Palmeira: no Restaurante Girassol as obras do autor estão na vitrina, onde vendem tanto quanto a polenta brustolada com bife na chapa. Além da linguiça suína feita à moda dos porcadeiros.