Pontal de Saint-Hilaire

Entre 1816 e 1822, o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire percorreu cerca de oito mil quilômetros do centro ao sul do Brasil. No verão de 1820, de passagem pelo Paraná, ele foi o primeiro a fazer o que depois seria destino obrigatório dos paranaenses: descer a serra a caminho do mar. Podemos dizer que o cronista Saint-Hilaire foi o nosso primeiro veranista a pegar uma praia entre Pontal do Paraná e Caiobá.

Vindo de Paranaguá numa piroga, o naturalista foi recebido por um cabo de milícia que providenciou o transporte na orla. O que não foi uma tarefa fácil, conforme reclamou o cronista: “Num país onde as comunicações são difíceis, a indolência excessiva, e a impontualidade extrema, ter-me-ia sido impossível fazer coincidir esses diversos meios de transporte se não tivesse recorrido às autoridades”.    

Nosso primeiro turista não pagou pedágio, mas deve ter dispendido alguns patacões no aluguel de carroças: “Eram grandes e puxadas por quatro bois e cobertas por um trançado feito de varas de bambu sobre o qual haviam sido colocadas algumas folhas de bananeiras amarradas com cipó”. Conforme o relato do próprio viajante, “não havia no Pontal nem casa, nem vegetação; nada mais existia ali a não ser a areia pura”. Depois de forrar o pandulho com feijão, arroz e farinha, Saint-Hilaire partiu (por falta de protetor solar) quando o sol já se havia posto: “É habito percorrer esta praia à noite, beirando o mar, porque os bois andam muito mais depressa no escuro do que à claridade do dia”.

No alto do carroção, o cronista passou pela praia das Gaivotas vasculhando as estrelas do firmamento em busca de inspiração para escrever: “Deitei-me, e em breve o marulho das ondas me fez adormecer, mas acordava de vez em quando e via, à luz do luar, que seguiríamos por uma praia de areia pura, com as ondas vindo lamber de vez em quando as rodas dos carros”.

Ao contrario dos veranistas que hoje pegam as estradas entupidas de automóveis, o turista francês não deve ter sofrido tanto para chegar a Matinhos: “Os bois caminhavam velozmente, e ao amanhecer chagamos à foz de um riozinho chamado rio do Matosinho. Foi preciso esperar que a maré baixasse para podermos passar, e depois de termos percorrido ainda cerca de uma légua, sempre pela praia, chegamos a Caiobá, derivado do guarani “cairoga”, ou “casa de macacos”.

Em memória do nosso primeiro veranista, Pontal do Paraná deveria fazer um plebiscito para mudar de nome. Assim como alguns querem trocar Bigorrilho por Champagnat, convenhamos, Pontal de Saint-Hilaire seria “trés chic”.